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Coisas da vida

Sempre me interessei por pessoas e principalmente pelas histórias que cada uma carrega. Quando falo em gente, falo em pessoas comuns mesmo. Fico encantada com a história da moça que está no celular na fila do

Só as proibições são o caminho?

É preciso começar por algum lado: sem canudo, faz favor Em recente relatório[1], a organização não governamental WWF revelou que o Brasil é o quarto país maior produtor de lixo plástico no mundo. Os baixos índices

O medo e a autocensura

Creio que estamos vivendo tempo estranhos, peculiares. Tenho acompanhado entrevistas com figuras públicas e, mesmo nas redes sociais, as pessoas tem sido incisivas nas ideias que tem expressado. Essa forma assertiva parece se impor ao mundo

A lição do “R” para um estilo de vida consciente

Desde a década de 1990 ouvimos falar do “princípio dos três R’s da sustentabilidade”, que tem como pilares os verbos Reduzir, Reutilizar e Reciclar, apresentados na Agenda 21. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, essa conjuntura

O nosso rainbow é power

“As gay, as bi, as trava e as sapatão tão tudo organizada pra fazer revolução!”. Entoando gritos de protesto e levantando cartazes, milhares de pessoas ocuparam as ruas de diversas cidades do Brasil contra a liminar concedida

16 anos do 11 de Setembro

11 de setembro de 2001, 8h46 min de uma manhã de terça-feira normal. O som do trânsito e da população de Nova Iork foi interrompido de forma súbita por um estrondo. Nesse momento, um avião de passageiros

Desconstrução da imagem do país

A visão que outros países têm em relação ao Brasil muitas vezes é chocante. Para alguns, somos o país do futebol. Para outros, o país do carnaval e da “bunda de fora”. Da gandaia. Do jeitinho.

Burkini X xenofobia

“Xenofobia é o ato de desconfiança, temor ou antipatia por pessoas estranhas ao meio daquele que as ajuíza, ou pelo que é incomum ou vem de fora do país.” A proibição do burkini começou em algumas

O despertador precisa tocar

Desde o dia em que fiquei atento durante meia hora ouvindo meu amigo contar uma história, que só envolvia gente corrupta e abuso de autoridade, e que, na verdade, era que um sonho. Ele só percebeu quando

Figura na janela. Salvador Dali

Sempre me interessei por pessoas e principalmente pelas histórias que cada uma carrega. Quando falo em gente, falo em pessoas comuns mesmo. Fico encantada com a história da moça que está no celular na fila do supermercado ou a das duas senhoras que conversam e pegam o mesmo ônibus que eu. Também gosto de olhar as luzinhas de cada prédio – espero que isso não soe psicótico e nem semelhante a filmes de Hitchcock. O que me chama atenção é pensar quem são aquelas pessoas, e o porquê delas estarem com as luzes ligadas tarde da noite. Será que elas estão esperando alguém? Problemas no trabalho? Fome? Não conseguem dormir sem um Rivotril ou um Valium? Não sei. Mas elas estão ali vivendo e quando se vive se têm histórias.

Acredito que todo mundo tenha uma história incrível, algo peculiar, algo normal ou algo que nem aconteceu ainda. E aí que me perco porque não consigo decidir se é melhor contar ou ouvir histórias. Caiu em minhas mãos, precisamente nos meus olhos, o livro “Tudo que é belo”. Ele pertence
ao projeto The Moth, que é uma organização sem fins lucrativos dedicada à arte de contar histórias. Em 1997, na Georgia, nos Estados Unidos, o romancista George Dawes Green resolveu reunir amigos nas varandas de suas casas para contarem suas histórias em noites de verão. The Moth
significa mariposas que são atraídas pelas luzes, no caso, o projeto é uma alusão de que as pessoas são atraídas pelas histórias. Esse gesto tão simples e bonito virou um fenômeno mundial, acumulando mais de 20 mil relatos de famosos e desconhecidos, que são contados sem roteiros prévios para plateias superlotadas mundo afora. As sessões passaram a ser temáticas e as pessoas narram suas memórias sejam íntimas ou grandes histórias que conquistam o público.

“Tudo que é belo” foi editado por Catherine Burns e tem quarenta e cinco histórias reais dividias por categorias. São relatos simples com um poder imenso de te fazer rir ou chorar, como a  história do cineasta Arthur Bradford, que trabalhou em um acampamento para pessoas especiais e conheceu Ronnie, que tinha paralisia cerebral. O sonho de Ronnie era conhecer o ator Chad Everett, então Arthur planeja uma viagem para Califórnia no intuito de realizar o sonho de Ronnie e documentar, porém Chad acabou não os recebendo. Depois de Arthur divulgar o material da viagem para Califórnia, Chad convida Ronnie para um encontro. Após isso o ator passou a ligar para Ronnie todos domingos até Ronnie falecer. Questionado porque Arthur se dedicou tanto à um sonho que não era seu, ele respondeu que por causa do Ronnie aquele se tornou o seu próprio sonho e que
agradece a ele por ter compartilhado o sonho.

No compilado de histórias também tem uma visão da morte através de uma criança de cinco anos que quer se despedir do primo da mesma idade que faleceu. Também de um americano que enfrenta um terremoto no Japão e volta para os Estados Unidos, mas depois resolve retornar ao Japão para saber notícias da senhora proprietária do restaurante que ele frequentava. Ele descobre que ela está bem. Mesmo eles nunca terem trocado uma palavra, já que não falavam o mesmo idioma. E a minha história preferida: uma garota de Beckenham que trabalhava em um salão de beleza comum e descobre que vai ser cabeleireira do David Bowie e acompanhá-lo em uma turnê.

A vida mostra que todos temos uma história. Eu, com quatro anos, tentei ir embora com o circo e ganhei uma cicatriz na sobrancelha; meus pais resolveram matar aula no mesmo dia e se conheceram; e o namorado do meu melhor amigo mudou de Porto Alegre para Belém para ficar perto dele. Toda narrativa importa e enquanto mais vivemos mais histórias serão contadas, para bons ouvintes, é claro.

 

 

 

Silvana Righi é formada em jornalismo pela UFN e pós-graduada em Televisão e Convergência Digital pela Unisinos. Trabalha como roteirista e gosta de escrever com ironia. Passa a maior parte do tempo entre cinema, cachorros e livros.

 

Greve dos lixeiros em Córdoba, Espanha. Fotos: Carla Rossa. Arquivo ACS

É preciso começar por algum lado: sem canudo, faz favor

Em recente relatório[1], a organização não governamental WWF revelou que o Brasil é o quarto país maior produtor de lixo plástico no mundo. Os baixos índices de reciclagem (1,28% do que é produzido) tornam o plástico hoje um grande inimigo (e não somente os canudos plásticos). Segundo dados do Banco Mundial, produz-se no Brasil, por semana, um quilo de lixo plástico por habitante. A implementação do projeto “Noronha Plástico Zero” é um marco importante na conscientização do impacto que o plástico tem na localidade e para se refletir sobre os tipos de impacto que o turismo e o consumo podem ter.

Reconhecido destino de ecoturismo mundial, a Ilha de Fernando de Noronha, que já cobra taxas turísticas para os visitantes, abriga há mais de trinta anos um Parque Nacional Marinho, agora passou a proibir a entrada, uso e comercialização de plásticos descartáveis e isopor na Ilha. Para se ter uma ideia do impacto do plástico nos oceanos já foi registrada a ingestão de plástico em mais de 240 espécies animais em todo o mundo. Estima-se que mais de 160 milhões de toneladas de plástico tenham sido descartadas nos oceanos.

Notícias sobre a morte de animais em consequência do lixo plástico são frequentes. Em março, por exemplo, nas Filipinas uma baleia foi encontrada morta[2] com 40kg de sacolas plásticas no estômago e, em novembro do ano passado, uma baleia morreu com 1 tonelada de plástico[3] na Indonésia. Mas não é preciso ir longe. Em dezembro de 2018, no litoral de São Paulo um golfinho[4] foi encontrado morto com plástico no sistema digestório e um lacre plástico na boca que o impedia de abri-la.

A questão do plástico vai muito além das sacolas, canudos e garrafas pet. Os microplásticos são outro problema pois, como o nome indica, são pequenas partículas (com menos de 5mm de diâmetro), muitas vezes imperceptíveis a olho nu. Entre os produtos que contêm microplásticos estão as pastas de dentes, diferentes tipos de cosméticos como esfoliantes e um produto bastante utilizado no carnaval: o glitter[5], feito de PET e PVC, e escorre também das torneiras de casa, muitas vezes sem se saber. Segundo estudo publicado na revista científica Nature Geoscience, o número de plástico nos oceanos é ainda maior do que se pensava. Por essas e outras razões, já foram identificados microplásrticos em alimentos e bebidas, como cerveja, mel, água da torneira e água mineral engarrafada e, recentemente, microplásticos em fezes humanas.

O uso de lenços umedecidos não degradáveis também causa grave danos. A maior parte dos lencinhos à venda nos mercados são feitos com partículas plásticas e demoram muito tempo para se decompor. Como se não bastasse isso, principalmente, devido ao descarte incorreto, dentro do vaso sanitário, os lenços têm causado transtornos no tratamento de esgoto dos Estados Unidos, como Charleston[6] e Nova Iorque[7], e ilhas como Ibiza[8]. O Reino Unido já anunciou medidas para proibir os produtos não degradáveis (e contendo plástico) após terem sido encontradas mais de 5 mil lenços umedecidos no rio Tamisa[9].

As proibições no Brasil parecem ter começado com os canudos plásticos, reconhecendo que é necessário haver a mudança por algum lado. A ONG Ocean Conservancy revelou que em 2017, os canudos foram o sétimo item mais coletado nos oceanos. A cidade do Rio de Janeiro foi a primeira capital a proibir a distribuição dos canudos plásticos (e embalagem plástica) em estabelecimentos alimentícios com multas de até 3 mil reais para os locais que descumprirem a lei. No Rio Grande do Sul, Santa Maria foi a primera cidade a proibir a distribuição de canudos descartáveis em estabelecimentos comerciais, restaurantes e rede hoteleira.

Na cidade de Rio Grande a proibição se restrige a beira da praia, contudo, comerciantes já vem fazendo a substituição por canudos de papel ou biodegradáveis. A Câmara de Porto Alegre já aprovou a lei que proibe a distribuição de canudos plásticos descartáveis, com exceção do atendimento a pessoas com necessidades especiais, e os comerciantes terão um ano para se adaptar. Outras cidades gaúchas como Tramandaí, Pelotas, Canoas, Santa Cruz do Sul também discutem medidas.

Fernando de Noronha é a primeira região do Brasil a proibir os plásticos e esse é um movimento crescente. No Caribe, a ilha de Dominica já baniu plásticos de uso único. A partir de maio, também estarão proibidos plásticos de uso único e não biodegradáveis na ilha de Capri, na Itália. Há Nações que possuem proibições mais amplas, principalmente em zonas costeiras. Nas Filipinas, na ilha de Boracay é proibido fumar, comer e consumir bebidas alcoólicas nas praias. Na Austrália é proibido consumir na praia, há locais específicos para isso, geralmente afastado da areia. A questão do lixo é tão séria que em Cingapura (ou Singapura) é proibido vender e mascar chiclete (e jogar lixo no chão pode custar um mil dólares. A Tailândia que já caminha para a redução[10] do consumo de plástico, precisou tomar medidas ainda mais drásticas proibindo a atividade turística na praia de Maya Bay, na Ilha de Phi Phi Leh e próxima dos recifes de corais, na costa leste de Phuket por tempo indeterminado. E o seu turismo é sustentável? Que tipo de impacto deixa na sua cidade? E quando viaja? Como será que tudo estará nos próximos anos?

[1] https://promo.wwf.org.br/solucionar-a-poluicao-plastica-transparencia-e-responsabilizacao?_ga=2.135194872.836866909.1555274933-802895369.1555274933

[2] https://www.bbc.com/portuguese/geral-47614367

[3] https://www.natgeo.pt/meio-ambiente/2018/11/baleia-morre-com-1000-plasticos-no-estomago

[4] https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2018/12/06/interna-brasil,723707/golfinho-e-encontrado-morto-com-lacre-plastico-no-litoral-de-sao-paulo.shtml

[5] https://www.bbc.com/portuguese/brasil-42797763

[6] https://extra.globo.com/noticias/page-not-found/mergulhadores-descem-27-metros-de-esgoto-para-retirar-pilhas-de-lencos-umedecidos-23164894.html

[7] https://exame.abril.com.br/mundo/toalhinhas-umedecidas-desafiam-sistemas-de-esgoto-dos-eua/

[8] https://brasil.elpais.com/brasil/2017/11/23/internacional/1511452440_381067.html

 

[9] https://www.independent.co.uk/environment/wet-wipes-banned-uk-pollution-single-use-rubbish-sea-life-environment-a8340111.html

 

[10] https://www.efe.com/efe/brasil/sociedade/tailandia-enfrenta-dificil-caminho-para-deixar-dependencia-de-plastico/50000246-3900198

 

Alice Dutra Balbé,  doutora em Ciências da Comunicação e mestre em Informação e Jornalismo pela Universidade do Minho, Portugal,  jornalista egressa UFN.

 

Foto:Steve Jonhson- Iso Republic

Creio que estamos vivendo tempo estranhos, peculiares. Tenho acompanhado entrevistas com figuras públicas e, mesmo nas redes sociais, as pessoas tem sido incisivas nas ideias que tem expressado. Essa forma assertiva parece se impor ao mundo real e das práticas sociais, parece existir um desejo de que se dê maior valor as palavras que as ações. E as palavras estão ásperas, brutas, sem desejo de diálogo. Cada comentário, ao final das reportagens nos jornais on-line, parece querer encerrar o assunto, como se só importasse dizer a frase de efeito ou a última palavra sobre um assunto qualquer. Difícil não se sentir agredida ao ler os comentários, não importa o assunto: uma entrevista, assassinatos, colunas tradicionais. Fico me perguntando que tipo de comunicação estamos construindo com toda essa avidez em expressar nossas opiniões com tanta veemência, com aquele tom que deseja calar o outro…
De mãos dadas ao desejo de encerrar o assunto figura um dos efeitos colaterais deletérios dessa onda de intolerância é a busca de proteção na autocensura. Estou lutando com ela agora, enquanto decido escrever, pois não quero nutrir esse movimento de agressividade gratuita, todavia não acredito que calar seja a melhor saída. Escrever é expressar, via de regra algo íntimo e pessoal, então é uma tour de force, um compromisso ético com a vida que queremos para todas as criaturas.
Em meio a isso, enquanto país, vivemos numa democracia e o direito da livre expressão é o direito que retroalimenta esse sistema político, um dos que garante sua sobrevivência. Que mundo resta quanto abrimos de nos expressar? Que mundo nutrimos quando deixamos o medo imperar?
Nesse ponto, não posso deixar de lembrar de Thomas Hobbes, um filósofo da ciência política. O medo é o tema central na obra Thomas e, a ideia de poder absoluto do Estado na figura do rei déspota, é a marca final do que esse sentimento pode produzir. O soberano é um sujeito dedicado a manter a ordem pela força, sem nenhum critério de justiça estabelecido, que não o de seu próprio e insondável desejo. Thomas tinha uma crença quase infantil nessa figura, um tipo de pai despótico e castrador como a única solução para nos proteger de nós mesmos, afinal para esse autor, a humanidade se movia pelo egoísmo e violência. Sem reduzir a obra de Thomas e, em tom de brincadeira, é uma pena que no século XVI não existia ainda a psicanálise, talvez essa ansiedade toda poderia ter sido melhor elaborada num divã, quem sabe?!
O que quero dizer é que me assusta a opção do medo que compra a segurança a qualquer preço, via de regra achando que nunca vai pagar essa dívida com a própria vida. Estamos flertando com um ambiente muito volátil das redes sociais, onde os desejos perversos viajam pelos bites numa velocidade incontrolável. Temos disponível uma ferramenta extraordinária que acaba dando vazão aos pesadelos, mas aos sonhos também. Espero que possamos usar esses canais para construir pontes ao contrário de fossos. Se é algo que faz parte da experiência humana é a capacidade de sentir e a possibilidade de perder. Espero, como quem gesta a própria esperança no verbo, que nossas opções se ampliem, bem como os divãs nos aliviem.

  

Paula Jardim Bolzan, historiadora e antropóloga, professora na UFN

 

Foto: Annca – Pixabay

Desde a década de 1990 ouvimos falar do “princípio dos três R’s da sustentabilidade”, que tem como pilares os verbos Reduzir, Reutilizar e Reciclar, apresentados na Agenda 21. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, essa conjuntura tem como foco a não-geração de resíduos, estímulo ao consumo sustentável para conter o desperdício e poupar os recursos naturais, ou seja, propostas de alteração aos padrões de consumo (como refere o Capítulo 4 do documento)[1]. Contudo, a ordem dos termos acabou sendo invertida, se falando mais em reciclagem no que nos demais termos, mesmo com a inserção de novas iniciativas.

O documento, que ficou conhecido como Agenda 21, é resultado da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, também conhecida como Rio-92, Eco-92 ou Cúpula da Terra. As referências a essa expressão dos R’s podem ser encontradas também como “políticas dos R’s” ou “diretrizes” propostas pela Agenda. Em 2019, continuam atuais e necessárias mudanças estruturais, principalmente na gestão de resíduos, apesar da Política Nacional de Resíduos Sólidos de 2010 (Lei nº 12.305/10). Lembrando que os lixões a céu aberto deveriam ter sido extintos em 2014.

O termo que deveria ser o foco principal é Reduzir. O primeiro e mais importante verbo pode ser encarado como o maior desafio. É ele que provoca uma avaliação pessoal do consumo versus consumismo, a necessidade versus vontade (ou ostentação, para usar palavras do momento). Reduzir o uso de transporte individual, o consumo de carnes e derivados animais, as compras impulsivas, o desperdício de energia, compras de grandes empresas para valorizar o comércio local e justo, são alguns exemplos.

Apesar de ser uma expressão que parece semelhante com a reciclagem, Reutilizar significa otimizar ao máximo a finalidade de determinado “produto” antes do descarte, prolongar a “vida útil”. Ainda que o descarte seja feito de forma adequada, é possível adiá-lo com a reutilização. Não existe o “jogar fora”. Além disso, não são apenas objetos que podem ser reutilizados, a água e alimentos, por exemplo, também podem ser reaproveitados.

Para poder Reciclar, em primeiro lugar, é preciso que se faça a coleta seletiva[2] e que seja eficiente. A reciclagem é o processo de transformação dos resíduos em novos materiais. Ou seja, é uma alternativa, mas não é a solução. No Brasil, os índices de reciclagem são bastante baixos, de acordo com estudo do Compromisso Empresarial para Reciclagem, o Cempre (2018)[3], somente 22% dos municípios tem programas de coleta seletiva.

Segundo estudos do Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb), 40% dos resíduos gerados tem destino inadequado. Anualmente no país, são produzidos 78,3 milhões de toneladas de resíduos sólidos, com mais de 10 milhões de toneladas procedentes do plástico. Isso significa que haveria um retorno de 5,7 bilhões de reais à economia se o plástico produzido fosse reciclado. Justamente pelo valor econômico, desde 2001 o Brasil vem sendo líder na reciclagem do alumínio. Estima-se que em 2017, somente com a etapa da coleta da latinha, mais de 1,2 bilhão de reais foi injetado na economia e recicladas 97,7% das latas vendidas no ano, de acordo com a Associação Brasileira do Alumínio. São toneladas de resíduos que voltaram a ser utilizados e não foram parar nos lixões e aterros nem nas águas e solo.

No mesmo sentido, poderíamos falar em mais alguns verbos, a começar pela Recusa de produtos com embalagens plásticas, brindes e sacolas de supermercado, isopor (que apesar de reciclável não é um processo economicamente viável), produtos que prejudiquem a saúde e o ambiente, empresas que não tenham compromisso ético-ambiental.

Repensar ou refletir (como sugere o Instituto Akatu[4]) sobre a real necessidade de aquisição ou uso de determinado produto. Questione-se. O Instituto Akatu, inclui ainda outros quatro R’s: Respeitar, a si e outras pessoas, o trabalho, os animais e plantas, o ambiente; Reparar, consertar objetos e as relações; Responsabilizar-se por suas ações, os impactos bons e ruins, por sua cidade, entre outros; e Repassar informações que ajudem a difundir a prática do consumo consciente.

Enfim, todos esses R’s indicam um caminho para o consumo consciente. Com todas as letras são necessárias iniciativas individuais e coletivas, sobretudo de cobrança do poder público e na eleição de representantes que valorizem essa pauta.

Alice Dutra Balbé,  doutora em Ciências da Comunicação e mestre em Informação e Jornalismo pela Universidade do Minho, Portugal,  jornalista egressa UFN.

[1] http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/agenda-21/agenda-21-global/item/606.html
[2] http://www.mma.gov.br/cidades-sustentaveis/residuos-solidos/catadores-de-materiais-reciclaveis/reciclagem-e-reaproveitamento  (coleta seletiva)
[3] http://cempre.org.br/ciclosoft/id/9
[4] https://www.akatu.org.br
 
Em 2016, o Brasil foi considerado o país mais transfóbico do mundo. Arte: Deivid Pazatto

Em 2016, a ex-presidenta Dilma Rousseff assinou um decreto que permite a travestis e transexuais usarem o nome social em todos os órgãos públicos, autarquias e empresas estatais federais. O nome social é nome escolhido por essas pessoas de acordo com o gênero ao qual se identificam, independentemente do nome com que foram registrados no nascimento, como forma de legitimar a sua existência de acordo com a identidade que expressam na sociedade. Porém, esse decreto muitas vezes não é cumprido, o que leva ao constrangimento dessas pessoas ao serem chamadas pelo nome de nascimento em algumas instituições.

Um dos grandes fatores que acometem esse desrespeito é a transfobia, e está muito ligado à estrutura machista da sociedade – e aqui podemos frisar a brasileira. O Brasil desponta como o país mais transfóbico do planeta, com altos índices de homicídio contra a população trans.

Segundo a ONG europeia, a Transgender Europe (TGEu), em nenhuma outra nação há tantos registros de homicídios de pessoas transgêneras como no Brasil. O Grupo Gay da Bahia (GGB), em seu relatório anual, aponta que em 2017, 42,9% das LGBT assassinadas eram travestis ou transexuais – em número, foram 191 vítimas de transfobia, dos 445 homicídios registrados no ano passado.

Ser travesti ou transexual no país que mais mata essa população é uma tarefa de resistência diária. No levantamento feito pela Transgender Europe, que traz os números de transfobia entre 2008 e 2016, revela o quão assustador é pertencer à população trans e morar no Brasil. Os números levantados mostram que o Brasil teve 868 mortes durante o período de oito anos, liderando o ranking. Em seguida aparecem México, com 259; Estados Unidos, com 146 e; Colômbia e Venezuela, empatadas, com 109. O Brasil registrou 3,5 vezes mais mortes que o segundo colocado. Além disso, a expectativa de vida da população trans é de 35 anos, metade da média nacional.

Imagem: Projeto Transformar

O nome é a nossa primeira identidade. É através dele que nos apresentamos e o que nos diferencia em público. Em nossa cultura, os nomes possuem uma binaridade de gênero que nos é atribuído logo no nascimento, após o reconhecimento do sexo. Muitas vezes não gostamos do nome que nos é dado ao nascer, mas essa situação se torna muita mais complexa quando se trata de travestis e transexuais. Ao perceber que o sexo atribuído ao nascer e sua identidade são opostas, transgêneros travam diversos conflitos internos, começando pela utilização de um nome social que é desrespeitado. Algo que parece tão simples, porém, é uma questão de dignidade humana.

Sexo e gênero estão ligados à construção da identidade. O sexo é um atributo biológico, que nos classifica como feminino, masculino ou intersexo. O gênero representa como nos reconhecemos na sociedade e aí entram diversos fatores para a sua construção. Segundo a filósofa Judith Butler, o gênero é uma construção cultural, no sentido de que vamos nos apropriando de diferentes significados culturais para a construção de nossa identidade. Mas há uma associação cultural padrão entre o sexo e gênero. Essa expectativa nos limita logo ao nascer, e está muito ligada ao sexo biológico – órgão masculino = homem; órgão feminino = mulher. Essa construção cisgênera acaba caindo por terra quando os transgêneros se diferem desse padrão binário. O sexo acaba sendo o oposto do gênero vivenciado. E ter recebido um nome que não condiz com o gênero o qual se identifica, é muito difícil para travestis e transexuais.

Ao se perceber e entender com uma identidade diferente, o nome civil de travestis e transexuais representa uma pessoa que elas não são mais. A utilização e reafirmação desse nome gera diferentes conflitos internos e o que configura uma violência, seja no momento em que o outro pronuncia esse nome ou quando uma travesti ou transexual é obrigada a escrever o nome civil.

Essa autoagressão também é um dos fatores de provocam a depressão dessas pessoas. Por sofrerem violência, a população trans está mais suscetível a desenvolver quadros depressivos, levando muitas vezes ao suicídio. A transfobia vivenciada no dia-a-dia de transgêneros perpassa o âmbito familiar e está presente em diversos setores da comunidade. A violência institucional em relação a travestis e transexuais é a que mais fere quando se fala em respeito ao nome social. Universidades, hospitais e delegacias provocam diferentes tipos de constrangimento a essa população, começando pelo desrespeito ao nome social.

Após ataques transfóbicos e ao recorrerem às delegacias para prestar um boletim de ocorrência, transgêneros não tem seu nome social respeitado. Nesse sentido surge a necessidade de delegacias especializadas no atendimento a pessoas LGBT em todo Brasil. No que confere às travestis e transexuais, algumas delegacias das mulheres no país acabam direcionando o seu foco de atendimento também para essa população, como é o caso das delegacias especializada de Atendimento à Mulher (Deam) do Acre e na Paraíba, que desde 2017 garantem o direito de travestis e mulheres transexuais.

Após ouvirem e obrigadas a fazer o boletim de ocorrência com o nome de batismo nas delegacias, se agredidas, muitas vezes travestis e transexuais recorrem aos hospitais e a história se repete. O constrangimento retorna quando, para o atendimento, os profissionais da saúde utilizam o nome civil para cadastros. Em muitos casos, alguns profissionais negam atendimento, como foi o caso de uma travesti de Canela (RS), que após passar mal foi até o Hospital de Caridade de Canela. Ao se deparar com a travesti usando roupas ditas femininas, uma enfermeira omitiu socorro e ameaçou chamar o segurança. O caso aconteceu em 2011, mas só em novembro do ano passado o hospital foi condenado a pagar R$ 30 mil reais por omitir atendimento à travesti.

Bandeira arco-íris, símbolo dos homossexuais e também do movimento LGBT. Foto: internet

Uma pesquisa conjunta realizada em 2012 pela professora Martha Souza, doutora em Ciências pela USP, e pelo professor  Pedro Paulo Pereira, doutor em Antropologia pela UNB, acompanhou a trajetória de 49 travestis residentes em Santa Maria em busca de cuidados com a saúde. Intitulada Cuidado com saúde: as travestis de Santa Maria, Rio Grande do Sul, a pesquisa traz diversos relatos dessa população, entre eles a posição de marginalização que as travestis são colocadas. Durante a pesquisa, os autores contam que ocorreu uma tentativa de homicídio com travestis gêmeas. As irmãs relataram que após saírem com dois homens e eles perceberem que as duas eram travestis, foram agredidas com chave de fenda e alicate. Após pedirem socorro para um segurança de uma boate, foram todos para a delegacia. “Mesmo com testemunha, acabamos como bandidas. Ninguém acredita em travesti. Depois, precisamos ir até o serviço de saúde. […] Mesmo explicando que estava doendo muito, não deram remédio”, conta Whitney, uma das irmãs, com 22 anos na época.

Felizmente as irmãs gêmeas de Santa Maria se salvaram. Mas essas agressões se repetem dia após dia. A forma como a vida de travestis e transexuais são assassinadas é muito cruel. Facadas, pedradas, tiros. Mutiladas, dilaceradas, torturadas. Dandara é o maior exemplo da crueldade que a população trans está suscetível. Em fevereiro de 2017 ela foi torturada, agredida com socos, chutes, e golpes de pedra e pau em praça pública na cidade de Fortaleza, no Ceará. A exposição na qual Dandara foi submetida não ficou apenas em praça pública, mas foi parar nas redes sociais. 12 homens foram acusados de tirar a vida da travesti – até o mês de outubro desse ano, seis agressores foram condenados e estão presos.

O uso das redes sociais facilitou a comunicação e ampliou que mais informações pudessem circular e que esses casos viessem a conhecimento público. Essas mortes não são contabilizadas por delegacias e cabe às ONG’s fazer esse registro. O Grupo Gay da Bahia, criado em 1980, a mais antiga associação em defesa dos direitos LGBT, colhe todas essas informações, anualmente, através da internet, amigos ou outras redes que vão se fortalecendo para que eles possam contabilizar a proporção da LGBTfobia no país. A Rede Trans Brasil e a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) também são duas associações que fazem esse monitoramento, voltado apenas para a população trans. Até novembro desse ano, a ANTRA já registrou 149 assassinatos contra pessoas trans no Brasil.

Toda a vulnerabilidade a qual travestis e transexuais estão submetidas vem da transfobia que está impregnada nas raízes culturais do nosso país, muito ligada ao machismo, que acaba por refletir na população trans pelo fato de elas transpassarem os padrões heteronormativos. Não podemos esquecer dos homens transexuais, que por vezes são invisibilizados. Em casos de homicídios, os homens trans não são contabilizados nas estatísticas, por serem registrados com o nome de batismo nas ocorrências, novamente ferindo a identidade dessas pessoas. As mortes desses homens muitas vezes não são investigadas ou passam a ser enquadradas na lei do feminicídio, não configurando como um ato de transfobia.

Na luta pelo reconhecimento dos direitos da população LGBT, membros do Coletivo Voe posam frente ao público da 4ª Parada LGBT. Foto: Denzel Valiente

Os reflexos da transfobia ferem todos os campos da sociedade que são por direito de travestis e transexuais. A população trans é marginalizada em todos os setores da sociedade e essa exclusão reflete no grande número de travestis e transexuais que trabalham na prostituição. Devido a falta de oportunidade, essa acaba sendo a única opção de sobrevivência para a população trans, já que a oportunidade de outros empregos são muito pequenas, e se restringe a poucas empresas dispõem dessas políticas. Uma estimativa feita pela ANTRA, aponta de 90% da população trans recorre a prostituição ao menos em algum momento da vida.

Entre os motivos para a exclusão e marginalização da população trans, estão os grandes níveis de violência no contexto histórico do país – e aqui podemos citar a ditadura militar, onde travestis e transexuais eram perseguidas e mortas. A falha do Estado em investigar os crimes contra essa população, também é um dos motivos que leva ao aumentos desses números de violência. A vulnerabilidade da população trans na prostituição também é uma falha do Estado. Existem pouquíssimas políticas públicas que inserem essas pessoas seja nas universidades ou empregos.

A inclusão de travestis e transexuais nas universidade permite a oportunidade de entrarem no mercado de trabalho. O respeito ao nome social nesses espaços, pode representar uma importante condição de permanência dessa população nas faculdades, pois ali elas passarão a ser respeitadas e incluídas. Hoje, diversas universidades respeitam o nome social no Brasil. Em janeiro desse ano, o Ministério da Educação (MEC) autorizou o uso do nome social na educação básica para travestis e transexuais.

No Brasil não há legislações que garantam os direitos básicos de travestis e transexuais. Das poucas iniciativas nacionais, só constam o decreto sancionado pela ex-presidenta Dilma Rousseff que determina o uso do nome social em órgão públicos. Com isso travestis e transexuais também passam a ter o nome social respeitado, por exemplo, no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), onde são reconhecidos pelo nome que escolheram e nas eleições, a partir desse ano, onde mais de 6 mil eleitores votaram com o nome social. Também há uma portaria (nº 2.803, de 19 de novembro de 2013,) que determina a oferta do processo transexualidor (processo de hormonioterapia e cirurgia de adequação do corpo biológico à identidade de gênero e social), pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Essa decisões são frágeis, devido a falha do Estado e as diversas repressões que as pautas LGBT sofrem no Congresso Nacional. Reflexo disso é a não criminalização da LGBTfobia no país que mais mata LGBT. Em 2006, o projeto da ex-deputada Iara Bernardi chegou a ser aprovado na câmara, mas ao chegar ao Senado foi adiado e arquivado em 2014. Desde o início do mês de outubro desse ano, o site do Senado Federal está realizando uma consulta pública sobre o projeto de Lei do Senado nº 515/2017 que criminaliza a LGBTfobia, com autoria da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa. A consulta dá direito de votar sobre a alteração da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para punir a discriminação ou preconceito de origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero.

Mesmo com mais de 400 mil votos a favor e quase 7 mil contra a alteração, as bandeiras que envolvem a comunidade LGBT sofrem ataques e não seguem em discussão no Congresso devido aos parlamentares da bancada BBB (do boi, da bala e da bíblia) que vão contra os direitos dessa população. Todos os processos de transfobia citados, são reafirmados por lideranças conservadoras, que buscam a invisibilização do movimento e a exclusão de LGBT em todos os espaços.

O que ainda garante esses direitos, são as poucas lideranças representativas eleitas e algumas iniciativas estaduais e municipais. Uma dessas iniciativas é o Transcidadania, criado em 2015 pelo então prefeito da cidade de São Paulo, Fernando Haddad, que tem o objetivo de promover os direitos humanos e oferecer melhores condições de vida a uma parcela tão marginalizada da sociedade, como as travestis e transexuais. O programa concede bolsas de estudo e transferência de renda à população trans, levando educação, capacitação e garantia de direitos.

O nome social frente às diversas violências contra a população trans é um direito a dignidade humana.

O nome social frente às diversas violências contra a população trans é um direito a dignidade humana. Ser reconhecida ou reconhecido com o nome o qual se identifica é uma forma de existir e legitimar a sua existência enquanto cidadãs(os). O uso do nome social auxilia a população em tarefas que parecem corriqueira para pessoas cisgêneras, mas que são um problema para quem é transgênero, como a simples tarefa de abrir uma conta em um banco ou se candidatar a uma vaga de emprego. O uso da aceitação do nome social deveria ser obrigatório em todas as instituições e estabelecimentos para evitar os diferentes tipos de constrangimentos já mencionados quando utilizado o nome de batismo.

Ter o nome social reconhecido é o passo inicial na luta contra a transfobia, por isso a extrema importância para que a aceitação desse nome seja ampliada a todos os setores da sociedade. Um processo que era burocrático, hoje está mais acessível. Para obtenção da Carteira do Nome Social, a pessoa precisa ter no mínimo 16 anos e levar a Certidão de Nascimento no local onde feita a Carteira de Identidade na sua cidade. Após solicitar a Carteira de Nome Social, leva cerca de 10 dias para ficar pronta. Em fevereiro desse ano, o presidente Michel Temer sancionou o decreto nº 9.278/18 que regulamenta a lei nº 7.116 de 29 de agosto de 1983, para que as carteiras de identidade possam abranger o nome social de pessoas transgêneras. Para emitir a Carteira de Identidade com o nome social, basta que o interessado manifeste sua vontade através de um requerimento escrito e apresentar a Certidão de Nascimento. Junto com o nome civil, a identificação no novo documento virá acompanhada de “nome social”. A partir de 2019, todos os órgãos identificação deverão obedecer o novo decreto.

Desse modo, com a nova norma, não é mais necessário contratar advogados e passar por processos na Justiça para conseguir o nome social. O decreto articulado pelo Ministério do Direitos Humanos, é uma homenagem a João W. Nery, um dos maiores ativistas transgêneros do país. João, que faleceu em 26 de outubro desse ano, foi o primeiro homem trans no Brasil a passar por uma cirurgia de redesignação sexual (mudança de gênero). O projeto que leva o nome do ativista, parado há anos no Congresso, visa que a pessoa trans não precisará se submeter a cirurgia ou hormonização caso deseje alterar os documentos.

A nova carteira que trará o nome civil e o nome social juntos, pode não ser o suficiente para evitar situações constrangedoras, já que ela sugere os dois nomes e isso ainda permite ataques transfóbicos. As falhas do Estado são muito grandes é de extrema urgência políticas públicas para uma população que é dizimada no país. O desrespeito ao nome social é apenas a ponta do iceberg em um país que omite, esconde, máscara a transfobia em todos os setores da sociedade. Ser travesti e transexual no Brasil, é resistir e lutar pela vida todos os dias.

Artigo produzido para a disciplina de Jornalismo Humanitário, no segundo semestre de 2018, sob a orientação da professora Rosana Cabral Zucolo

“As gay, as bi, as trava e as sapatão tão tudo organizada pra fazer revolução!”. Entoando gritos de protesto e levantando cartazes, milhares de pessoas ocuparam as ruas de diversas cidades do Brasil contra a liminar concedida pelo juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª Vara do Distrito Federal. A decisão judicial permite que psicólogos ofereçam terapias de reversão sexual para LGBT’s.

Em Santa Maria, não foi diferente. Por volta das 14h30min, do dia 23 de setembro, manifestantes começaram a chegar na Praça Saldanha Marinho, o ponto de encontro para um ato público contra a “Cura Gay”. A manifestação foi organizada pelo Coletivo Voe, grupo de ativistas atuantes na cidade em defesa dos direitos LGBT’s.

Na praça, os manifestantes confeccionaram cartazes e pintaram seus rostos. As seis cores do arco-íris coloriram o espaço público e deram início a uma caminhada pelas principais ruas da cidade. Entre um grito e outro, eles pediam por respeito. O apoio a causa era mútuo e foi a partir daí que o estudante Henrique Pivetta Viero, 20 anos, teve a ideia de comunicar o Coletivo Voe para o ato público. “Após ler a notícia, fiquei indignado. Logo fui para as redes sociais e escrevi um texto de repúdio, onde recebi muito apoio de outros LGBT’s”, comenta.

E não foi só o Henrique que ficou tomado por indignação com tamanho retrocesso. A homossexualidade foi despatologizada pela Organização Mundial da Saúde em 1990. De lá pra cá, a população LGBT ganhou e ocupou espaço, mesmo rodeado por preconceito. Durante muito tempo sofreu represálias e ainda continua sendo oprimida. “O homossexual é estimulado a se esconder desde cedo. Quando descobrimos nossa identidade, a sociedade vem e diz: vocês não podem ser assim”, diz o estudante. Henrique já sentiu a mesma dor que muitxs outrxs meninxs sofreram. A sociedade o disse que era errado ser quem realmente ele era.

Mas quem é essa sociedade para querer nos curar ou dizer quem devemos ser? É a mesma que mata a cada 25 horas um LGBT? Que assassinou cruelmente 343 pessoas em 2016, entre elas Dandara e Itaberly? Reprimiu, espancou, apedrejou? Os dados são do Grupo Gay da Bahia, a associação mais antiga do Brasil que luta pelos direitos LGBT’s.

Essa mesma sociedade agora tenta nos curar e também tentou nos calar, com o fechamento da mostra Queer Museu, sobre diversidade sexual, exposta no Santander Cultural, em Porto Alegre. A única cura que queremos é a do preconceito, pois não vamos mais aceitar opressão, muito menos ficar dentro do armário. Ocupamos espaços e resistimos! Quando colocamos a cara no sol, em lugares “não apropriados para LGBT’s” (leia-se: cheio de conservadores), mostramos que existimos e que somos pertencentes a uma comunidade.

Temos nossa própria história, qualidades, defeitos e estamos logo ali. Somos seu vizinho, amigo, colega, irmão, filho. Estamos em todos os lugares. Não quero ser aceito, eu quero respeito! Mas em tempos TEMERosos, de tanto desamor e preconceito, ainda há esperança de dias melhores. “É importante ele crescer sabendo que as diferenças são naturais, e que existem vários tipos de expressões, sejam elas de gênero ou religiosa”, contou a professora Marta Nunes, que levou o seu filho, Francisco, de 8 anos, para participar do ato público. Se toda a família fosse como a de Marta, talvez não seríamos tantas vítimas nesse país.

Em 1969, a revolta de Stonewall, em Nova York, mostrou que temos força. A partir de uma série de represálias da polícia contra LGBT’s, a comunidade se libertou e enfrentou a opressão. Sabemos que somos poderosxs, e não vai ser a “Cura Gay” que vai tirar o nosso brilho. Estamos aí: na TV, no rádio, na internet. Estamos em todos os lugares. Isso se chama: re-pre-sen-ta-ti-vi-da-de.

Pabllo Vittar arrastou milhares de pessoas para cantarem suas músicas num palco secundário do Rock In Rio, um dos maiores festivais musicais do Brasil. Além disso, foi a primeira Drag Queen a subir no palco principal – como convidada da cantora Fergie -, levando o público a loucura. A história de descoberta e transição de um homem trans é contada na maior emissora de televisão do país. Liniker, Johnny Hooker, Linn da Quebrada… Uma nova geração LGBTQ+ que veio para derrubar padrões. Parece pouco? Pra gente, não! Cada espaço ocupado pode não ser uma grande revolução, mas é um empurrãozinho para que sejamos percebidos e representados. Temos brilho próprio e estamos cada vez mais poderosíssimxs. Aliás, o nosso rainbow é power!

Deivid Pazatto, acadêmico do 6º semestre do curso de Jornalismo do Centro Universitário Franciscano. Militante da causa LGBTQ.

11 de setembro de 2001, 8h46 min de uma manhã de terça-feira normal. O som do trânsito e da população de Nova Iork foi interrompido de forma súbita por um estrondo. Nesse momento, um avião de passageiros bateu em cheio contra uma das torres do World Trade Center, no centro financeiro de uma das maiores cidades dos Estados Unidos. Pela primeira vez, o povo norte-americano sentiu o horror de uma grande guerra. Dezesseis anos depois, as marcas do atentado ainda estão guardadas na memória da população, e mais que isso, na história.

Nesta segunda-feira, o presidente norte-americano, Donald Trump, prestou homenagem as 2.997 vítimas do atentado, assegurando que a tragédia jamais será esquecida. Trump, cercado de colaboradores, pediu um minuto de silêncio na hora exata em que o primeiro avião comercial sequestrado pela Al-Qaeda foi lançado contra uma das torres do World Trade Center.

Além disso, no Ground Zero (lugar da tragédia), em Nova York, houve uma homenagem aos mortos, também com um minuto de silêncio e leitura nominal das vítimas no ataque.

O 11 de Setembro mudou o mundo. A guerra contra o terror se intensificou e milhares de pessoas morreram no Iraque e no Afeganistão. Com isso, os EUA fortificaram suas defesas e não perdoam até hoje o atentado. Isso se comprova pela permanência dos soldados norte-americanos em solo afegão, lugar controlado pela AL-Qaeda.

O ataque apresentou ao mundo o terror que grupos extremistas podem causar  e que nem a maior potência mundial está livre de ameaças. No total, 2.997 pessoas foram mortas, sendo este considerado o maior atentado terrorista da história da humanidade até hoje.

Fernando Rodrigues Cezar, 21 anos, cursa o 6º Semestre do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Franciscano (Unifra). Monitor na Agência Central Sul. 

Observatório da mídia CS-02A visão que outros países têm em relação ao Brasil muitas vezes é chocante. Para alguns, somos o país do futebol. Para outros, o país do carnaval e da “bunda de fora”. Da gandaia. Do jeitinho. O que realmente importa, ao percebemos dentro deste contexto histórico, que nossa imagem para os gringos é marginalizada.

Em um país com tantas riquezas, permitir que sejamos vistos como marginais, favelados e ladrões aproveitadores não seria justo. É nesta hora que nos ocorre uma pergunta pertinente: de onde vem esta construção de imagem? Se você observar, vai perceber que muitas vezes são nossos próprios jornais que dão aos países vizinhos o estereótipo do Brasil.

Os noticiários de televisão chegam a dar medo. Você coloca na emissora local e lá vem uma enxurrada de notícias negativas. Mortes, assaltos, estupros, vandalismo, ódio gratuito. São tantos temas pesados que esquecemos que coisas boas também acontecem por aqui. Acredito que a mídia deve dar espaço para este tipo de notícia, mas não massacrar o telespectador como vem sendo feito. As notícias mais relevantes dos telejornais são os casos de violência ou os escândalos políticos, que vêm contribuindo significativamente para manchar nossa reputação. Os investidores não nos veem com bons olhos. A Copa do Mundo e as Olimpíadas nos retrataram perfeitamente qual a opinião dos outros países em relação ao que é noticiado mundo à fora.

A distorção de imagem afeta o turismo em cheio. As notícias refletem a fragilidade do comando político, o despreparo em manter um sistema de segurança que funcione e a falta de investimento em segurança nos remete à precariedade da educação. Sabemos que falta sanar muitas deficiências, mas estampar nossos problemas nas grandes telas também não vai mudar esta realidade.

Em minha mera opinião, acredito que, o telespectador precise de informação bem apurada, verídica e de fácil acesso. Jornalismo bem feito, que vá em busca de temas e assuntos que mostrem a sociedade, nossos problemas, e, ao mesmo tempo, deem espaço para notícias mais alegres e prazerosas de assistir. Que exista discernimento em saber a hora adequada para transmitir cada matéria. Que o telespectador volte a ter aquele velho gosto por assistir ao jornal. Que sentar em frente à televisão seja um momento de descanso e de aprendizado.

14269377_956954634415458_425496450_nWillian Ignácio, 27 anos. É estudante de jornalismo. Gosta de livros, café bem forte e quente, como a vida deve ser. Autêntico e de personalidade marcante. Prefere uma boa conversa com os amigos ou um filme no sofá a uma balada de final de semana. É apaixonado pela vida, e pela liberdade.

*Texto produzido para a disciplina de Legislação e Ética em Jornalismo

Observatório da mídia CS-02“Xenofobia é o ato de desconfiança, temor ou antipatia por pessoas estranhas ao meio daquele que as ajuíza, ou pelo que é incomum ou vem de fora do país.”

A proibição do burkini começou em algumas praias da França, onde mulheres foram hostilizadas ao usarem a roupa de banho em público. Isso foi o suficiente para começar um debate sobre o uso do burkini. A peça, criada pela libanesa Aheda Zanetti, cobre o corpo como uma burca, deixando rosto,mãos e pés de fora. A estilista defende que a roupa foi feita para dar oportunidade as mulheres frequentarem a praia sem irem contra sua fé.

Já o primeiro ministro francês Manuel Valls classifica o burkini como uma peça que se baseia na “escravidão feminina”.

Foi preciso a intervenção da ONU para que prefeitos de cidades litorâneas na França liberassem o uso da roupa de banho.

A população francesa tem opiniões diferentes, existem aqueles que apoiem o uso do burkini, mas também aqueles que concordam que a proibição precisa continuar.

Para assegurar uso de burkini nas praias francesas, ONU teve de intervir (Foto: Reprodução)
Para assegurar uso de burkini nas praias francesas, ONU teve de intervir (Foto: Reprodução)

No final das contas, o que implica o uso do burkini? Para as mulheres que seguem a religião muçulmana, isso significa a liberdade de ir à praia, além de ser avanço no estilo de vida e no modo de pensar. Para alguns franceses, é uma afronta ao seu estilo de vida liberal e uma retrograda nos dias atuais.

O que fica evidente com as proibições é o medo instalado que os franceses têm a respeito dos muçulmanos. E com isso é apresentado ao mundo, grandes atos xenofóbicos. Ao retirarem mulheres que usam o burkini das praias, os franceses vão contra tudo o que mais prezam, como liberdade de expressão e o direito de ir e vir.

Com os acontecimentos na França, as vendas do burkini aumentaram. Até mulheres não muçulmanas resolveram aderir à moda, como uma forma de apoiar aquelas que precisam utilizar a roupa na praia.

Eduarda Garcia

Texto produzido para a disciplina de Legislação e Ética Jornalística

Desde o dia em que fiquei atento durante meia hora ouvindo meu amigo contar uma história, que só envolvia gente corrupta e abuso de autoridade, e que, na verdade, era que um sonho. Ele só percebeu quando o relógio despertou pela manhã e tinha de levantar para trabalhar. Veio um turbilhão de sentimentos com a brincadeira. Era raiva e ao mesmo tempo alegria em saber que tudo não passava de uma brincadeira.

Encaixo está história do nosso cotidiano, do entrar em uma rede social a abrir um jornal. Na mídia, a gente só vê o confronto, a condenação, a crítica. O lado negativo assombra a mídia brasileira. Nas manchetes não faltam assassinatos e corrupção.

As redes sociais viraram um centro de críticas. Não faltam pessoas mal esclarecidas para repercutir negativismo no seu post, corruptos criticando corrupção. Cadê a consciência que temos que ter tempo pra nossa grama e mantê-la verdinha e cortadinha, para não cobiçar a do vizinho.

A opinião pública se formando por trás do que a mídia mostra. Mídia tendenciosa em seus interesses. Esta na hora do despertador brasileiro tocar. A gente precisa levantar da cama e arrumar a bagunça. A política pública precisa funcionar. O jornalismo também precisa atuar melhor nas apurações, ser feito de forma ética, mas também preocupado com o atendimento ao interesse público.

Não acho que a solução seja apenas confrontar, mas precisamos defender o jornalismo, despertar no mercado o que se aprende na academia.

11738081_849775708432946_7064593028884706523_nLucas Cirolini

Texto produzido para a disciplina de Legislação e Ética em Jornalismo