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violência contra a mulher

Nova lei municipal visa combater a violência às mulheres

Estão sendo fixadas placas informativas do serviço Disque Denúncia 180 nos sanitários femininos de bares, restaurantes, casas noturnas, casas de espetáculos e afins nos estabelecimentos de Santa Maria. Essa iniciativa foi aprovada em dezembro como lei

Nenhuma mulher precisa passar por violência doméstica

Milhões de mulheres no Brasil não têm acesso a educação. Elas também não possuem instruções para diferenciar quando sofrem violência doméstica. E você, sabe identificar uma pessoa que sofre com a violência doméstica? Não? Então você

Estão sendo fixadas placas informativas do serviço Disque Denúncia 180 nos sanitários femininos de bares, restaurantes, casas noturnas, casas de espetáculos e afins nos estabelecimentos de Santa Maria. Essa iniciativa foi aprovada em dezembro como lei municipal de número 6707. O canal de denúncia funciona 24 horas por dia, de forma gratuita e confidencial.

Segundo o vereador Rudinei Rodrigues, autor da lei, “nós temos reuniões para conversar com proprietários de estabelecimentos para fazer um acordo para colocar as placas. Temos que procurar os empresários também, não é só sobre “ser obrigado a colocar”. Eu acho importante também trazer o empresarial, os bares, as casas noturnas e as distribuidoras que os jovens frequentam muito hoje em dia. É importante que eles também colaborem, que também participem desta campanha e estejam de braços abertos para ajudar. É uma forma de fazer com que a sociedade se inclua no projeto, para que não fique uma lei sem impacto”.

As placas devem ser instaladas em lugares de fácil visualização para as clientes. Imagem: Luiza Silveira.

A iniciativa tem tido boa recepção por parte da sociedade também. Segundo Julia Dutra, estudante de Publicidade e Propaganda da Universidade Franciscana, “eu acho muito importante porque, querendo ou não, vai reforçar e incentivar as mulheres que estiverem em uma situação mais difícil. Isso reforça não só para elas, mas qualquer outra que possa estar entrando nessas situações e que talvez não dê conta de sair sozinha. Esse reforço de pedir ajuda e ter consciência de o que pode estar sendo feito a elas, pode ajudar as pessoas a superarem também”. As despesas em relação à produção das placas, assim como seu design, caberão aos donos dos estabelecimentos. A única obrigatoriedade é constar o número da lei e o Disque Denúncia 180.

O projeto não se limita ao combate dentro destes espaços. Com o objetivo de alcançar o máximo de pessoas, o gabinete do vereador produziu panfletos, camisetas e, segundo o vereador, “a gente vai fazer um banner para ser usado aos sábados na esquina do Calçadão ou na Rótula da Medianeira. Nós vamos chamar nosso grupo do gabinete para ficar segurando. Assim as pessoas que transitam poderão ver que existe essa lei e que ela é importante”.

Panfletos estão sendo distribuídos com o intuito de alcançar mais pessoas. Imagem: divulgação.

Ainda em 2022, uma lei semelhante foi sancionada no município de São Paulo. A lei em vigor na capital paulista aborda a criação de campanhas de cunho educacional com o intuito de combater a violência contra as mulheres. Embora este artigo não conste na lei santa-mariense, segundo o Gabinete Parlamentar “era para ser colocada uma emenda nesse projeto pela comissão. Entretanto, como ele tramitou e passou já no final do ano, acabou não sendo colocada. Nosso objetivo agora é, junto com a Procuradoria da Mulher, fazer essas campanhas educativas”.

Em caso de suspeitas de violência doméstica é possível fazer denúncias por meio dos canais:

  • Disque – 180
  • Brigada Militar – 190
  • Centro de Referência da Mulher – (55) 99139-4971
  • Delegacia da Mulher – (55) 3222-9646
  • Delegacia de Pronto Atendimento – (55) 3222-2858
Lei de número 6707

Produção e foto: Gabriela Agertt

Milhões de mulheres no Brasil não têm acesso a educação. Elas também não possuem instruções para diferenciar quando sofrem violência doméstica. E você, sabe identificar uma pessoa que sofre com a violência doméstica? Não? Então você precisa acompanhar esta reportagem.

A violência doméstica é toda aquela praticada dentro de casa ou do que é considerado ambiente familiar. Ela não consiste apenas em pais batendo em filhos, ou cônjuges em suas companheiras. A violência doméstica compreende violência sexual, física, e psicológica, assim como privação ou abandono exercidos dentro do lar entre pais e filhos, marido e esposa e pessoas com qualquer outro grau de parentesco. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de cada três casos de violência doméstica atendidos pelos plantões do Sistema Único de Saúde (SUS), dois envolvem mulheres. Crianças e idosos também fazem parte do grande número de pessoas que sofrem maus tratos nas casas do Brasil.

Em 2016, tramitaram na Justiça do País mais de um milhão de processos referentes à violência doméstica contra a mulher, o que corresponde, em média, a 1 processo para cada 100 mulheres brasileiras. Desses, pelo menos 13,5 mil são casos de feminicídio, conforme dados apresentados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

 

Violência em números

 

Conforme o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2018, os números são alarmantes. Em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas no país, o que representa uma taxa de 4,5 homicídios para cada 100 mil brasileiras, um aumento de 6,4% no período de dez anos. Em 2017, mais de 60 mil mulheres foram estupradas, um crescimento equivalente a 8,4%. Além disso, 1.133 feminicídios foram registrados no Brasil. Mais de 4.500 mulheres foram mortas e mais de 221 mil casos de lesão corporal dolosa foram registrados na Lei Maria da Penha. Cerca de 606 casos por dia.

Levantamento do Ministério Público do Estado de São Paulo revelou que a maioria dos assassinatos de mulheres acontece dentro do ambiente familiar e também durante a semana, de segunda a sexta-feira (68%). Jornalista do Estadão, Nana Soares, publicou no site do Jornal, em setembro de 2017, uma reflexão sobre gênero e violência. No texto, ela compila informações de violência doméstica, sexual e faz uma análise sobre os dados. Em um trecho da matéria, Nana diz que quase nada mudou no tratamento com vítimas da violência, mas que “também não muda o tratamento destinado aos agressores, classificados como loucos e anti-sociais, quando na verdade são o contrário: homens perfeitamente inseridos em uma sociedade que não dá o menor valor às vidas das mulheres”.

 

Identificação dos abusos

Alguns passos são fundamentais para que você reconheça se está sofrendo ou presenciando  violência doméstica. Entre alguns dos sinais de alerta, está a pessoa que tem machucados estranhos e inexplicáveis pelo corpo e rosto. O isolamento é outro sintoma: a vítima se afasta de amigos (principalmente homens) pelo medo de o agressor bater mais ainda. Além disso, expressões faciais também denunciam uma violência doméstica. O agressor pode parecer irritado e com raiva. A linguagem corporal do agressor também denuncia a violência. Ele pode cerrar os punhos, travar os dentes e se contorcer pela raiva. Cuide a movimentação. Carro da polícia em frente à casa do agressor é outro sinal de violência. Se você escuta constantes gritos por socorro, procure ajuda. A vítima precisa de auxílio para conseguir sobreviver. Armas podem estar envolvidas, então tenha cuidado ao se aproximar. Não negue ajuda, chame a polícia. A agressão física é a mais aparente, mas lembre que também existe a agressão verbal. Humilhações em público ou dentro de casa, discussões constantes com ameaças, domínio e controle sobre a companheira e intimidações são algumas das violências que a mulher sofre em um relacionamento abusivo, seja ele com o namorado, noivo, marido ou homens da família. O agressor utiliza-se do medo, inflinge culpa e vergonha para manter a vítima sob controle. Além disso, ele também pode machucar ou agredir alguém da família da vítima para mostrar força.

 

A Lei Maria da Penha

Não sinta medo. Você, mulher, está protegida desde 2006, com a Lei Maria da Penha. Ela é voltada para casos de violência doméstica e contra a mulher e foi criada por Maria da Penha,  para que o crime deixasse de ser de menor poder ofensivo. Maria foi agredida pelo marido diversas vezes em 1983 e, quando estava DORMINDO, levou um tiro de arma de fogo, que a deixou paraplégica. O caso só foi resolvido em 2002, quando o Estado brasileiro foi condenado por omissão e negligência pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. A pena para quem for enquadrado na Lei Maria da Penha é de 1 a 3 anos. Além disso, o juiz pode obrigar o agressor a participar de  programas de reeducação ou recuperação, e não é mais possível trocar a pena por doação de cesta básica ou realização de serviço voluntário.

Essa lei também criou novas formas de proteção à mulher ameaçada. Ela vale, por exemplo, para pessoas que não moram juntas. Nesse caso, o agressor só é preso se for pego em flagrante, se o comportamento dele oferecer risco à mulher e se, ao final do processo, ele for condenado. A criação da Lei Maria da Penha aumentou em 86% as denúncias de violência doméstica. Para ajudar as vítimas, o número 180 está disponível para denúncias. Além disso, existe a Casa da Mulher Brasileira, para aquelas vítimas que não têm para onde ir. Mesmo assim, os números, como visto no segundo parágrafo desta matéria, continuam crescendo.

Como denunciar?

Procurar uma delegacia especializada e realizar um boletim de ocorrência, ou ligar para a Central de Atendimento através do número 180. A denúncia é anônima e o serviço funciona 24 horas. A denúncia pode ser realizada pela vítima ou por alguém próximo a ela. A vítima também pode ligar para a polícia, no 190. Além disso, o número 100 está disponível como um dique-denúncia que auxilia em casos de agressões sexuais contra crianças e adolescentes, pornografia infantil e tráfico de mulheres. A Central de Atendimento à Mulher disponibiliza informações sobre a legislação, assim como, atendimento psicológico, jurídico e social à vítima. Além de guiar as vítimas sobre o que fazer. Desde 2014, o aplicativo Clique 180 apresenta informações sobre a Lei Maria da Penha.

Fonte: “Precisamos falar sobre violência doméstica”, por Julia Machado e Helena Moura.

 

O renascer de uma mulher

E como se recomeça a vida após um episódio de violência doméstica? O recomendado na cartilha feita pela Prefeitura de Passo Fundo é zelar pela integridade física e psicológica de todos os envolvidos. Se para isso for necessário a mulher abandonar a relação, ela certamente deverá tomar essa atitude. Mas sempre com muito cuidado, buscando apoio de amigos, familiares e profissionais. Ao contrário que se pensa, porém, muitos casais conseguem reconstruir a vida em comum, mesmo após um histórico de violência, após contarem com auxílio de profissionais. O importante é que você se sinta bem e protegida onde estiver.

 

Depoimentos:

Há dez anos, Jacinara*, sofreu as consequências de uma relação abusiva. Desse namoro, nasceu uma pequena que ainda hoje não sabe o que a mãe sofreu. Jacinara conta que desde o início já reconhecia a personalidade agressiva do companheiro.

“Ele sempre foi bastante genioso e orgulhoso. Sempre prezei pela liberdade e dizia isso a ele. Mas ele começou a abusar e saia para beber com os amigos e não tinha hora para voltar. Em um dos episódios, ele chegou em casa muito agressivo, me bateu e eu mandei ele arrumar as malas. Minha filha tinha 11 meses, na época, e morávamos com meus pais”, relata ela.

Mas conforme Jacinara, essa não foi a pior das agressões. “A tortura psicológica era constante. Manipulações a todo o momento. Ele me fazia pedir desculpas por erros dele. Meus pais nunca souberam que nosso relacionamento foi abusivo. Hoje minha filha não vê ele, e eu nem faço questão, já que ele mora em uma cidade do litoral gaúcho. Ele não liga e não procura”.

Hoje, ela já não se incomoda em falar sobre o assunto e ainda argumenta:

“Precisamos falar sobre o violência doméstica, para que ainda menos mulheres sofram abusos sexuais, psicológicos e agressões físicas. Tento conscientizar o máximo de mulheres possíveis. Hoje, já não me doi falar sobre o assunto”.

 

Paola* também diz já não se envergonhar para falar sobre o que sofreu dentro de um relacionamento abusivo de pouco mais de um ano. Ela conta que, no início, não havia percebido que estava sofrendo violência doméstica e psicológica.

“Só fui perceber meses após ter terminado o namoro. Ele me agrediu por 50 minutos no meu apartamento. Socos, pontapés, chutes, puxões de cabelo. Ele me atirava contra a parede e eu só gritava para que ele fosse embora. Ele só parou após a mãe dele ter ligado dizendo para ele ir embora, antes que eu chamasse a polícia. Antes disso, o padrasto dele entrou no apartamento, tentou intervir e tirar ele de cima de mim, mas não conseguiu. Foi horrível”, recorda ela.

Paola conta que a família do ex-namorado se omitiu com o socorro, assim como os vizinhos do apartamento, já que todos ouviam os gritos. Ela decidiu por colocar o agressor na justiça e fez pedido para uma sanção penal. Após três anos esperando, ela conseguiu participar da audiência que aconteceu há dois anos. “Ele entrou com recurso e eu nunca mais olhei o que aconteceu” – desabafa.

Na época, ela achava que só o apoio dos familiares e amigos a ajudaria superar o trauma. Mas hoje, Paola faz tratamento psicológico e toma medicamentos para conseguir dormir. Além disso, ela também deixa a televisão ligada dia e noite para não se sentir sozinha quando está em casa.

As duas vítimas são unânimes ao dizer que a violência doméstica deixa marcas para o resto da vida. Em Jacinara, é a filha quem sofre as consequências. Já Paola diz não gostar de toques até hoje, mesmo cinco anos após o fim do relacionamento. “Não é qualquer pessoa que pode me abraçar e, ainda assim, me sinto incomodada com amigos me tocando ou pessoas colocando as mãos em meus ombros para pedir licença ou me tirar para dançar em festas”, diz Paola.

 

*Os nomes foram trocados pela segurança das vítimas.

 

Reportagem produzida por Natália Venturini e Milena Dias para a disciplina de Jornalismo Investigativo, do Curso de Jornalismo da UFN, durante o 2ºsemestre de 2018, sob orientação da professora Carla Torres.

(Imagem: divulgação/MEC)
(Imagem: divulgação/MEC)

Mulheres que lutam contra a violência de gênero e contra a submissão na sociedade atual comemoraram com fervor o tema de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), ocorrido nos dias 24 e 25 deste mês. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) divulgou no início da tarde de domingo, após o fechamento dos portões dos locais de prova, o tema da redação “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”. Contendo dados estatísticos sobre a violência e abusos sofridos pelas mulheres e a consistência dos mesmos, a cartilha com as informações foi compartilhada nas redes sociais, com alegria, por feministas e militantes.

A professora do laboratório de redação do Curso e Colégio Objetivo Maria Aparecida Custódio afirmou ao G1 que o tema não deixou dúvidas e opções para defender a violência, visto que vai contra as normas dos Direitos Humanos e do edital da prova. “No ano em que o Enem propôs movimento migratório, ele dividiu os candidatos. Alguns foram mais a favor, outros acharam que ia ter falta de emprego no Brasil. No ano passado, com o tema da publicidade infantil, os candidatos também ficaram um pouco divididos. Por um lado, a publicidade ajuda a aquecer a economia, estimula o consumo, gera empregos. E tem o outro lado, o do estímulo ao consumo desenfreado, de não contribuir para a formação de cidadãos conscientes”.

(Imagem: divulgação/O Roubo da Pitangueira)
(Imagem: divulgação/O Roubo da Pitangueira)

A organização online Think Olga, que visa o empoderamento feminino, comemorou com seus seguidores a escolha do tema. “Neste momento, são 7,7 milhões de pessoas discorrendo sobre um tema essencial, mas sempre tratado como uma questão menor. Quem acompanha a Think Olga já estava preparada (o) – não apenas para tirar boas notas, mas para criar um país mais igualitário e justo”. Bem como a página O Roubo da Pitangueira, que postou dados sobre a violência doméstica contra a mulher, e depoimentos de meninas que fizeram o Exame Nacional. A repercussão do tema está gerando vários debates online, nas páginas e grupos feministas.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça, Departamento Penitenciário Nacional e Secretaria de Políticas para as Mulheres, dos 332.216 mil casos de denúncia de violência delatados às varas especializadas de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, apenas 33,4% desses casos foram julgados.
Em um país onde o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, restringe os direitos da mulher vítima de estupro ao atendimento emergencial do Sistema Único de Saúde e ao procedimento de aborto em caso de gravidez, o tema foi uma pequena vitória. 7,7 milhões de pessoas pensando e argumento sobre essa realidade tão assustadora e com dados alarmantes. O Mapa da Violência 2013: Homicídios e Juventude no Brasil revela que, de 2001 a 2011, o índice de homicídios de mulheres aumentou 17,2%, com a morte de mais de 48 mil brasileiras nesse período.

Laura ressalta as discussões que o tema está gerando nas redes sociais (foto: Diego Garlet/Laboratório de Fotografia e Memória)
Laura ressalta as discussões que o tema está gerando nas redes sociais (Foto: Diego Garlet/Laboratório de Fotografia e Memória)

A feminista Laura Lena Bastos, estudante de Artes Visuais da UFSM, considera que o tema tem de ser discutido com urgência. “Acredito que, antes de mais nada, foi um tema muito próximo da vida dos participantes do Enem. E convenhamos, é uma realidade horrenda que vivemos todos os dias, foi de extrema importância tratar deste tema, já que muitas escolas e famílias se recusam a tratar. Foi um incentivo a todos e todas de enfrentar o assunto. A repercussão que ele deu foi ótima para a discussão de gênero”, comemora.
A universitária Júlia Fleck, do curso de Jornalismo do Centro Universitário Franciscano, afirma que temos hoje um Congresso completamente conservador no comando do nosso país – o qual aceitou a proibição da venda de pílulas do dia seguinte, o que deveria ser direito de todas as mulheres. Isto, somado ao fato de que mulheres ainda continuam sendo mortas apenas por serem mulheres, o tema veio a calhar e se encaixou perfeitamente na atual situação do país. “O feminismo é algo que tem que ser discutido, ao passo que as pessoas, em sua grande maioria, têm uma ideia errada do que o movimento realmente se trata. O machismo mata. O feminismo pode salvar vidas”.

A luta das mulheres por direitos civis e sociais iguais aos dos homens, a luta contra o assédio nas ruas e contra a violência de gênero se fortalece cada vez mais em Santa Maria. A Marcha das Vadias tomou força na cidade e ganhou apoio de vários grupos sociais locais.
Porém, algumas feministas declaradas sofrem ataques de homens que não aceitam o empoderamento e a união feminina. A força que as mulheres estão ganhando assusta alguns homens que partem para a agressão – via online e fisicamente.
Um grupo de feministas fez uma manifestação em repúdio à violência no dia 5 de setembro. A mobilização teve como  motivo repudiar a agressão que uma menina sofreu em frente à boate Macondo Lugar, no estacionamento do outro lado da rua.

Laura já foi assediada em uma discussão sobre a hipersexualização de mulheres em vídeo-games (foto por: Diego Garlet/Laboratório de Fotografia e Memória)
Laura Lena Bastos acredita que os homens que criticam feministas nunca leram sobre o movimento (Foto: Diego Garlet/Laboratório de Fotografia e Memória)

Na página do protesto, muitas meninas foram atacadas verbalmente, expostas e assediadas por dois meninos que entraram no grupo para menosprezar o movimento. E infelizmente, muitas mulheres feministas sofrem isso todos os dias.
“Eles te chamam de vadia, qualquer coisa que venha na cabeça, e criticam com tudo que podem o movimento. É muita desinformação. Em primeiro lugar, muita carga que vem do início da luta feminista. Os homens que nos atacam nunca leram sobre o movimento e carregam o machismo, que está impregnado”, nota Laura Lena Bastos, estudante de Artes Visuais da UFSM, que já foi assediada algumas vezes nas redes sociais por sua militância. Ela também foi assediada em uma discussão sobre a hipersexualização de mulheres em vídeo-games.

(foto por: Tabata da Cruz/Laboratório de Fotografia e Memória)
Ana Carolina Bragança discutiu nas redes sociais com homens que atacam o feminismo (Foto: Tabata da Cruz/Laboratório de Fotografia e Memória)

No grupo online, estava Ana Carolina Bragança, que discutiu com os meninos por comentários num post. “Quem participa do movimento está exposta a sofrer esse tipo de violência. E mesmo quando não ocorre diretamente contigo, tu te afetas porque eles atacam o feminismo. Quem nos agride geralmente procura o porquê que lutamos e transformam em deboche ou menosprezam”, nota Ana Carolina. “Me senti violada,, como se nenhuma mulher pudesse votar, como se nós não tivéssemos que fazer isso, não tivéssemos que lutar por nossos direitos e nossas reivindicações. Temos que desvincular o feminismo do ódio, as pessoas acham que o feminismo é como o machismo, mas na verdade é igualdade que queremos e não excluir o gênero masculino”, explica a estudante.

Agressões físicas praticadas por desconhecidos

Thays já foi atacada na rua por um grupo de meninos (foto por: Roger Haeffner/Laboratório de Fotografia e Memória)
Thays já foi atacada na rua por um grupo de meninos (Foto: Roger Haeffner/Laboratório de Fotografia e Memória)

“Esse poder de diálogo com os homens só acontece quando eles sabem respeitar e param de atacar o movimento. As mulheres não gostam de falar sobre a causa com pessoas que só as atacam e criticam a luta. Hoje em dia a gente vê muito mais o empoderamento feminino do que diálogos com os homens. As mulheres estão percebendo o universo de privilégios masculinos e sabem que o patriarcado precisa ser derrubado. Elas enxergam muito mais disso do que aberturas para conversas com homens”, argumenta Thays Campagnol, que revela ter sido atacada várias vezes. Para a estudante de Direito, os ataques vêm de pessoas que não têm conhecimento da causa e de quem está no meio político.

Segundo a acadêmica Thays, são microataques que passam despercebidos, como participar em debates políticos e ser silenciada. “O fato que ocorreu, por exemplo, no grupo do Facebook ”Não Passarão! Manifestação em Repúdio à Violência Contra a Mulher! foram dois meninos que assediaram e ofenderam (além de expor) mulheres que participavam do protesto. Um deles tem 16 anos, e claramente não entende o movimento. Temos artefatos para processá-lo, mas sabemos que a Justiça não nos ajuda! Ele também fez uso do slut shaming, que é quando a sexualidade da mulher é reprimida, ela só é bem vista quando é para o homem. E eles usam isso na rua e fazem a gente se sentir violada”, desabafa a moderadora do grupo.

A feminista conta que no meio político existe uma rixa, pois as pessoas diminuem a causa, e eles atacam as mulheres que lutam chamando-as de ‘feminazi’, o que é absurdo, comparar a luta feminista com o nazismo, absurdo e ignorante.”São coisas que tem que haver uma compreensão. Os homens que estão no movimento estão lá para apoiar, e não para se colocar no lugar da vítima ou silenciá-la. Tu deves apoiar e entender, mas em momento nenhum ele deve apontar o dedo para uma de nós e atacar. Eles teriam que entender os privilégios e fazer essa desconstrução com eles mesmos, mas isso não ocorre, então é desconfortável para ambas as partes”, destaca a estudante.

Como Thays, outras feministas também já sofreram ataques físicos inclusive, na rua, por homens desconhecidos. Uma menina de 17 anos, feminista, que não quis se identificar (justamente por conta da violência), contou sobre a violência que sofreu no mês de abril deste ano. “Eu estava voltando do Parque Itaimbé, estava na rua Serafim Valandro, eram seis horas da tarde, tinham quatro meninos vindo na minha direção. Eles me viram e conversaram entre si, eles vieram e me colocaram contra a parede, passaram a mão em mim, me xingaram, eles sabiam que eu era feminista não sei como. Eles diziam ‘é isso que feminista precisa, você tem sorte por não te estuprarmos aqui mesmo’. Depois eles me empurraram e saíram e enquanto caminhavam me mandaram ‘ter cuidado’. Eu fiquei em estado de choque, fui pra casa e no dia seguinte fui na delegacia da mulher (DEAM) e tentei fazer uma ocorrência, mas por alguns desentendimentos não consegui registrar”, contou a menina.

Ela afirma que esse incômodo dos homens com a luta é por eles não estarem acostumados com isso, com mulheres se emponderando e tentando alcançar o lugar em que eles estão. Para a jovem, feminismo ganhou muita força agora, e as meninas os enfrentam e sabem que têm vez e voz para lutar, e eles ainda enxergam as mulheres como submissas.

A desinformação sobre o atendimento às vítimas

Débora Dias fala sobre a importância de registrar qualquer crime contra o corpo da mulher (foto por: Diego Garlet/Laboratório de Fotografia e Memória)
Débora Dias fala sobre a importância de registrar qualquer crime contra o corpo da mulher (Foto: Diego Garlet/Laboratório de Fotografia e Memória)

A delegada da Delegacia de Polícia para Mulheres, Débora Dias, afirma que é muito importante que se faça a ocorrência para criar antecedentes criminais, pois, quem faz esse tipo de violência contra a mulher geralmente fará de novo ou já fez outras vezes. E depois da segunda ocorrência de assédio ele cumpre uma pena, segundo Débora geralmente ele cumpre serviço comunitário. “Quando ocorre o estupro, que é um ato violento, com ou sem penetração, com ações libidinosas no corpo da vítima, o homem é preso imediatamente após a comprovação das investigações”, explica a delegada.

Assista ao depoimento captado pelo Laboratório de Produção Audiovisual (Laproa)
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