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Santa Maria, RS, Brazil

#EleNão

Quando elas dizem não

“Me disseram que não era necessário participar do ato para fazer a diferença nesta eleição, mas com o meu voto. Concordei, em partes. Realmente, no próximo domingo, por meio do meu direito como cidadã (conquistado por

O protagonismo feminino no #EleNão

O século XX foi marcado por guerras, extremismos e resistências. Foi neste período da história, que muitos paradigmas foram quebrados e pautas sociais começaram a ser discutidas, defendidas e amparadas por meio de leis na justiça.

Elas sim, ele não: a revolução das mulheres nas ruas

No último sábado, 29 de setembro, o movimento de “Mulheres Unidas Contra Bolsonaro” tomou as ruas para mostrar a potência da organização feminina. Depois sofrer ataques cibernéticos, agressão e tentativa de silenciamento por parte da oposição, os protestos

Fotos: Mariana Olhaberriet, LABFEM

“Me disseram que não era necessário participar do ato para fazer a diferença nesta eleição, mas com o meu voto. Concordei, em partes. Realmente, no próximo domingo, por meio do meu direito como cidadã (conquistado por pessoas que lutaram a anos atrás), direi não ao machismo, lgbtfobia, racismo, misoginia e ao fascismo. Porém, estar presente na marcha, compor aquele coro, olhar ao redor e ver tanta gente lutando pela paz e pelo nosso direito de existir, me fez sentir viva, com a esperança renovada de que podemos fazer a diferença sim. E que da mesma forma como há alguns anos a luta de pessoas que foram para as ruas nos garantiu o direito de votar, eu fiz parte de um movimento que foi à luta e à rua pela nossa liberdade, pelo respeito,  pela vida. Que orgulho de nós!  #elenão” (Paola Saldanha, estudante de jornalismo UFN)

 

“Não tivemos medo em 1968. Não tivemos medo em 2018. Não teremos medo. Sabemos que medo não nos é possível ter, porque a histórias mostra que nossos direitos são sempre questionados, porque nossas conquistas são diminuídas, nossas mortes são relevadas e nossos sacrifícios chamados de “extremismo”.                        Não temos medo,  pois quando um homem paira sobre uma bancada e idolatra um torturador, quando esse homem faz alusão à escravidão e trata negros e indígenas como sub-raças, quando esse homem brada que a maioria é que vai vencer, nós é que somos chamadas de radicais e ganhamos apelidos com apologia ao nazismo.   Incomoda quando fazemos de nossos corpos resistência, quando ressignificamos um corpo que é colocado como público, quando escolhemos renascer, quando negamos quaisquer violação corporal e social pelo nosso sexo.” (Amanda Souza, jornalista, Santa Maria)

“Foi, acima de tudo, um dia para nos fortalecermos, juntarmos as forças que acreditam no bem. Estou com muito medo do que vem pela frente, com um país dividido, em que nossas existências estão sendo ameaçadas em sua integralidade por brasileiros que deixaram de acreditar nos fatos, na ciência, nas instituições, nos valores que constituem nossa civilização. Gritar, sorrindo, ao lado de tantas mulheres “Ele Não” me fez sentir que não estou sozinha e que sempre teremos uns aos outros para continuar.” (Luciana Carvalho, jornalista, professora da UFSM Campus FW)

“O que vi foi que nós, mulheres, somos mais fortes do que pensamos. Mostramos que não fomos frutos de uma fraquejada, e que quando nos unimos, podemos mudar o nosso pais. Que independente de profissões, classe social podemos defender nossos direito conquistados ao longo dos anos com muita garra e determinação.” ( Maria Luiza Kosmann, doméstica, Santa Maria)

“Desde o surgimento do candidato da extrema direita fascista no cenário político, nós mulheres sofremos, mais ainda, diversas formas de violência e desrespeito por parte deste candidato. As manifestações #elenão foi um momento histórico em que as mulheres de vários segmentos tomaram as ruas e disseram não à forma violenta e truculenta com que estamos sendo tratadas. Não toleramos posição passiva da recatada que sofre calada. Nesta manifestação elucidamos a que viemos, a posição que nos cabe na esfera social e política deste país. Queremos políticas públicas que venha a contemplar a demanda do movimento feminista. Bolsonaro é hostil com as mulheres, mas o machismo, a discriminação e está em todas as instituições.”  ( Lúcia Magalhães Fagundes, psicóloga, Santa Maria)

O século XX foi marcado por guerras, extremismos e resistências. Foi neste período da história, que muitos paradigmas foram quebrados e pautas sociais começaram a ser discutidas, defendidas e amparadas por meio de leis na justiça.

A luta por espaço e protagonismo feminino não é de hoje. Engana-se quem pensa que o feminismo é vitimismo das mulheres e que a igualdade de gênero é respeitada no Brasil e no mundo. Quando o assunto é conquistas sociais, elas sempre chegam primeiro para os homens, depois, por meio de luta, empoderamento e protestos, as mulheres conquistam o mesmo direito.

As mulheres brasileiras só conseguiram o direito de votar em 1932, por meio de manifestações e muitos protestos. Embora elas fossem maioria na sociedade, eram sucumbidas a aceitar que os homens mandassem nas famílias, no país e em suas decisões, sendo caladas e fadadas a serem belas, recatadas e do lar. Foi então, que em 1933, o Brasil elegeu a primeira Deputada Federal da história, Carlota Pereira de Queiroz. 77 anos depois, o Brasil elegeu foi eleger, pela primeira vez, uma mulher como Presidente da República. Dilma Rousseff, foi eleita em 2010, e assumiu o trono de presidente no dia 01 de janeiro de 2011.

Ontem, sábado,29, em Santa Maria, RS. Foto: Daniel Z. Guterres (cedida)

O direito a eleições diretas para presidente no Brasil é recente. Afinal, ele foi surrupiado em 1964, junto com a liberdade de expressão e de imprensa, no golpe que matou, torturou e sufocou o brasileiros por 21 anos. Esse, que com certeza, foi um dos períodos mais tristes e nefastos da nossa história.

Após essa explanação rápida da história, vamos falar sobre o dia de ontem: 29 de setembro de 2018. O dia que milhares de brasileiras saíram pelas ruas do Brasil e do mundo para protestar contra um candidato a presidente da república. Em um movimento democrático, plural e apartidário, as mulheres protagonizaram caminhadas de luta por direitos, igualdade e respeito.

Segundo dados do ministério dos Direitos Humanos, divulgados em agosto deste ano, de janeiro até julho, foram denunciados, pelo menos 547 tentativas de feminicídio, no Brasil, por meio do disc denúncia. Isso quer dizer que as mulheres ainda são mortas por serem mulheres. Nesta última semana, um grupo de homens que compartilhavam suas histórias de assédio em espaço público  Facebook foi descoberto. Vivemos uma sociedade que não aprendeu a enxergar além da burca e ainda culpa o comprimento da roupa da mulher pelo assédio e atentado sofrido.

Por mais direitos assegurados e amparados, ser mulher é sofrer diariamente o medo do assédio, seja no trabalho, na rua ou em qualquer ambiente.  Segundo reportagem da revista Super Interessante, da Editora Abril, o Brasil ocupa 152ª posição no ranking de representatividade delas no Congresso. Perdemos, inclusive para países cuja a cultura é mais severa para mulheres, como Afeganistão.

O que vimos nas ruas do país ontem, foi um grito de luta. Foi a força das mulheres dizendo basta a políticas e políticos machistas que não respeitam seus direitos básicos e as menosprezam por serem mulheres.

Conquistas são construídas por meio de pautas que desconstroem e fazem a sociedade crescer. Obrigado a todas as fraquejadas que, em uma só voz, gritaram para o mundo que o machismo não passará. #EleNão

Concentração tomou conta da Avenida Rio Branco em Santa Maria.

No último sábado, 29 de setembro, o movimento de “Mulheres Unidas Contra Bolsonaro” tomou as ruas para mostrar a potência da organização feminina. Depois sofrer ataques cibernéticos, agressão e tentativa de silenciamento por parte da oposição, os protestos mostraram que não há como calar a voz das quase 3 milhões de mulheres, organizadas em um grupo no Facebook. Elas (nós) foram para a rua e não estavam sozinhas. Mulheres e homens, cis gêneros e transgêneros. Idosos, adultos, jovens, crianças e bebês, alguns ainda dentro da barriga. Pessoas das mais diferentes etnias, orientação sexual, crenças, partidos políticos e classe social. Uma pluralidade de vidas, histórias e seres que ultrapassa qualquer estereótipo criado na tentativa de deslegitimar a luta.

Foram centenas de milhares de pessoas reunidas em atos por todo o Brasil e no exterior.  Das grandes as pequenas cidades. De Erechim a Paraty, Frankfurt à Balneário Camboriú, Ilhéus a São Paulo. Segundo a Mídia Ninja, que organizou uma rede de cobertura colaborativa, as manifestações foram realizadas em mais de 250 cidades, 27 estados e dezenas de países.

O calor forte do sábado não dispersou a multidão. Fotos: Daniel Z. Guterres ( cedidas)

Em Santa Maria não poderia ter sido diferente. A organização estima que 7 mil pessoas participaram do ato que teve concentração de três horas na Praça Saldanha Marinho, região central da cidade, e seguiu em marcha por algumas das principais ruas do entorno. Ao som do Bloco TPM, sigla de Te Permite Mulher, os manifestantes seguiram por mais de uma hora pedindo #EleNão, hashtag que ganhou e deu força ao movimento.

Em meio à multidão, muitos comparavam a força do ato às Jornadas de Junho de 2013. O dia 29 de setembro tornou-se um dia histórico que representa a força das mulheres, considerando que o movimento se organizou a partir da mobilização feminina nas redes sociais. Mas os protestos estão longe de representar um desfecho. Não há desenlace para movimentos sociais, há somente a renovação das lutas e resistência pela permanência de direitos. Enquanto todas as pessoas não tiverem suas vidas respeitas e garantidas, a luta continua. E para nós, mulheres, a vigilância é cotidiana e persistirá, como tem sido ao longo da história.

Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilantes durante toda a sua vida”, Simone de Beauvoir.