Santa Maria, RS (ver mais >>)

Santa Maria, RS, Brazil

É preciso romper com o pacto de silêncio

Em Santa Maria, mais de 20 registros de estupros foram constatados entre janeiro e outubro de 2017

O estupro é um tipo de agressão sexual geralmente envolvendo relação sexual ou outras formas de penetração, sempre realizado sem consentimento.  O ato pode ser realizado por força física, coerçãoabuso de autoridade ou contra uma pessoa incapaz de oferecer um consentimento válido, tal como quem está inconsciente, incapacitado, tem uma deficiência mental ou está abaixo da idade de consentimento.

Segundo o Artigo 213 da Legislação Federal, a penalização para a agressão sexual pode variar de seis a 30 anos. No Brasil, há poucos dados sobre o assunto, mas o Disque Denúncia (o Disque 100, Serviço Nacional de Denúncia de Abuso e Exploração Sexual Contra Crianças e Adolescentes) registrou em 2014 uma média diária de 13 denúncias de abusos de meninos.

Mulheres protestando contra o estupro em Presidente Prudente. Foto: Betto Lopes/TV Fronteira/G1/Reprodução

A Delegada Débora Dias, titular da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher de Santa Maria, conta que houve mais de 20 registros de estupros na cidade entre janeiro e outubro de 2017: “É difícil de contabilizar porque nem todos são estupros. Por outro lado, acredito também que há muito estupro que também não é registrado. É um tipo de crime de se chama cifra obscura, onde as pessoas não registram por algum motivo. Muito mais quando envolve criança e adolescente.”

[dropshadowbox align=”center” effect=”lifted-bottom-left” width=”auto” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]Segundo o artigo Cifras criminais da Criminologia, de Vinícius Alexandre de Pádua, além da cifra obscura, existem as cifras douradas, que são crimes praticados por pessoas de alto-escalão. Também há as cifras cinza, amarela e verde. A primeira são ocorrência que apesar de serem registradas, não chegam ao final do processo. A Amarela representa aquelas em que a vítima sofreu violência cometida por um funcionário público e não denunciou o órgão público por medo de represália; enquanto a última, cifra verde, refere-se a crimes que não chegam à polícia e configuram a violência contra o ambiente: pichações ao patrimônio histórico, por exemplo.[/dropshadowbox]

Vivemos em um mundo, em um País ainda muito machista. Isso é confirmado pela pesquisa do Ipea, feita em 2013 e divulgada em 2014. Nela, 26% dos entrevistados concordam total ou parcialmente com a afirmação de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. No entanto, 58,5% concordam total ou parcialmente com a afirmação que “Se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros”.

 A Delegada Débora Dias ainda completa dizendo que o estupro não é apenas uma violência física, mas também psicológica. Conforme a Delegada, muitas mulheres não fazem a denúncia pelo fato de terem que, no depoimento, reviver a violência. “Para a investigação é importante que a mulher fale tudo, todos os detalhes, e isso é uma violência também” afirma.

Segundo dados da ONU de 2010 (os últimos consolidados), os países com maior incidência de estupros são: EUA (84.767 casos), África do Sul (67 mil casos), Índia (22.172 casos), Reino Unido (15.9340) e México (14.993). 

Além de criminosos desconhecidos pela vítima, há os crimes domésticos. Esses são aqueles cometidos por ex-companheiros ou companheiro atuais, que, segundo a Delegada, são os mais difíceis de investigar, devido ao medo e à vergonha: “Se envolve pessoas da família, é muito mais difícil porque, às vezes, ela não vai registrar a ocorrência no dia seguinte. Ela espera. Ou acontece de novo“, conta.

“Estuprador”, em geral, é associado ao imaginário de um desconhecido monstruoso. Mas não é porque ele violentou uma pessoa que vai necessariamente comportar-se como um monstro o tempo inteiro. O mais comum é justamente o acusado aparentar ser uma pessoa simpática, mas – no espaço privado – agir de maneira agressiva e violenta.

Foto: Laboratório de Fotografia e Memória – UNIFRA

Desde a denúncia, são várias etapas que a investigação passa até chegar ao julgamento final. Quando o crime é feito por um desconhecido, por exemplo, a vítima faz a ocorrência e é encaminhada imediatamente ao hospital para fazer a medicação de profilaxia pós-exposição. Isso, no caso de Santa Maria, é feito no Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM). O procedimento evita as Doenças Sexualmente Transmissíveis, como AIDS, além da gravidez indesejada. Após isso, a vítima é encaminhada ao exame de corpo de delito, em que são feitos todos os exames de coleta de material. Os dois processos devem ser feitos em até, no máximo, 72 horas depois do estupro para garantir sua eficácia. Em caso de estupro, é indicado até evitar de tomar banho: “Se tomar banho, fica muito mais difícil. A roupa é muito importante de ser examinada sem lavar, pois nela fica qualquer material genético mais tempo do que no corpo. Pode ficar até anos.” explica a Delegada.

Após os exames, a vítima é ouvida na delegacia, onde vai dar as características do autor do crime. Também são pedidas informações sobre local e hora. “De regra, a vítima não vê o rosto do estuprador. Primeiro porque ele não deixa, segundo porque elas também não olham para o rosto. Então, vamos ter que investigar alguma característica de voz, tatuagem e cheiro. Já aconteceu de fazermos identificação apenas por voz”, completa Débora Dias.

Após a identificação do autor do crime, ele vai ser ouvido, mas geralmente o estuprador não vai confessar e ainda vai negar. Mas, com as provas, ele será preso. O caso vai, então, para o Judiciário; lá o juiz vai ouvir a vítima, o agressor e as testemunhas, que podem ser até as primeiras pessoas que tiveram contato com a vítima.

É preciso romper com o pacto de silêncio que encobre as situações de abuso e exploração contra crianças e adolescentes. Não se deve ter medo de denunciar. Em caso de suspeita de violência sexual infanto-juvenil, denuncie para os Conselhos Tutelares, que foram criados para zelar pelo cumprimento dos direitos de crianças e adolescentes. A essa instância cabe receber a notificação e analisar a procedência de cada caso, visitando as famílias. Se for confirmado o fato, o Conselho deve levar a situação ao conhecimento do Ministério Público. Em município onde não há Conselhos Tutelares, as Varas da Infância e da Juventude podem receber as denúncias. 

No Brasil, existe a Central de Atendimento à Mulher: Ligue 180. A ligação é gratuita. Criado em 2005 pela Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, serve como canal de orientação sobre direitos e serviços públicos direcionados à população feminina em todo o Brasil. Também serve como disque-denúncia. Outros órgãos que também estão preparados para ajudar são as Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente e as Delegacias da Mulher espalhadas pelo país.

 

“Aquele amor poderia ter me matado

Como mata centenas de mulheres por aí

Certos amores não passam

De uma bomba a ser desativada a tempo”

 Martha Medeiros

Por Andressa Marin e Sarah Vianna para a disciplina de Jornalismo Investigativo.

Nosegundo semestre de 2017, sob a orientação da professora Carla Torres. 

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Em Santa Maria, mais de 20 registros de estupros foram constatados entre janeiro e outubro de 2017

O estupro é um tipo de agressão sexual geralmente envolvendo relação sexual ou outras formas de penetração, sempre realizado sem consentimento.  O ato pode ser realizado por força física, coerçãoabuso de autoridade ou contra uma pessoa incapaz de oferecer um consentimento válido, tal como quem está inconsciente, incapacitado, tem uma deficiência mental ou está abaixo da idade de consentimento.

Segundo o Artigo 213 da Legislação Federal, a penalização para a agressão sexual pode variar de seis a 30 anos. No Brasil, há poucos dados sobre o assunto, mas o Disque Denúncia (o Disque 100, Serviço Nacional de Denúncia de Abuso e Exploração Sexual Contra Crianças e Adolescentes) registrou em 2014 uma média diária de 13 denúncias de abusos de meninos.

Mulheres protestando contra o estupro em Presidente Prudente. Foto: Betto Lopes/TV Fronteira/G1/Reprodução

A Delegada Débora Dias, titular da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher de Santa Maria, conta que houve mais de 20 registros de estupros na cidade entre janeiro e outubro de 2017: “É difícil de contabilizar porque nem todos são estupros. Por outro lado, acredito também que há muito estupro que também não é registrado. É um tipo de crime de se chama cifra obscura, onde as pessoas não registram por algum motivo. Muito mais quando envolve criança e adolescente.”

[dropshadowbox align=”center” effect=”lifted-bottom-left” width=”auto” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]Segundo o artigo Cifras criminais da Criminologia, de Vinícius Alexandre de Pádua, além da cifra obscura, existem as cifras douradas, que são crimes praticados por pessoas de alto-escalão. Também há as cifras cinza, amarela e verde. A primeira são ocorrência que apesar de serem registradas, não chegam ao final do processo. A Amarela representa aquelas em que a vítima sofreu violência cometida por um funcionário público e não denunciou o órgão público por medo de represália; enquanto a última, cifra verde, refere-se a crimes que não chegam à polícia e configuram a violência contra o ambiente: pichações ao patrimônio histórico, por exemplo.[/dropshadowbox]

Vivemos em um mundo, em um País ainda muito machista. Isso é confirmado pela pesquisa do Ipea, feita em 2013 e divulgada em 2014. Nela, 26% dos entrevistados concordam total ou parcialmente com a afirmação de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. No entanto, 58,5% concordam total ou parcialmente com a afirmação que “Se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros”.

 A Delegada Débora Dias ainda completa dizendo que o estupro não é apenas uma violência física, mas também psicológica. Conforme a Delegada, muitas mulheres não fazem a denúncia pelo fato de terem que, no depoimento, reviver a violência. “Para a investigação é importante que a mulher fale tudo, todos os detalhes, e isso é uma violência também” afirma.

Segundo dados da ONU de 2010 (os últimos consolidados), os países com maior incidência de estupros são: EUA (84.767 casos), África do Sul (67 mil casos), Índia (22.172 casos), Reino Unido (15.9340) e México (14.993). 

Além de criminosos desconhecidos pela vítima, há os crimes domésticos. Esses são aqueles cometidos por ex-companheiros ou companheiro atuais, que, segundo a Delegada, são os mais difíceis de investigar, devido ao medo e à vergonha: “Se envolve pessoas da família, é muito mais difícil porque, às vezes, ela não vai registrar a ocorrência no dia seguinte. Ela espera. Ou acontece de novo“, conta.

“Estuprador”, em geral, é associado ao imaginário de um desconhecido monstruoso. Mas não é porque ele violentou uma pessoa que vai necessariamente comportar-se como um monstro o tempo inteiro. O mais comum é justamente o acusado aparentar ser uma pessoa simpática, mas – no espaço privado – agir de maneira agressiva e violenta.

Foto: Laboratório de Fotografia e Memória – UNIFRA

Desde a denúncia, são várias etapas que a investigação passa até chegar ao julgamento final. Quando o crime é feito por um desconhecido, por exemplo, a vítima faz a ocorrência e é encaminhada imediatamente ao hospital para fazer a medicação de profilaxia pós-exposição. Isso, no caso de Santa Maria, é feito no Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM). O procedimento evita as Doenças Sexualmente Transmissíveis, como AIDS, além da gravidez indesejada. Após isso, a vítima é encaminhada ao exame de corpo de delito, em que são feitos todos os exames de coleta de material. Os dois processos devem ser feitos em até, no máximo, 72 horas depois do estupro para garantir sua eficácia. Em caso de estupro, é indicado até evitar de tomar banho: “Se tomar banho, fica muito mais difícil. A roupa é muito importante de ser examinada sem lavar, pois nela fica qualquer material genético mais tempo do que no corpo. Pode ficar até anos.” explica a Delegada.

Após os exames, a vítima é ouvida na delegacia, onde vai dar as características do autor do crime. Também são pedidas informações sobre local e hora. “De regra, a vítima não vê o rosto do estuprador. Primeiro porque ele não deixa, segundo porque elas também não olham para o rosto. Então, vamos ter que investigar alguma característica de voz, tatuagem e cheiro. Já aconteceu de fazermos identificação apenas por voz”, completa Débora Dias.

Após a identificação do autor do crime, ele vai ser ouvido, mas geralmente o estuprador não vai confessar e ainda vai negar. Mas, com as provas, ele será preso. O caso vai, então, para o Judiciário; lá o juiz vai ouvir a vítima, o agressor e as testemunhas, que podem ser até as primeiras pessoas que tiveram contato com a vítima.

É preciso romper com o pacto de silêncio que encobre as situações de abuso e exploração contra crianças e adolescentes. Não se deve ter medo de denunciar. Em caso de suspeita de violência sexual infanto-juvenil, denuncie para os Conselhos Tutelares, que foram criados para zelar pelo cumprimento dos direitos de crianças e adolescentes. A essa instância cabe receber a notificação e analisar a procedência de cada caso, visitando as famílias. Se for confirmado o fato, o Conselho deve levar a situação ao conhecimento do Ministério Público. Em município onde não há Conselhos Tutelares, as Varas da Infância e da Juventude podem receber as denúncias. 

No Brasil, existe a Central de Atendimento à Mulher: Ligue 180. A ligação é gratuita. Criado em 2005 pela Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, serve como canal de orientação sobre direitos e serviços públicos direcionados à população feminina em todo o Brasil. Também serve como disque-denúncia. Outros órgãos que também estão preparados para ajudar são as Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente e as Delegacias da Mulher espalhadas pelo país.

 

“Aquele amor poderia ter me matado

Como mata centenas de mulheres por aí

Certos amores não passam

De uma bomba a ser desativada a tempo”

 Martha Medeiros

Por Andressa Marin e Sarah Vianna para a disciplina de Jornalismo Investigativo.

Nosegundo semestre de 2017, sob a orientação da professora Carla Torres.