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Santa Maria, RS, Brazil

cirurgia

Sobre as coisas miúdas. Amarrar os sapatos

A cirurgia estava marcada para a terça pela manhã. Cedinho, eu devia fazer o trâmite da internação e ir para o setor do procedimento. Na segunda anterior meu organismo parou. Uma enxaqueca bárbara me tirou de

A cirurgia estava marcada para a terça pela manhã. Cedinho, eu devia fazer o trâmite da internação e ir para o setor do procedimento. Na segunda anterior meu organismo parou. Uma enxaqueca bárbara me tirou de duas reuniões e do meu roteiro. Só restava deitar e esperar para o dia amanhecer.

No dia seguinte todas as urgências estavam suspensas, nada mais era importante. 8:30 da manhã e a agulha estava pronta, o anestésico engatilhado, só a espera do médico. Às 8:50 menciono a última frase coerente para o anestesista e nada mais existe. Às 12hs uma voz insistente me chama. Estou ainda no nada, lugar que havia me acolhido logo cedo. Não sinto o menor desejo de deixar de ser nada ou ninguém para retornar. Demoro a voltar e volto sem vontade. Nessa breve viagem, mal sabia eu que daquele momento em diante teria um longo trajeto para reconquistar meu corpo.

Nenhum movimento estava disponível da mesma forma: levantar, sentar, dormir, comer, ir ao banheiro. Há a necessidade de ser ajudada, a autonomia básica está suspensa. Sinto um enorme respeito por quem experimenta a internação num hospital. Me comovo com as faces que vejo. Me comovem os acompanhantes.

Os acompanhantes parecem ainda menos preparados. Uma mulher com a qual partilho o quarto, recebe visita dos filhos e seu marido vem para passar a noite. Ele janta, joga no celular, dorme. Levanta, come durante a madruga, volta a dormir. A esposa, numa luta particular para evitar um parto prematuro, levanta sozinha, toma banho, joga no celular, dorme pouco e se preocupa muito. Não consigo fazer outra coisa que observar e contar uma ou duas histórias bobas.

Passo a noite em claro e só volto a dormir na noite seguinte depois de dar alta. Desse momento em diante uma das coisas mais simples, mais miúdas da vida, começa a me chamar a atenção. Sendo bem honesta, não consigo pensar em outra coisa a partir de então: os encontros fortuitos e as visitas. Cada cumprimento vinha com um: está tudo bem? E uma urgência em não aceitar outra resposta que um ‘sim, está tudo bem’. Não são propriamente perguntas, mas pedidos de confirmação de que tudo está sob controle.

‘Tu estás bem? Já está melhor, né?!’. O que essas frases ansiosas me dizem é que estamos num tempo em que não estamos dispostos a ouvir. A ouvir de verdade. Ouvir o que pode nos desestimular, o que pode nos amedrontar. Parece que não há outro tempo que não o de confirmar as expectativas dos outros.

Crianças, adultos de todas as idades, parentes de todos os graus. Ninguém abre uma brecha para algo que extrapole uma sentença breve e previsível. Me sinto oprimida, sem razão para dizer outra coisa que não ‘estou bem’.

De fato, quem experimenta um hospital não está bem. Mesmo que os procedimentos dêem certo, que os exames apresentem números regulares. Mesmo com as cicatrizes superficiais riscadas no corpo, elas não dizem o trauma do corpo, nem das perdas e medos daqueles dias. Que me desculpem o desabafo, creio que só escrevendo não tive que interromper, mentir, dissimular ou disfarçar sentimentos. Que mundo estamos construindo? O sucesso dos tratamentos não vem acompanhados de empatia.

Depois de duas semanas me adaptando às expectativas das perguntas, conversei com um amigo que me ouviu sem pressa. Desde então a mesma indagação vai e vem: que mundo estamos nos empenhando para criar? Honestamente, estamos inventivos e inovadores em processos de desumanização. As relações familiares, de trabalho, das redes sociais parecem estar mais baseadas nos interesses individuais e na redução de dano pessoal, sem levar em consideração na equação da vida a fragilidade dos demais parceiros de jornada.

Chego a escutar algumas pessoas indignadas com a linha desse texto, protestando porque não estou sendo positiva, que estou olhando o mundo de modo negativo. Imagino que algumas delas podem estar cheias de lições de vida e de como proceder. Perdoem-me mais uma vez. Nem a vida, nem a vida precária, nem a morte pode ser resumida em máximas positivamente ingênuas. Não lembro Polianna ou de Polianna moça tendo vidas interessantes e estimulantes. Não creio que tenham saído do jogo do contente.

A dor, a solidão, os desenlaces, as desistências fazem a vida também. Isso me faz lembrar da deusa indiana Kali, que protege o lar e a senhora da destruição, pode oferecer uma imagem mítica contraditória e de paradoxo sobre a existência. Vida e morte necessárias a continuação da existência uma da outra.

Por fim, sobra dizer, apesar da angústia que isso pode causar naqueles que perguntam se está tudo bem, é que nada está sob controle. Nada pungente, amoroso, profundo, inesperado e vivo está sob controle.

Assim, resta o convite irresistível de seguirmos com a vida também em sua precariedade. Há beleza nessa precariedade. Há satisfação genuína em voltar a abraçar sem medo de apertar os pontos cirúrgicos. Com o passar das semanas, uma alegria sem precedentes de retomarmos a potência do nosso próprio corpo e, inesperadamente, quando conseguimos amarrar os nossos próprios sapatos.

 

Paula Jardim Bolzan, historiadora e antropóloga, professora na UFN

O número de pessoas acima do peso e obesas no Brasil cresce a cada ano, a pesquisa divulgada pelo Ministério da Saúde em 2013 mostra que 51% dos brasileiros a partir dos 18 anos estão acima do peso, enquanto o número de obesos chega a 17% da população. Esses dados correspondem ao levantamento realizado pela Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) em 2012. Os índices de sobrepeso são maiores nos homens, cerca de 54,5%, enquanto as mulheres correspondem a 48,1%. Quando falamos em obesidade, as mulheres têm o índice pior, cerca de 18,2% delas são obesas, enquanto 16,5% dos homens apresentam o problema.

Jéssica Freitas antes e depois da reeducação alimentar. Foto:arquivo pessoal
Jéssica Freitas antes e depois da reeducação alimentar. Foto:arquivo pessoal

Na busca por uma saúde melhor ou até mesmo por estética, muitos brasileiros estão recorrendo a dois tratamentos para emagrecer, a reeducação alimentar e a cirurgia bariátrica. Para perder peso de uma forma saudável, sem precisar de cirurgia, procedimento invasivo ou dieta, a reeducação alimentar é uma das opções de muitas pessoas para perder os quilinhos a mais. A vida dos brasileiros está cada vez mais agitada, essa rotina faz com que muitos não consigam se alimentar de forma correta, causando assim, a obesidade, a hipertensão, o diabetes e outras doenças. Algumas dessas doenças são descobertas na velhice, é a partir desses diagnósticos que muitos começam a ter consciência da boa alimentação como forma de melhorar a qualidade de vida. Segundo a nutricionista Luciana Patias, é nessa hora que as pessoas descobrem que não se alimentam de forma correta e equilibrada. “É aí entra a reeducação alimentar, que na verdade consiste na mudança de alguns hábitos, mas sem deixar de fora o que faz parte da cultura do indivíduo”, afirma.
A estudante de Letras Jéssica Freitas, é uma das pessoas que optou pela reeducação alimentar, ela decidiu há pouco mais de 4 meses que iria se alimentar de forma saudável. “Eu decidi fazer reeducação alimentar pelo simples fato de ouvir deboches, apelidos e demais nomeações. Outro motivo para a reeducação alimentar foi minha saúde, pois minha família tem tendência a engordar de forma fácil e rápida, o passo que emagrecer o processo é muito lento”, explica.
A reeducação alimentar consiste em comer tudo que você gosta, mas de maneira consciente. “Você vai aprender que pode comer tudo, mas sem exageros e de forma equilibrada. O ideal é que o processo seja feito individualmente (personalizado), e com orientação de um profissional nutricionista, pois uma recomendação pode ser adequada para uma pessoa, mas não será para outra”, conta. A estudante Jéssica Freitas revela que iniciou a reeducação alimentar por conta própria, e que nesses meses ela já conseguiu perder cerca de 11kg.

A perda de peso aconteceu porque Jéssica cortou de sua alimentação comidas como frituras e doces. “Primeiramente abandonei as bebidas alcoólicas, pois eu usufruía das mesmas em festas de família, festas sociais e baladas de forma exagerada. Segundo eu diminui a porção de comida,” relata.

[dropshadowbox align=”none” effect=”lifted-both” width=”250px” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]A nutricionista Luciana Patias dá dicas para reeducar sua alimentação.
– Beba de 8 a 10 copos de água por dia;
– Evite o consumo de alimentos industrializados e fast-food;
– Substitua refrigerantes por sucos de frutas naturais;
– Inclua alimentos integrais no seu cardápio;
– Evite o consumo de alimentos ricos em gordura como: frituras, carnes gordas, queijos amarelos, manteiga;
– Doces são permitidos, mas esporadicamente e em pequena quantidade;
– Pratique atividade física regularmente.
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A cirurgia bariátrica também conhecida como cirurgia da obesidade é um dos tratamentos mais eficazes contra a obesidade grave. Com os avanços das tecnologias no decorrer dos anos fez com que o tratamento se tornasse uma das alternativas mais eficientes não só contra a obesidade, mas também contra doenças como diabetes e hipertensão. Segundo dados publicados na Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM) afirmam que o Brasil é o segundo país no mundo que mais realiza este tipo de operação, são cerca de 80 mil registros por ano.
A primeira cirurgia bariátrica foi realizada em 1954, por Kremen e Liner. O procedimento foi feito com a finalidade de promover a redução de peso e foi utilizado o by-pass (desvio) do intestino. Hoje, para que a cirurgia seja indicada existem vários critérios, o principal é quando o cálculo da massa corpórea (imc) for superior a 40. O procedimento só pode ser feito em pacientes a partir de 16 anos. Segundo a coordenadora da equipe multidisciplinar da Clínica de Cirurgia da Obesidade e do Aparelho Digestivo Ana Cristina, a cirurgia realizada hoje é a por videolaparoscopia. Essa técnica é feita a partir de incisões na parede abdominal, onde uma câmera de vídeo é inserida no paciente.

“É a cirurgia que não vai o corte aberto. A cirurgia possibilita uma menor dor pós-operatória, menor risco de infecção e menos tempo de internação hospitalar. Hoje, é um procedimento que dura cerca de 1h30min a 2h”, conta. A jornalista Laudia Bolzan decidiu fazer a cirurgia após passar por alguns problemas de saúde, os medicamentos tomadas durante o tratamento fez com que seu peso elevasse de 58kg para 130kg. “Eu comecei a ter problema na coluna, nos joelhos, dai foi tanto os efeitos desse medicamento que eu criei até leite na mama, o meu sutiã foi para o número 54, com isso tinha muitas dores nas costas”, revela.

Laudia Bolzan antes e depois da realização da cirurgia bariátrica. Foto: arquivo pessoal
Laudia Bolzan antes e depois da realização da cirurgia bariátrica. Foto: arquivo pessoal

O acompanhamento pré e pós-operatório é muito importante para que a cirurgia seja realizada com sucesso. “Na realidade a cirurgia não é uma mágica, na verdade ela funciona como uma ferramenta que proporciona a pessoa a perder peso, a emagrecer. Com essa perda de ela poderá fazer várias coisas que hoje ela esteja impossibilitada, além de melhorar as condições de saúde”, explica Ana Cristina.

A cirurgia bariátrica pode ser dividida em três passos: em primeiro lugar deve-se agendar uma consulta com um médico especialista da área para que seja realizada a avaliação inicial. Se caso a cirurgia seja indicada para o paciente, o segundo passo a ser tomado é a avaliação com a equipe multidisciplinar psicólogo, cardiologista, anestesista, psiquiatra e endocrinologista.

No terceiro e último passo serão feitos os exames de sangue, endoscopia digestiva e o ultrassom abdominal, após os exames a cirurgia será marcada.
A nutrição também faz parte desse processo, o objetivo é buscar o bem estar físico e emocional ao paciente. “É através da seleção dos alimentos que contenham os nutrientes adequados e que atendam às suas necessidades para que a rápida perda de peso seja equilibrada”, explica a nutricionista Luciana Patias.

Laudia Bolzan, que fez a cirurgia em 2012, perdeu cerca de 58kg até hoje. Pra ela a maior dificuldade enfrentada depois do procedimento foi querer comer mais do que podia. “O primeiro mês são só líquidos, tu toma 50 ml de liquido a cada meia hora, nas horas cheias é gelatina, caldo de uma sopa, chá, suco e nas meias horas são 50 ml de água. A partir do segundo mês, durante 15 dias tu faz uma dieta pastosa, tu vai comendo papinha de nenê, é a parte mais legal. Nos outros 15 dias do segundo mês já é uma dieta branda, dai tu pode comer pedaços pequenos de carne, e a entrada do terceiro mês é uma dieta normal”, conta.
A jornalista ainda conta que após a cirurgia a sua autoestima e confiança aumentou. “Tu se sente mais confiante, tu te sente mais capaz, o fato das pessoas te tratarem de uma forma diferente tu te acha mais capaz de conseguir fazer outras coisas que tu não faria por medo”.

Entenda os tipos de cirurgias de obesidade realizadas no Brasil
Cirurgias Restritivas – Banda Gástrica Ajustável
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Nesta técnica há o impedimento da ingestão de grandes volumes de comida, entretanto, não impede a ingestão de líquidos, mesmo os hipercalóricos, que engordam, como sorvete, leite condensado, refrigerantes, entre outros. Costuma-se perder de 20-30% do peso inicial dentro de 1 ano, podendo falhar em 30% dos casos.

Cirurgias Disabsortivas – DUODENAL SWITCH
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O estômago sofre uma redução parcial (150 a 300 ml) através do grampeamento e retirada de parte excedente do mesmo. Ocorre um desvio do trânsito digestivo, através da união do restante do intestino Esta cirurgia permite uma grande perda de peso, sem alterar muito a quantidade de comida ingerida. No entanto, pode causar carência de vitaminas, podendo levar à desnutrição em 2% dos casos.
Gastrectomia Vertical ou em “Manga”(Sleeve Gastrectomy)
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É uma redução de 80% do volume do estômago através de uma cirurgia por vídeo no qual o estômago é grampeado e cortado ficando com aspecto de um tubo cilíndrico, porém preservando-se a sua função de esvaziamento gástrico natural.Nenhuma parte do intestino é cortada.

Por Mariana Pedrozo, para a disciplina de Jornalismo Online