Lembra quando éramos crianças e ouvimos pela primeira vez as histórias de guerras? No início poderia ser apenas um emaranhado de datas, países e batalhas completamente desconectados da nossa realidade. Em algum momento, você provavelmente ficou horrorizado e perguntou: como? Como as pessoas deixaram acontecer? Precisamos viver nossas próprias tragédias para perceber o quanto a inércia é confortável.
Inércia e negacionismo parecem conceitos tão similares, quase sinônimos. Negamos o horror mesmo com as melhores intenções, mesmo sabendo de tudo o que está acontecendo nós encontramos na apatia uma forma de sobreviver.
Buscamos continuamente por novas alternativas, novas rotinas. Fazemos remendos em nós mesmos e no cotidiano para, de alguma forma, seguir em frente e suportar mais duas semanas até começar tudo de novo. A vida se divide em pequenos períodos de alívio, ilusão de ar nos pulmões, e longos intervalos de sufocamento. E seguimos em busca de alternativas que possam sustentar o ar, os dias. Não passou da hora de parar? Chega.
Não dá mais para fingir que alternativas individuais vão nos levar para longe disso. Chega de intercalar crises de ansiedade e artigos sobre produtividade do LinkedIn. Chega de sustentar o insustentável, de carregar o caos no colo.
Até quando? Há mais de um ano nós esperamos a virada de chave, o acontecimento que vai mudar tudo, a repentina luz no fim do túnel, aquilo que vai fazer as pessoas se levantarem para gritar “não dá mais!”. Mais de 400 mil mortos e nós seguimos negando a dor, o horror.
Desejo que encontremos forças e caminhos para sair da inércia, assim como as gerações anteriores encontraram. Eles descobriram formas de reivindicar a vida e se rebelar contra a barbárie. Que as aulas de história e a memória dos que partiram precocemente possam servir de impulso e inspiração para buscar a mudança necessária.
Arcéli Ramos é jornalista, egressa do curso de Jornalismo da UFN e publicará crônicas na CentralSul a cada 21 dias, a partir de hoje.