Diante da diversidade de manifestações públicas para debater o direito à liberdade, principalmente aquele que combate as muitas formas de opressão contra mulheres, o modo de se vestir chama atenção nas reflexões sobre tal cenário. As discussões mais recentes giraram em torno de uma pesquisa, apresentada em rede nacional, em que alguns entrevistados associavam e até mesmo justificavam abusos sexuais com a forma como a mulher se veste. Como se violências contra as mulheres encontrassem validade em posturas supostamente permissivas das mesmas em seu modo de se vestir ou de se comportar.
Com base nesse argumento as mulheres mulçumanas e indianas, por exemplo, não seriam abusadas. Quando chegamos a esse ponto, a liberdade ultrapassa questões individuais e se coloca autenticamente como um direito que todos temos. Nesse sentido, a possibilidade de ser livre no vestir-se se choca com a padronização da mulher brasileira, sugerida pela imprensa e pela publicidade, com uma sociedade machista e, ao mesmo tempo, com à mercantilização feminina.
Para a jornalista Bruna Homrich, as mulheres são violentadas de diversas maneiras, e uma das mais tangíveis e propagandeadas é, justamente, a associação entre o abuso sexual e o comportamento da vítima. Como se a roupa automaticamente pudesse justificar agressões.
“Não raro, em casos de estupro, temos de ouvir que a mulher só podia estar ‘pedindo’ por um abuso, visto seu modo de se vestir – leia-se roupas curtas, decotadas ou bastante justas. De inquestionáveis vítimas, passamos a provocadoras. Ao invés de proteção, a criminalização. Tudo isso pesa de forma absurda na vida de toda mulher diariamente”, ressalta Bruna que ainda lembra que ao sair nas ruas, as mulheres estão suscetíveis a olhares invasivos e palavras grosseiras, que para alguns são consideradas “cantadas”.
Questionado sobre o assunto, o estudante de direito, Pedro Henrique oliveira, de 21 anos, não relaciona a roupa com estereótipos e argumenta seu posicionamento através da subjetividade do vestir. “Por mais que eu ache algo feio outros vão gostar, não se pode julgar uma pessoa pela roupa que ela usa ou deixa de usar. Cada um se veste como entende ficar melhor e se for uma mulher de roupa curta, um mendigo de roupa suja ou um executivo de terno Armani, não se pode ser tão fútil a ponto de dizer que a vestimenta diz quem é melhor ou mais livre. A roupa pode ser tanto uma forma de expressão quanto um simples adorno. Não acredito que usar roupa curta é sinônimo de libertinagem, acredito que cada um deve usar o que lhe apetece e que temos que ter menos preocupações quanto ao que os demais vestem ou deixam de vestir”.
Esse ideal de usar a roupa que quiser, no entanto, é sutilmente confrontado, muitas vezes, com o que Luis David Padilha, acadêmico de publicidade e propaganda, 23 anos, expõe na sua opinião: a atitude de ponderar. “Eu não me importo com shorts e saias. Acho a mulher algo muito sensual. Só que existe a diferença entre a pessoa estar bem, e a pessoa estar vulgar”, critica o estudante. Ele justificou a vulgaridade ao uso de roupas que evidenciam ou até mesmo mostrem partes intimas do corpo. “Querendo ou não, eu não preciso ver ambas as coisas, e é por isto que eu não o faço. Mas eu não me atenho a ficar falando de quem faz, por que eles têm tanta liberdade de se vestirem como querem, como eu tenho”, revela Padilha.
Os julgamentos, entretanto, são comuns. As pessoas dificilmente não apontam para o outro. Mas, para Bruna Homrich, “o patriarcado e o machismo negam à mulher o direito sobre seu próprio corpo, normatizando uma série de condutas e levando muitas de nós a termos medo de avançar, de ousar, ou de simplesmente nos sentirmos bem e confortáveis em nossas roupas, em nosso estilo”. No ponto de vista da jornalista, é preciso romper as barreiras preconceituosas do modo de se vestir: “É preciso defendermos o direito ao nosso corpo, às nossas escolhas, à nossa liberdade”.
Por Carina Carvalho, Luis Vencato Junior, Mariane Belivaqua e Tais Lima
Reportagem para a disciplina Jornalismo de Moda