Santa Maria, RS (ver mais >>)

Santa Maria, RS, Brazil

meditação

Terapias alternativas e seus benefícios

Desde o início da pandemia de Covid-19, em 2020, a busca por terapias alternativas aumentou significativamente, como formas de complementar a medicina tradicional ou apenas utilizando-as de forma isolada para garantir o bem-estar. A Universidade Federal

A ciência da meditação

A ideia de que a meditação é algo exclusivo para monges, que se isolam da sociedade em busca de iluminação está, cada vez mais, caindo por terra. A luta diária contra o relógio, prazos e cobrança

Desde o início da pandemia de Covid-19, em 2020, a busca por terapias alternativas aumentou significativamente, como formas de complementar a medicina tradicional ou apenas utilizando-as de forma isolada para garantir o bem-estar. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, realizou um estudo que revelou que 80% da população desenvolveu distúrbios relacionados à ansiedade, sendo um dos responsáveis pelo crescimento da busca pelas terapias.

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) realizou uma pesquisa que indica que a prática mais utilizada pelos brasileiros durante a pandemia foi fitoterapia, seguida por meditação e reiki. O trabalho ouviu mais de 12 mil pessoas. Grande parte das formas de tratamento alternativos são baseados em conhecimentos milenares , provenientes das culturas orientais  e indígenas.

Pesquisa realizada pela Fiocruz mostra as terapias mais procuradas durante a pandemia. Fonte: Fiocruz

Reiki

A pedagoga e terapeuta holística Cleia Carolina Freitas tem formação em reiki e florais de Bach. Ela conta que o reiki surgiu no Japão na década de 1920, porém somente a partir da 1980 começou a entrar em alta, pela própria divulgação dos japoneses. A história conta que o o Dr Mikao Usui era responsável pelo johrei (método de canalização de energia espiritual) da igreja metodista. Porém o johrei possui cunho religioso e para Mikao não era viável trabalhar com uma terapia sagrada das mãos vinculada a uma religião. Sua principal intenção era ser uma técnica de cura e não uma religião.

O funcionamento da terapia é dado através do alinhamento de pontos de energia, chamados de chakras pelo reiki. A terapeuta explica que: “Os chakras se alinham através do toque das mãos, no primeiro momento são traçados os símbolos do reiki, o terapeuta se banha com eles e passa para o paciente no ambiente, depois começa a aplicar em cada ponto de energia”. Ele não contribui apenas para a saúde mental das pessoas, como também para a saúde psíquica, espiritual e física, porque, de acordo com Cleia,  “as doenças são somativas, nosso organismo vai acumulando os bloqueios, traumas, decepções, emoções negativas e descarrega em uma parte fisiológica, em algum órgão, que se transforma em doença”. O reiki é uma terapia reparadora, ela também relata que “na primeira vez que o paciente recebe, fica muito concentrado no que estão fazendo com ele, então não sente tanto os efeitos. Na segunda ele já sente um estado de concentração e relaxamento, está muito mais receptivo à terapia. Já na terceira ele sente o alinhamento emocional, físico, espiritual e mental”. 

 A terapeuta também desmistifica a forma como a terapia deve ser realizada: “O reiki no início tinha muito sensacionalismo, tinha uma certa publicidade, que tinha que ter um ritual perfeito e você tinha que seguir aquele ritual. Hoje não, atualmente ele pode ser aplicado em um campo de batalha, pode-se aplicar nos animais, pode-se aplicar em qualquer lugar”.

Atualmente a sociedade está mais receptiva à busca por estas terapias. A expansão destes interesses resultou em processos seletivos no Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) para que terapeutas possam aplicar reiki em postos de saúde, hospitais e consultórios dentro de uma sede do INSS.

Meditação

 A meditação é uma técnica milenar conhecida como a terapia mais completa que existe, Cleia explica o porquê: “Ela consegue te voltar para o seu ego, anulando ele e te faz voltar para o seu eu maior, para o centro da sua alma. As pessoas têm uma grande dificuldade de aprender a meditar e, na verdade, não é simples. Mas depois que aprende, é possível praticar em qualquer momento”. Ela também ensina uma forma de começar a técnica: “através de um mantra, qualquer mantra que você conheça, começa falando, depois mentalizando, até seu corpo entrar em relaxamento total. A meditação exige uma forma que o corpo esteja confortável para atingir o relaxamento, mentalizando o mantra você vai esquecendo das outras partes do corpo, não sente mais a consciência corporal, sente um estado de relaxamento total e a mente esvazia, você não pensa em nada”.

A técnica pode trazer diversos benefícios para quem a pratica, “tem uma vida emocional equilibrada, respira bem, consegue trabalhar a sua vida profissional de forma tranquila. Através da meditação se tem um bom relacionamento com as pessoas, ela nos ensina a ouvir o outro”, explica Cleia. Cássia Bairros faz o uso da técnica há mais de três anos e conta que os benefícios são vários: “Aumento da concentração, melhora na qualidade do sono, mais tranquilidade pra resolver os problemas do cotidiano, um olhar mais amplo e atento sobre a realidade, a interação social também”.

Práticas de meditação realizadas em evento no dia da mulher em que Cássia participou. Imagem: Cássia Bairros

Hoje existem na internet diversos vídeos de meditações guiadas que, segundo Cleia “ começa com aquele aprendizado, que é simples e fácil. Nas primeiras vezes você não consegue, na terceira vez já é possível entrar no estado meditativo e na quarta vez você já está na técnica da meditação propriamente dita, que é conseguir alinhar o teu pensamento, as partes do teu corpo no relaxamento, na zona de conforto, e aí na quinta tu já tá fazendo a meditação sem ser guiada, só procura um mantra, existem diversos mantras”. É uma técnica acessível para todos e não custa nada.

Floral de Bach

Em relação à terapia dos florais,  o que é mais conhecido hoje é a pesquisa de florais Edward Bach, que tem este nome por conta do médico britânico que pesquisou 38 flores durante 30 anos. No inicio ele chamou o trabalho de placebo espiritual, depois entendeu que a energia das plantas, do néctar, da essência das flores tinham uma conexão muito forte com o nosso comportamento. Cleia explica que: “nós, terapeutas holísticos, receitamos os florais e o paciente entra em um estágio negativo nos três ou quatro primeiros dias. Depois do quinto dia ele começa a sentir o efeito da essência das flores na sua vida. Fazemos o diagnóstico da pessoa, para sabermos o que ela esta sentindo, se é ansiedade, depressão, dificuldade de aprendizado, uma situação de isolamento, medos desconhecidos ou outras atitudes comportamentais que podem ser regulamentadas pelos florais”.

Os florais têm uma conexão muito forte com o nosso comportamento, “a partir do momento que começamos a tomar os florais, nós nos observamos e nos surpreendemos conosco. O floral transforma uma atitude negativa em uma positiva”, conta a terapeuta. Existem diversos outros florais além dos de Eduardo Bach, porém todos eles são baseados na pesquisa da essência das flores e todos eles possuem o mesmo efeito, de acordo com Cleia “não é só um placebo espiritual mas também uma ferramenta maravilhosa para alinhar chakras, alinhar comportamentos negativos e levar a pessoa a fazer uma releitura do seu próprio eu, do seu ego e chegar a conclusões diferentes do que antes ela tinha”.

Formas alternativas ou complementares de buscar ajuda em terapias são comumente associadas à religião, porém a terapeuta explica como as diferentes religiões não afetam o processo de terapia:

Em 2018, o Ministério da Saúde incluiu dez terapias alternativas ao Sistema Único de Saúde (SUS).  São elas: apiterapia, aromaterapia, bioenergética, constelação familiar, cromoterapia, geoterapia, hipnoterapia, imposição de mãos, ozonioterapia e terapia de florais. Com as recentes adições, o SUS passa a ofertar 29 procedimentos complementares à população. São chamados de Práticas Integrativas e Complementares (Pics) e utilizam recursos terapêuticos baseados em conhecimentos tradicionais, voltados para curar e prevenir diversas doenças. Evidências científicas têm mostrado os benefícios do tratamento integrado entre medicina convencional e práticas complementares.

Matéria produzida no primeiro semestre de 2022, na disciplina de Linguagem das Mídias do curso de Jornalismo da Universidade Franciscana.

Divulgação

A ideia de que a meditação é algo exclusivo para monges, que se isolam da sociedade em busca de iluminação está, cada vez mais, caindo por terra. A luta diária contra o relógio, prazos e cobrança dos outros e de si mesmo por sucesso e realização estão fazendo muitas pessoas procurarem antídotos para a ansiedade que só parece aumentar.  Além desse cenário, a meditação também pode ser uma grande aliada da  saúde, prevenir doenças, regular o ritmo do corpo e proporcionar uma vida com mais qualidade. É por isso que as práticas meditativas, apesar de milenares, têm sido utilizadas de maneira bastante expressiva nos dias de hoje.

Não existe uma definição objetiva do que seja a meditação, pois ela varia de acordo com o contexto que está inserida. Ela pode, por exemplo, variar de acordo com a religião de origem, ou pode ser utilizada de maneira secular. De qualquer forma, pode-se dizer que é uma prática de autorregulação do corpo e da mente, caracterizada por um conjunto de técnicas que treinam a focalização da atenção.  

É possível classificar, de uma maneira ocidental, a meditação em dois estilos básicos: mindfulness e concentrativo.

O mindfulness pode ser considerado uma prática de abertura, em que há um cuidado na percepção dos estímulos do  corpo, como pensamentos, sentimentos e sensações. No entanto, a atenção mantida deve ser uma observação livre, sem julgamentos ou análises criteriosas.

Já o concentrativo restringe a atenção a um elemento, desconsiderando os estímulos do ambiente, focalizando uma atividade mental ou sensorial como um som (mantra) ou a respiração, por exemplo.

Rodrigo Debiasi, oncologista, utiliza técnicas de yoga e meditação no tratamento dos pacientes. Foto: arquivo pessoal

Nas últimas décadas, pesquisadores submeteram monges e meditadores a baterias de exames para descobrir o que acontece no cérebro dos praticantes. “Os cientistas descobriram que a meditação provoca um efeito físico na nossa massa cinzenta que ajuda a combater a degeneração cognitiva. O controle da mente também reduz o stress, uma das principais causas de doenças crônicas no mundo, além de recuperar o nosso DNA e ser um eficiente remédio contra a dor”, comenta o oncologista clínico Rodrigo Debiasi.

Meditação e redução da ansiedade

Sessões regulares de mindfulness reforçam o foco e a calma, melhoram a comunicação entre as áreas cerebrais e, como consequência, a capacidade de lidar com situações adversas. Outro benefício é a redução dos níveis do hormônio do stress, o cortisol.  Quando as taxas desse hormônio ficam elevadas por muito tempo, podem enfraquecer o sistema imune. “Ao reduzir o cortisol e aprimorar a forma como lidamos com nossos problemas, o sistema de defesa é reprogramado. Biomarcadores ligados a inflamações são reduzidos, blindando o organismo contra infartos, AVCs, diabetes e até o câncer”, explica Debiasi.

A meditação preserva a atividade de uma enzima, a telomerase, que protege os telômeros, estruturas marcadoras da idade celular formadas por DNA e proteínas. Cada vez que uma célula se divide, os telômeros ficam menores, enquanto a telomerase trata de reconstruí-los. Se a enzima não funciona como deveria, os telômeros ficam mais curtos, e a pessoa se torna mais propensa a infartos, diabetes, obesidade, depressão e desenvolver doenças degenerativas como a artrite e a osteoporose.

Como a meditação atua no corpo

O endocrinologista Rafael Reinehr. Foto: arquivo pessoal

O médico endocrinologista Rafael Reinehr elucida que a meditação está ligada a uma redução da atividade do sistema nervoso simpático, que leva a efeitos benéficos como redução da adrenalina, noradrenalina e do cortisol, um aumento do óxido nítrico, com consequente redução da frequência cardíaca, da pressão arterial do consumo de oxigênio, da glicose e da tensão muscular.

“Estudos de neuroimagem por SPECT cerebral conseguiram demonstrar que a meditação, praticada durante pelo menos dois meses, já é capaz de modificar a densidade e a atividade de áreas cerebrais como o giro do cíngulo e as amígdalas cerebrais, levando a uma menor irritabilidade e impulsividade, além de aumentar a atividade de áreas cerebrais responsáveis pela atenção, pela calma, pelo bem-estar e pela felicidade”, explica Rafael.

Além dos benefícios já comentados, Reinehr também explica que a meditação traz uma melhora na performance cognitiva, melhora da insônia e de sintomas em pacientes com dor crônica, fibromialgia, síndrome do cólon irritável, dentre outros.

Dessa forma, a meditação proporciona a criação de um ecossistema imunológico, hormonal e metabólico, indissociável do sistema neuroendócrino, que produz benefícios em larga escala em vários órgãos e sistemas corporais.

Nessa mesma linha, o médico Rodrigo Debiasi comenta que através da hipertrofia da massa cinzenta em áreas corticais relacionadas à atenção e outras áreas como a ínsula (núcleo duro das emoções) e o hipocampo (guardião da memória), a meditação pode servir como um antídoto contra o envelhecimento cognitivo, uma vez que as áreas citadas tendem a diminuir com o envelhecimento. “Além disso, a atividade no lobo frontal aumenta muito, o que faz com que o praticante experimente uma sensação mais clara de felicidade, e tenha menos pensamentos negativos”, explica o oncologista.

Meditação e estudos científicos

Apesar das práticas meditativas serem antigas, as comprovações científicas de seus benefícios são bastante recentes. A meditação tem sido estudada desde o início da década de 1950, ganhando força nas últimas duas décadas. “O interesse crescente faz com que hoje já encontremos mais de 4800 referências na busca pelo termo “Meditation” e mais de 5300 na busca pelo termo “Mindfulness” no PubMed, um repositório de artigos científicos”, explica Rafael Reinehr, que está compilando artigos científicos em um livro, a ser publicado no final deste ano, com o título “Os Efeitos da Meditação na Saúde Humana”.

O desenvolvimento tecnológico possibilitou a criação de exames de imagens que documentassem as alterações na atividade cerebral para análise científica. A melhora na resolução desses exames também tem ajudado os cientistas a chegarem em resultados mais minuciosos das alterações da espessura e do tamanho das áreas cerebrais. “Sem essas ferramentas, seria muito difícil mostrar dados objetivos a uma comunidade científica que cada vez mais se concentra em números e porcentagens. Apresentar apenas dados de testes de qualidade de vida, por exemplo, sujeitos a uma imensa variabilidade no aspecto subjetivo, teria muito menos credibilidade, pois careceria de comprovações anatômicas e fisiológicas”, comenta Debiasi.

Apesar dos avanços científicos, alguns autores advertem que ainda é necessário pesquisas com metodologias mais rigorosas que comprovem que os benefícios da meditação não sejam subjetivos. Por outro lado, há uma grande quantidade estudos que sugerem que a meditação é de fato a responsável pelos efeitos positivos. Isso faz com que o assunto seja um terreno fértil para ser explorado nos centros de pesquisa e, na medida em que os resultados se tornam mais conclusivos, a prática seja ainda mais reconhecida.

“Da forma com que é feita hoje, na busca de rigor científico, os passos para realizar uma pesquisa são árduos e caros. Nem sempre se consegue reunir uma equipe e os recursos necessários para a concretização de uma pesquisa bem desenhada, justamente pela falta de interesse econômico por trás destas pesquisas. Afinal, quem vai lucrar com algo que devolve poder às pessoas?” questiona Reinehr.

Seja qual for o estilo de meditação preferido, é importante fazer da prática um hábito, pois seus benefícios são mais aparentes nas pessoas que praticam por mais tempo. O fato da meditação não necessitar de muitos recursos e proporcionar uma vida leve e consciente, faz com que cada vez mais pessoas adotem a prática em suas vidas. E se você ainda não medita, motivos não faltam para começar.

Referências: MENEZES, Carolina Baptista; DELL’AGLIO, Débora Dalbosco. Os efeitos da meditação à luz da investigação científica em Psicologia: Revisão de Literatura. http://www.redalyc.org/html/2820/282021772005/ Acesso em 16 de junho, 2018.

Por Diego Garlet dos Santos. Reportagem produzida na disciplina de Jornalismo Científico