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Copa do Mundo Feminina de Futebol

Dezessete vezes Marta

Enaltecer mulheres e desconstruir o machismo recorrente da sociedade conservadora e com origem do patriarcado é mais do que importante para igualdade de gênero. Marta Vieira da Silva é um dos maiores exemplos de reivindicação por

2019 é o ano das mulheres no esporte?

Há décadas a luta das mulheres por direitos iguais e por espaço ocorre no esporte e em todos os âmbitos da sociedade. É dura a realidade do esporte feminino e, principalmente, a do futebol onde a

Enaltecer mulheres e desconstruir o machismo recorrente da sociedade conservadora e com origem do patriarcado é mais do que importante para igualdade de gênero. Marta Vieira da Silva é um dos maiores exemplos de reivindicação por direitos iguais no esporte mundial. A brasileira eleita seis vezes melhor jogadora do mundo tem usado a cobertura midiática da Copa do Mundo Feminina 2019 – uma cobertura histórica para o futebol feminino por sinal – a favor das mulheres e da igualdade salarial e de gênero.

No dia 18 de junho de 2019, Marta escreveu, mais uma vez, o seu nome na história do futebol mundial. A atacante se tornou a maior artilheira de Copas do Mundo, marcando seu décimo sétimo gol em uma copa, ultrapassando o alemão Miroslav Klose. Quem já leu meus outros textos aqui da coluna deve saber o quanto as coisas mudaram no esporte feminino desde o século passado, mas o reconhecimento tardio e a desigualdade de gênero ainda se fazem presente.

Se pararmos para pensar e construirmos uma linha histórica de principais acontecimentos do esporte no Brasil, relembramos aqui que, durante o governo de Getúlio Vargas, as mulheres eram proibidas por lei de qualquer prática esportiva. O decreto de 14 de abril de 1941 expunha regras no artigo 54 que impediam o público feminino de praticar qualquer esporte no país. Lei que caiu no final dos anos 1970.

Seguindo a linha de fatos históricos para o esporte feminino, é praticamente impossível falar de esporte e resistência no Brasil sem citar Aída dos Santos. Pulando obstáculos, literalmente, por ser uma atleta da  modalidade salto com vara, e quebrando barreiras, a brasileira foi a primeira mulher representante do país a disputar uma final olímpica, única atleta da equipe de atletismo nacional e única mulher da delegação brasileira nos Jogos de Tóquio, em 1964. Ela chegou à Olimpíada sem apoio algum, sem patrocínio, sem técnico e muito menos com uniforme próprio, precisando adaptar e ajustar a roupa de outra modalidade e competição. E mesmo com todas as dificuldades, Aída ficou em quarto lugar naquela olimpíada. Muitas mulheres mudaram a história do esporte no país e colaboraram para a desconstrução da ideia de que mulheres não podem praticar esportes.

O ano tem sido marcado por momentos importantes para o esporte feminino. A Copa do Mundo da França 2019 está sendo transmitida em dois canais na TV aberta, Rede Globo e Rede Bandeirantes, além do canal fechado SporTV. Com os holofotes do mundo inteiro virados para elas, finalmente, as atletas tem ocupado seus espaços de fala, além de usar a seu favor a mídia.

A atacante brasileira Marta não chamou a atenção somente pelo grande futebol nessa copa, mas a atleta tem reivindicado direitos de patrocínio iguais, usando uma chuteira sem marca alguma, mas com a bandeira de igualdade de gênero estampada. Marta não aceitou nenhuma proposta das grandes marcas esportivas por um simples motivo: elas ofereceram a ela um valor muito abaixo do pago aos homens, o que é um absurdo.

A expectativa é grande e o apoio às brasileiras tem batido recordes nessa copa, empresas têm parado o expediente durante os jogos da seleção feminina, pela primeira vez, para que os funcionários assistam às partidas. Neste domingo, 23, a seleção brasileira entra em campo contra a França, às 16h, pelas oitavas de final. O apoio e o incentivo dado às atletas, principalmente, nas redes sociais durante a fase de grupos deve continuar nos próximos jogos e permanecer após essa histórica Copa do Mundo Feminina. Poste, compartilhe e use as hashtags #GuerreirasdoBrasil #CopadoMundoFeminina e #SeleçãoFeminina para aumentar cada vez mais a circulação e a visibilidade do esporte feminino.

Uma das grandes lutas das mulheres é por espaço, espaço de fala, espaço de visibilidade, espaço e direito de ir e vir sem ser assediada, espaço pra ser quem quiser e fazer o que bem entender e não ser julgada. Ser mulher no esporte é resistir para poder existir, é treinar sem apoio, é trabalhar enquanto eles descansam. Ser mulher no esporte é ser resistência e acreditar que eu posso, que ela pode, que você pode e que todas nós podemos juntas.

 

Agnes Barriles é jornalista egressa da UFN. Foi monitora e repórter da Agência Central Sul durante a graduação e atuou no MULTIJOR. Tem o jornalismo esportivo como referência em pesquisas e reportagens desenvolvidas. É engajada com causas sociais e busca dar espaço e visibilidade às minorias.

Foto: arquivo ACS

Há décadas a luta das mulheres por direitos iguais e por espaço ocorre no esporte e em todos os âmbitos da sociedade. É dura a realidade do esporte feminino e, principalmente, a do futebol onde a falta de investimento e visibilidade do poder público interferem no rendimento das equipes e na formação de novas atletas.

Existem inúmero argumentos por parte, principalmente dos homens, para tentar explicar a ausência de investimento nos esportes femininos. Um desses motivos é a falta de interesse por parte do público. No entanto, existe a questão que nos leva a pensar no porquê da falta de interesse.

E cabe dizer que a construção midiática em torno do futebol masculino é uma das causas do sucesso e do comércio  que se tornou o esporte. Sem falar que uma coisa puxa a outra. Se não existe interesse por parte da mídia  em visibilizar o esporte feminino, isso resultará na falta de interesse dos telespectadores.

A mídia tem sua parcela de culpa na falta de apoio ao esporte feminino, como mostra uma pesquisa realizada pela Unisinos. De acordo com os dados levantados, apenas 2,7% da cobertura midiática no país é voltada ao esporte feminino, 37 vezes menos que o esporte masculino.

O preconceito e a falta de incentivo às mulheres no esporte não é de hoje. O artigo 54 do Decreto-lei 3199, de abril de 1941, expõe: “Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza”. Na época as mulheres tinham a prática esportiva negada por lei, enquanto a seleção masculina de futebol iniciava a sua trajetória de conquistas. Após anos de proibição, a lei só foi abolida no final da ditadura militar em 1979. Assim, após quarenta anos da queda do decreto que proibia as mulheres de praticarem esportes no país, o futebol feminino começou a ganhar espaço e credibilidade.

[dropshadowbox align=”none” effect=”lifted-both” width=”auto” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]O Corinthians é o atual campeão feminino e recebeu a premiação de R$120 mil, já o Palmeiras, campeão masculino, foi gratificado com R$30 milhões. E ainda tem pessoas que dizem não ver diferença na luta por igualdade de gênero no esporte.[/dropshadowbox]

A partir deste ano todos os clubes que disputam a série A do Campeonato Brasileiro devem ter uma equipe feminina adulta e uma de base, além disso elas precisam disputar pelo menos um campeonato oficial. E se cada conquista é considerada uma grande vitória no combate ao preconceito no esporte feminino no país,  a diferença de investimentos e de patrocínio entre o futebol masculino e feminino continuam chamando a atenção.

Historicamente a Confederação Brasileira de Futebol segue mantendo a diferença de investimentos entre o campeão feminino e o masculino do Campeonato Brasileiro. O Corinthians é o atual campeão feminino e recebeu a premiação de R$120 mil, já o Palmeiras, campeão masculino, foi gratificado com R$30 milhões. E ainda tem pessoas que dizem não ver diferença na luta por igualdade de gênero no esporte.

Mesmo com a obrigação imposta pela CBF para que os clubes criem equipes de mulheres, o caminho ainda é longo para valorização e o reconhecimento do futebol feminino.

Um grande passo está sendo dado neste ano de 2019, pela primeira vez na história todos os jogos da seleção brasileira na Copa do Mundo Feminina de Futebol serão transmitidos em canal aberto. A Rede Globo transmitirá todos os jogos da seleção feminina na principal competição da modalidade que inicia em 7 de Junho, na França. O Sportv, canal fechado da emissora, transmitirá todas as partidas do torneio.

O Brasil vai em busca do título inédito da competição, já que em 2007 a conquista bateu na trave e a Alemanha se consagrou a campeã mundial daquele ano.

No mundial deste ano, o Brasil está no grupo C e estreia dia 9 de Junho, contra a Jamaica. Na segunda rodada, o duelo será contra a Austrália, no dia 13. E pra fechar a fase de grupos no dia 18 as brasileiras enfrentam a Itália. Com o objetivo de expandir o alcance do futebol feminino no Brasil, o aumento na visibilidade e a transmissão de todos os jogos da seleção feminina é um indício do crescente interesse, ainda pequeno, pelo esporte no país.

[dropshadowbox align=”none” effect=”lifted-both” width=”auto” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]A maior jogadora de futebol de todos os tempos é a brasileira Marta, que também foi eleita seis vezes como a melhor jogadora do mundo. Sem falar que a  camisa 10 da seleção, tem 15 gols marcados, o que a torna a maior artilheira do esporte em Mundiais.[/dropshadowbox]

E respondendo a pergunta inicial deste texto, 2019 é o ano das mulheres no esporte sim. E isto porque pela primeira vez a Adidas pagará às atletas patrocinadas pela marca, a mesma premiação paga aos homens.  Erick Liedt, diretor da marca, explicou em comunicado oficial que o objetivo de igualar as premiações vai além de corrigir a desigualdade de gênero, mas também busca incentivar as próximas gerações de jogadoras.

Com este posicionamento vindo de uma marca conhecida mundialmente chega a dar um conforto no coração e a esperança por apoio e incentivo ao futebol se multiplicam cada vez mais. Vitórias como essas citadas aqui são o resultado de décadas de luta e reivindicações que continuaram até que a desigualdade diminua, que a absurda diferença de salários diminua, que o preconceito diminua e que as mulheres tenham o suporte necessário para a prática de esportes no Brasil e no mundo.

 

Agnes Barriles é jornalista egressa da UFN. Foi monitora e repórter da Agência Central Sul durante a graduação e atuou no MULTIJOR. Tem o jornalismo esportivo como referência em pesquisas e reportagens desenvolvidas. É engajada com causas sociais e busca dar espaço e visibilidade às minorias