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ciclismo

O autocontrole e a capacidade de equilíbrio mental, são fatores comumente trabalhados na rotina de um atleta. Porém, desde o começo do surto do novo coronavírus, estas competências foram testadas, a ponto de exigir dos desportistas conhecerem-se mais, para que pudessem se sobressair diante da pressão psicológica enfrentada neste período.

Além das dificuldades relacionadas às adaptações dos treinos em épocas de lockdown, a mente tornou-se um dos principais obstáculos em um processo de aceitação. Ricardo Brandt, formado em Educação Física e doutor na linha da Psicologia do Esporte, afirma que parte deste sofrimento mental deve-se ao fato dos atletas estarem acostumados com um objetivo de vida naquela modalidade, e que pelo fato da “busca por essa meta” ser parcialmente interrompida, a tendência é que o psicológico venha a reagir de maneira unusual.

Professor na Universidade Estadual do Oeste do Paraná e inserido no ramo da psicologia esportiva, Brandt já trabalhou com atletas da Seleção Brasileira de Vela, ciclismo, futebol, futsal, tênis, atletas profissionais de triatlo e do remo paralímpico. Estes últimos, mentorados por ele, com foco nos preparativos para as Olimpíadas de Tóquio, em julho de 2021. Com toda sua bagagem de conhecimento, o psicólogo ressalta a importância da relação entre a busca por metas e a tentativa de equilíbrio mental e emocional: “As pessoas precisam criar um motivo para voltar a ter disciplina. Ter um gatilho para serem levadas a essa ação. Praticantes recreacionais ou amadores sofreram mais, pois trata-se de um processo mais lento que os retirem da inércia. Já no caso de pessoas que vivem do esporte 24h por dia, há a necessidade da criação de motivos para a prática pois, após a mudança do hábito, a tendência é que os outros venham junto com a disciplina”.

Tornou-se comum perceber, em meio aos longos intervalos de quarentena, diferentes métodos de reinvenção em cada modalidade. Atletas que levaram seus esportes para dentro de casa, assim como criaram novos hábitos de alimentação e introspecção, para auxiliar no processo de entendimento do corpo. “As pessoas precisam encontrar uma modalidade que elas possam chamar de sua, algo que amem e se identifiquem. Não é por indicação ou moda, é por experimentar práticas que consigam manter uma constância”, acrescentou Brandt, sobre a relevância do esporte na vida das pessoas.

De acordo com ele, o uso moderado da rede social, foi um ponto positivo para auxiliar na necessidade de aproximação e convívio entre profissionais deste meio. Ponto realçado pelo motivo de que os mesmos costumavam vivenciar inúmeras situações de inter-relacionamento em comparação ao “novo normal”. Outro ponto abordado pelo profissional, são as técnicas de relaxamento, como yoga, meditação e o mindfulness, considerados exercícios estratégicos para serenar a mente e readquirir o equilíbrio do organismo: “Exercícios físicos praticados em casa, estratégias para reflexão e o contato com a natureza são essenciais para o controle emocional, pois agem na liberação de hormônios e neurotransmissores, decisivos na manutenção do humor”.

Francielli Gasparotto em competição orientista – Foto: Arquivo pessoal

No entanto, nem todos conseguem lidar da mesma forma com desequilíbrios e readaptações psicológicas. Além dos pontos já citados, a alimentação e a depressão podem ser consideradas outras consequências deste processo. A paranaense Francielli Gasparotto sempre foi adepta ao esporte. Praticante nata de orientação e natação, passou por um árduo caminho durante os momentos de lockdown. Ela conta que devido aos regramentos de saúde social impostos durante a pandemia, precisou se ausentar de todas as suas práticas, o que abalou fortemente seu psicológico: “Parei com todas as atividades no começo da pandemia. Fiquei adepta à instabilidade, não sabia o que estava acontecendo… Fui aguardando as liberações dos protocolos de saúde, para retomar a prática dentro do possível”.

Segundo a orientista, o avanço de pesquisas científicas corroborou para que ela pudesse voltar às piscinas: “Como a natação é uma modalidade segura durante a pandemia, por englobar o distanciamento social e por levar em consideração que o cloro inibe a ação do vírus, eu retornei”. Posteriormente, já em 2021, ela retomou as atividades ligadas ao ciclismo. Porém, para chegar até esta fase de recuperação, grandes desafios mentais estiveram presentes em seus dias. “Foi algo bem difícil de lidar. Meu psicológico foi muito afetado, a partir do momento que vi que não teria mais as competições de orientação, assim como não teria como recorrer à natação e ao ciclismo”, desabafou. Ela acrescenta que, entre outros pontos, o sono e a alimentação foram fortemente impactados. “Tive muita insônia, algo que nunca havia experienciado. Foi a primeira coisa que apareceu em razão da falta do esporte. A parte da motivação foi por água abaixo, principalmente por eu não encontrar mais minhas perspectivas”, destacou.

Frente a aspectos como este, Brandt salienta o cuidado necessário por parte dos profissionais que lidam com o desenvolvimento mental de atletas, em relação à intervenção destas situações: “O psicólogo esportivo precisa conhecer seu paciente a fundo, ter um acompanhamento sistemático, analisar, entender e compreender como a mente dele funciona e responde às diferentes situações e contextos esportivos. É interessante planejar o que será feito, traçar os objetivos e saber regular aspectos emocionais, como a ansiedade, depressão, stress, humor, além da criação de rotinas de treino para o aumento de energia”.

Francielli Gasparotto em Stand Up Paddle – Foto: Arquivo pessoal

Porém, ao fugir dos parâmetros clássicos do funcionamento de uma mente esportiva, há outros vieses relacionados com o equilíbrio entre corpo e mente. Essa relação é interligada com os níveis de autoconhecimento e com a quebra de paradigmas psicológicos, no que diz respeito ao conhecer os próprios limites e se permitir experimentar novas áreas de atuação. Francielli conclui que um dos pontos positivos que o lockdown proporcionou foi a tentativa de descobrir mais sobre si mesma, além de intensificar a prática de momentos reflexivos, encontrados na meditação, espiritualidade e contato com a natureza. “Eu optei por começar com o Stand Up Paddle, já que eu simpatizava remar. Vi nesse esporte a oportunidade de fazer uma coisa que eu gostava, que era sair de casa e estar em isolamento e contato com a natureza. Essa escolha me trouxe a sensação de aliar o lago da Itaipu com o esporte, além da coragem e do fato de estar em meio a natureza”, revelou.

Por mais que a atleta não tenha retornado à orientação, estar em meio à água, sozinha e em sintonia com a natureza, possibilitou-a focar no desenvolvimento do autoconhecimento, ao fazer algo bom para a mente e para o corpo. “O atleta precisa se conhecer, para que possa trabalhar com regularidade emocional. O desenvolvimento da inteligência emocional é muito particular. Sem sombra de dúvidas, optar por outras modalidades e dedicar um tempo para a própria mente, é um tiro certeiro. Tudo que coopera com o intelecto pode gerar bons frutos”, concluiu Brandt. Percebe-se, por meio dos exemplos, a capacidade que o esporte tem de fazer com que haja a recuperação da autoconfiança, assim como, reequilibrar a relação entre foco e metas. De fato, a pandemia gerou inúmeros conflitos mentais a muitas pessoas, porém, se houver a análise sobre cada situação, percebe-se que existe uma alternativa de melhora e reflexão. O autoconhecimento sempre estará presente.

 

Produção da disciplina de Jornalismo Esportivo, durante o primeiro semestre de 2021, sob coordenação da professora Glaíse Bohrer Palma.

O alto índice de pessoas sedentárias no mundo todo, que já era preocupante, foi agravado ainda mais pela pandemia do novo coronavírus. Até cinco milhões de mortes por ano poderiam ser evitadas se a população fosse mais ativa, calcula a Organização Mundial da Saúde (OMS), que lançou, no final de 2020, novas diretrizes sobre atividade física.

Conforme o documento, é recomendado de 150 a 300 minutos de atividade aeróbica moderada a vigorosa por semana para os adultos, incluindo aqueles com doenças crônicas ou incapacidade. Para crianças e adolescente a média é de 60 minutos por dia.

Como explica o profissional de Educação Física, Gustavo Silva de Oliveira, “o esporte é um tipo de atividade física, trazendo assim, consigo, seus benefícios, como redução do estresse, controle do peso, melhora do condicionamento físico e melhora do sistema imune e cardiorrespiratório”.

Sendo assim, para garantir um estilo de vida mais saudável, diversas pessoas iniciaram a prática de algum esporte em meio a pandemia, principalmente modalidades individuais ou que exigem um grupo pequeno de participantes. A corrida de rua é um dos que se destacam na atualidade, principalmente pelo fato de poder ser praticado por todas as faixas etárias e não exigir um ambiente específico.

Corrida de rua é um dos esportes individuais que mais ganhou adeptos durante a pandemia | Foto: mega-studio/freepik

“Procuro sempre praticar onde não há circulação de pessoas. Então não costumo correr em pistas, e sim em rodovias ou estradas de chão. Por ser um esporte individual, possui diversos lugares em que pode ser praticado ao ar livre, longe de aglomerações. Então é simples de adaptá-lo durante a pandemia”, relata a sargento e atleta Ana Amaral.

Bom exemplo desta adaptação são as provas de corrida, que desde o início da pandemia estão suspensas. Sendo assim, houve um aumento nas competições virtuais, onde o participante, monitorado por um relógio com GPS ou aplicativo de celular, tem determinado período de tempo para concluir a atividade. Posteriormente, o arquivo é enviado para a organização para análise e validação.

No que diz respeito as vantagens identificadas ao praticar corrida de rua, Ana elenca que “uma das principais é a redução da chance de desenvolver doenças que o sedentarismo ocasiona, como cardíacas, obesidade, pressão alta e depressão, e o fortalecimento do sistema imunológico”. E acrescenta: “É muito bom fazer exames de rotina e verificar que tudo está normal, sem alteração. Sem falar na perda de gordura corporal e a bem estar físico”.

“O ciclismo é um vício e eu não quero largar esse vício”. Essas são as palavras do vice-prefeito de Formigueiro, Gilson Murilo Belmiro Severo, que, com 53 anos, aproveitou a pandemia para voltar a pedalar. “Eu diminui peso, perdi 10,2 kg. Eu tinha muito problema de insônia, hoje não tenho mais, eu durmo muito bem, me alimento bem”, conta.

E vai muito além da parte física. Severo explica que com a prática do esporte obteve melhoras na saúde mental: “a cabeça da gente funciona melhor, até para a questão de raciocinar eu sinto que tive uma melhora muito grande”.

Assim como a corrida de rua, o gosto pela bike cresceu durante a pandemia. O vice-prefeito relata que percebe um aumento muito grande na quantidade de pessoas adquirindo bicicletas. “Comece devagar, com muito cuidado, não queira fazer pedaladas muito longas no inicio. Devagar vai indo, vai indo, e você chega lá. É um ótimo exercício para todo o tipo de pessoa, seja ela nova, de meia idade, ou idoso, todos merecem e gostam de pedalar”, orienta.

Mas o aumento no número de atletas durante a pandemia não foi refletido em todas as atividades. Na musculação, por exemplo, o profissional de Educação Física Dioner Cardoso, que trabalha em uma academia, relata uma queda na procura pelo medo das pessoas contraírem o vírus, ainda que considere eficazes os protocolos de segurança, desde que cobrados e monitorados.

A musculação é “uma forma de manter a pessoa mais ativa quanto ao exercício físico e, portanto, também ajuda na melhora da imunidade, que é importante no combate ao vírus”, destaca Cardoso.

A microempresária Karol Dotto, que pratica o esporte, compartilha da mesma visão. “Procure uma academia que siga os protocolos e use sempre, de forma correta, a máscara e álcool gel, tanto nas mãos quanto nos aparelhos. Também é possível seguir um treino intenso em casa, o importante é se manter ativo, a imunidade agradece”, destaca.

Essa busca por esportes individuais foi comprovada por meio de um estudo realizado pelo Google, com base em pesquisas no buscador e atividades do Youtube, aliado a uma pesquisa da consultoria especializada Sport Track. Confira os principais dados no infográfico:

Elementos Gráficos: Freepik | Produção: Pablo Milani

 

Produção da disciplina de Jornalismo Esportivo, durante o primeiro semestre de 2021, sob coordenação da professora Glaíse Bohrer Palma.