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Negritude

A cultura afro no palco

O Theatro Treze de Maio foi sede da apresentação “Culto Afro”, o evento ocorreu no dia 19 de novembro, e teve como princípio mostrar a cultura do negro afro gaúcho escondido na história. O diretor do

O dia em que eu suspirei

Ontem, 20 de novembro, foi o dia da consciência negra. Uma data para lembrar da representatividade social, cultural e histórica do povo negro. Durante o dia, vi comentários superficiais e vazios. Pessoas que diziam que não precisa

Integrantes do grupo “Culto Afro” que se apresentaram no Theatro Treze de Maio. Foto: Rozan Ribeiro/especial

O Theatro Treze de Maio foi sede da apresentação “Culto Afro”, o evento ocorreu no dia 19 de novembro, e teve como princípio mostrar a cultura do negro afro gaúcho escondido na história. O diretor do espetáculo foi Gelton Quadros e o ator principal Rozan Ribeiro Borges,na eventualidade teve muita dança, sapateado e canto, ao todo foram 10 músicos que compuseram a trilha sonora com letras autorais.

Rozan Ribeiro Borges, 27 anos, acadêmico de Artes Cênicas da UFSM e ator principal da peça, ressalta que o evento visa demonstrar a importância do negro gaúcho na contemporaneidade, desconstruindo estereótipos criados há séculos.

Questionado sobre a violência e preconceito contra os negros, ele afirma que a inserção da educação sobre os costumes afros nas escolas desde os anos iniciais formaria uma construção diferente e positiva da atual realidade do país, pois é mais fácil conscientizar crianças do que pessoas mais velhas. Ressalta também que a peça em si ela é um protesto, ressignificando também vários signos que são associados aos negros e não são propriamente deles, o culto afro trouxe a importância do negro na construção social e cultural do Rio Grande do Sul.

O racismo ainda permanece em nossa sociedade e faz com que os negros tenham difícil acesso aos direitos que deveriam ser proporcionados a todos. A luta enfrentada por grupos de militantes da causa se torna mais forte e abrangente para apresentar as dificuldades e a falta de representatividade dessa classe em meio à grande massa.

Novembro é o mês da Consciência Negra. E, para dar destaque a esta data, foi realizado nos dias 10 e 11 deste mês, na auditório da Antiga Reitoria da Universidade Federal de Santa Maria, a 6ª edição do debate “Novembro Negro”. Na atividade, alunos de graduação e pós-graduação puderam expor seus trabalhos. Foram debatidos quatro temas, divididos nos seguintes eixos de apresentações: Violência, criminalidade e encarceramento; Migrações e refúgios; Racismo e subjetividade; Religiosidades Afro-Brasileiras: Intolerância Religiosa.

Uma das organizadoras da mesa-redonda, a professora Maria Rita Py Dutra, doutoranda em Educação e mestre em Ciências Sociais, docente há 30 anos, escritora e militante do movimento negro, concedeu à Agência CentralSul entrevista sobre o tema. Confira a seguir os principais momentos da conversa.

Maria Rita Py Dutra foi uma das organizadoras do Novembro Negro (Foto: GT Negros/Divulgação)

Agência CentralSul – Como a senhora avalia  o movimento negro dentro das escolas?

Maria Rita Py Dutra – Uma lei criou a semana nas escolas, porque a lei diz que é obrigado o ensino da história da cultura africana e que é para ter uma Semana da Consciência Negra. Isso foi um problema, porque a escola não faz nada durante todo o ano e quando chega em novembro começa a nos chamar para palestras. Eu acho que semana da consciência negra não deveria ter nas escolas, pois os professores devem trabalhar as questões étnico-raciais durante o ensino. Acho bem problemático, deveríamos ter um currículo antirracista em todas as áreas.

Agência CentralSul – Como a senhora avalia o preconceito das religiões de matriz afro na mídia, existe uma visibilidade ou eles acabam mascarando as coisas?

Maria Rita Py Dutra -Nosso maior problema é a questão da religiosidade, porque essas (igrejas) neopentecostais estão aí e elas possuem o poder. E é aquela coisa do Hitler, uma mentira dita muitas vezes se torna uma verdade. É eles principalmente através da igreja Universal possuem um plano político. Então é claro que muitas coisas não surgem na mídia, existe um desinteresse em mostrar os problemas enfrentados por nossas religiões.

Agência CentralSul – Existe uma preocupação do movimento negro com uma possível volta do Regime Militar?

Maria Rita Py Dutra – Eu não posso te falar em nome do movimento negro em si, porque eu por conta da faculdade estou um pouco afastada das militâncias. Mas nós do GT Negro temos essa preocupação. Meu medo maior é dessa radicalização que já está havendo. Meu medo é de que a bancada evangélica, por exemplo, assume o poder, porque isso está mais próximo e é preocupante demais. Temo até mesmo, daqui uns anos, ver gays, lésbicas e negros na fogueira.

Agência CentralSul – Toda essa desigualdade social é reflexo do racismo e da escravatura?

Maria Rita Py Dutra – Sim. Porque tudo passa pelos bancos escolares. E, por muito tempo depois do fim da escravidão, as crianças negras não ganhavam oportunidade de estudar, não podiam frequentar uma escola. E obviamente o racismo que ainda existe, por exemplo, em uma entrevista de emprego entre um branco e um negro a tendência é que seja escolhido um branco. O racismo influencia diretamente na questão da desigualdade social.  Nós precisamos de justiça social.

Agência CentralSul – Quais medidas a senhora crê que devam ser tomadas para expandir as informações sobre a cultura negra que possam diminuir o preconceito?

Maria Rita Py Dutra – A primeira medida a ser tomada é garantir o acesso e a permanência do estudante negro nas universidades. Depois disso, ele deve conseguir fazer o mestrado e o doutorado. As coisas só vão mudar quando nós tivermos professores negros em todas as universidades públicas e privadas do país. Existem muitos poucos professores negros nas universidades.

Agência CentralSul – Recentemente presenciamos ataques racistas dentro da UFSM. Como essa questão repercutiu na instituição?

Maria Rita Py Dutra– Os professores da universidade ficaram impactados. Não se esperava isso dentro de uma academia do curso de Direito (e de Ciências Sociais). Por isso que a gente entende esse Supremo Tribunal e esse Judiciário todo. As formações são muito retrógradas e conservadoras. O número de negros que frequentam faculdades é extremamente baixo e o ensino superior não foi pensado para a classe popular. Existe invisibilidade dos sujeitos negros, não só como estudantes mas também como professores. Temos relatos de colegas negros que o ônibus estava lotado e ninguém sentava do lado dele. O racismo está nas raízes do capitalismo e está atingindo toda a sociedade. Quem é diferente sofre em todas as localidades.

Caroline Freitas e Elizabeth Lima

Disciplina: Jornalismo Digital 1

Professor: Maurício Dias

Ontem, 20 de novembro, foi o dia da consciência negra. Uma data para lembrar da representatividade social, cultural e histórica do povo negro. Durante o dia, vi comentários superficiais e vazios. Pessoas que diziam que não precisa de data, outros disseram não existir mais racismo e, pasmem, ainda teve os que defenderam o “dia da consciência branca”.

Sempre achei que o racismo era coisa de novela. No dia 20 de novembro sempre fazíamos cartazes bonito na escola, ouvíamos palestras (ministradas por brancos) para discorrer a respeito do tema. Com o tempo, eu achava que todos eram tratados da mesma forma. A ideia de igualdade defendida e amparada na constituição, parecia perfeita. Na minha bolha, todos eram iguais.

Passados anos,  fui adquirindo informação e me deparei com uma realidade dura, racista, classista e preconceituosa. Segundo a Organização Mundial das Nações Unidas (ONU), pretos e   pardos têm mais desafios e dificuldades para se inserirem no mercado de trabalho. E de acordo com a reportagem da Carta Capital, publicada no último dia 19 de novembro, uma pessoa negra tem 79,8% maior de chances de ser vítima de homicídio. Os dados não mentem. Vivemos em uma sociedade racista, que pratica o preconceito (nada) velado.

O dia em que me deparei com essa realidade horrorosa, foi em um restaurante de Santa Maria. Não vou citar nomes para não constranger ninguém. Mas o fato doeu em mim e, com certeza, doeu muito mais na minha amiga e irmã de alma. Sabe aquelas pessoas a quem a gente se apega e tem uma ligação inexplicável? Pois bem, eu e essa amiga somos mais ou menos assim.

Uma vez, cansados com a rotina da faculdade, decidimos fazer um lanche em Santa Maria. O lanche nunca passou na garganta. Foi o pior gosto que eu senti. Ao chegar ao local, fizemos o pedido e ficamos felizes ao ler que estudantes tinham 10% de desconto. Na hora de pagar, eu, branco, simplesmente falei que era universitário. Não havia nada que identificasse que eu era acadêmico, porém, a caixa do estabelecimento me concedeu o desconto. Atrás de mim estava minha amiga. Quando ela falou que era acadêmica de jornalismo, a moça pediu a carteirinha de estudante. Imediatamente nos olhamos. Eu vi a tristeza e a indignação em seus olhos.

Naquele dia eu entendi que o racismo ainda existe, e  está presente em todas as esferas. Que ele não é velado! É escancarado e tapado com panos quentes por uma sociedade hipócrita, que não consegue se entender e acaba extravasando suas frustrações por meio do ódio e do preconceito.

O dia 20 de novembro existe para mostrar para as pessoas a importância do povo negro na construção da sociedade. Que o protagonismo não fique restrito a um banner bonito, com frases de efeito e sem significado algum.

A essa minha amiga e a todos os outros que sofrem com isso, eu desejo firmeza e empoderamento.  Desejo que a voz de vocês ecoe e não seja calada pela ignorância. Desejo que vocês sejam protagonistas da própria história  e do mundo. Quando a ignorância falar, a informação, sensatez e tolerância deve gritar a ponto de sufocá-las.

Pedro Corrêa é jornalista formado pela Unifra em janeiro de 2017