Na primeira noite do XX SEPE, Daniela Richter, doutora Direito pela UFSCe professora na Unifra debateu a responsabilidade que envolve a proteção integral de crianças e adolescentes e os novos riscos no ambiente digital. Com o salão do Júri lotado de estudantes não só da área do direito, mas também da comunicação, a professora fez uma introdução sobre o direito da criança que, com a atualização da grade curricular do curso de Direito, tornou-se matéria obrigatória, além de ser muito cobrado em concursos públicos e na prova da OAB.
Segundo ela, a ênfase na temática começou em 88, com a Constituição Federal e ganhou força em 89, com a convenção da ONU que trabalhou a Doutrina de Proteção Integral, origem de todo o movimento do direito da criança, consolidada em 1990 no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “A expectativa inicial não era ter um capítulo especial para a família e para criança e adolescente dentro da Constituição. Isso acontece depois que movimentos sociais fazem pressão nos governantes. Lembro de ver as pessoas subindo as rampas do Planalto com carrinhos de mão cheios de milhares de abaixo-assinados de ONGS ligadas aos direitos da criança. Isso fez com que esse capítulo fosse incluído na Constituição”, explica.
Até então, a criança ou adolescente que era considerada órfã, ou se encontrava em estado de vulnerabilidade social, ou era pobre, ou que praticasse capoeira, e inclusive àqueles que cometiam atos infracionais, que naquela época eram considerados como crimes. Essa situação irregular tratava todos de forma igualitária, a Proteção Integral vem para acabar com isso, e definir a criança e o adolescente como ‘sujeitos de direitos’, baseada em três princípios básicos: liberdade, respeito e dignidade. “É por essa razão que muitas vezes quando nos perguntam sobre as crianças terem muitos direitos sempre os corrijo: não são apenas direitos, existem também deveres, mas em especial, por esse descaso, por muito tempo a criança era propriedade dos pais e quando não tinham, eram segregadas, tanto é que na década de 90, 80% da ocupação da FEBEM era composta por adolescentes e crianças que não tinham cometido nenhum crime, mas o Estado achava que se os tirassem da rua, estavam resolvendo o problema. Essa era a solução encontrada, uma resposta demagógica do poder”, diz.
Hoje, o direito da criança conta diretamente com o trabalho interdisciplinar, é com o apoio dos conselhos tutelares e de direito, do CRAS, CRES, e pensando no cumprimento de medidas socioeducativas, o CEDEDICA, que forma-se uma rede de proteção, e todos juntos se esforçam para o cumprimento desses direitos.
Segundo ela, o Estatuto precisa ser atualizado em vista do advento da internet, para que haja uma maior conscientização sobre o uso dessa ferramenta. “Se nós adultos, muitas vezes cometemos gafes na internet, imaginem as crianças que têm acesso à internet, mas não sabem lidar com isso, pois na maioria das vezes estão desacompanhadas dos pais ou responsáveis”, afirma. Isso resulta na potencialização dessas crianças sofrerem crimes sexuais, como a pedofilia, o cyberbullying e o sexting, por exemplo. Ela também criticou o número altíssimo de lares ligados na televisão brasileira, destacando que quase 100% da população encara a TV como uma espécie de babá, já que as crianças passam mais tempo em frente à ela do que na escola.
A professora abordou também o cyberbullying e os casos de sexting polêmicos no Brasil nos últimos anos, e como essas práticas afetam diretamente na formação das crianças com acesso irrestrito à internet. Segundo ela, é preciso que as famílias estejam preparadas para conversar abertamente sobre esses assuntos, mostrar que tudo que cai na rede, fica lá para sempre. Um exemplo perigoso disso é a pornografia da vingança, o grande problema da atualidade. A professora exibiu alguns vídeos com relatos de pessoas que sofreram esse tipo de prática e sobre como o aplicativo Whattsapp têm contribuído para a disseminação desses conteúdos. “A ideia da má reputação social e todo o contexto de não saber lidar com a situação pode muitas vezes acarretar em medo, vergonha, e em alguns casos, o suicídio.Então, basicamente, precisamos ficar atentos à esses riscos no ambiente digital e investir em prevenção e educação, para um uso responsável dessas novas tecnologias e um maior comprometimento da família com esse ambiente de relacionalidades, não é xingando que uma consciência desses direitos vai se formar, mas sim através de conversa e conscientização”, finaliza a professora.