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Tragédia

Julgamento da tragédia da boate Kiss tem início hoje

Na manhã de hoje, 1º de dezembro, foram abertos os trabalhos do primeiro dia do júri do caso Kiss. Foram sorteados os jurados do caso, composto por seis homens e uma mulher que, durante o tempo que

Sobre como os jornais impressos cobrem as tragédias

Encerrando o Seminário Desafios do Jornalismo, o Centro Universitário Franciscano recebeu na noite de ontem, o editor chefe de Zero Hora, Nilson Vargas, a editora de geral do Diário de Santa Maria, Carolina Carvalho, e a

No quintal de casa

A tragédia do dia 27 conseguiu fazer o povo parar. Literalmente parar e pensar. Não reconheci, até agora, alguém que não tenha tido um momento de reflexão. Nessa sociedade midiática na qual assistimos as guerras da

O dia que não pedi para ter vivido

Eu tenho 29 anos de idade. E levei esse tempo todo para conhecer o que é a sensação de impotência. Já tive lá minhas aventuras pessoais trágicas (e eu pensei que esse termo tinha magnitude finita),

A dor de todos nós

Quem não é de Santa Maria, talvez não esteja entendendo o porquê de tamanha comoção. A questão é que Santa Maria não é apenas uma cidade, é uma fase na vida de boa parte dos gaúchos.

O processo criminal é composto por mais de 111 mil páginas. Imagem: Neli Mombelli.

Na manhã de hoje, 1º de dezembro, foram abertos os trabalhos do primeiro dia do júri do caso Kiss. Foram sorteados os jurados do caso, composto por seis homens e uma mulher que, durante o tempo que durar o julgamento, ficarão hospedados em um hotel, sem acesso à internet, celular e não poderão se manifestar entre si sobre o caso. Orlando Faccini Neto é o juíz presidente e caberá a ele, após os jurados decidirem pela inocência ou não dos réus, fixar a pena.

Além do sorteio dos jurados, a manhã foi destinada a resolver questões apresentadas pelas partes. Participaram advogados das defesas, membros da imprensa e representantes do Ministério Público, que faz a acusação. Apenas agora pela tarde os familiares chegaram no local e podem assistir ao julgamento.

Familiares e amigos das vítimas da boate Kiss chegam ao Foro em Porto Alegre. Imagem: Marcos Borba.

Os réus Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Londero Hoffmann, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão respondem por homicídio simples (242 vezes consumados, pelo número de mortes e 636 vezes tentadas, pelo número de feridos).

O canal do Youtube do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul está transmitindo o julgamento ao vivo pelo link.

Frente da boate Kiss foi pintada com siluetas de corpos representando as vítimas. Fptp: arquivo ACS

Amanhã quinta-feira, 11, às 14h, os advogados Ricardo Breier e Pedro Barcellos Jr. estarão à disposição de familiares de vítimas da tragédia da Boate Kiss para falar sobre os próximos passos que deverão ser tomados em relação ao processo criminal. Os advogados, que atuaram no STJ, poderão tirar todas as dúvidas que familiares tiverem.  O encontro acontece na Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), no prédio da Antiga Reitoria da UFSM, na Rua Floriano Peixoto, 1.184, sala 601, no Centro de Santa Maria.

No último dia 18 de junho, em Brasília, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que o caso da boate Kiss irá ao Tribunal do Júri. Os ministros Rogerio Schietti Cruz (relator), Nefi Cordeiro (presidente), Laurita Vaz e Antonio Saldanha Palheiro votaram a favor do recurso interposto pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul e pela Associação de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM).

Da decisão da Sexta Turma do STJ ainda cabe recurso ao plenário da Corte e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Se for mantido o entendimento do STJ, o processo volta para Santa Maria para que o titular da 1ª Vara Criminal de Santa Maria, Ulysses Louzada, defina a data do júri.

O incêndio, ocorrido em 27 de janeiro de 2013, deixou 242 mortos e mais de 600 feridos. Dois ex-sócios da casa noturna e dois integrantes da banda que se apresentava na noite da tragédia são os réus no caso.

Por Luiz Roese, jornalista.

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O prefeito José H. Farret assinou, na tarde desta terça-feira (29), o decreto de Luto Oficial de três dias em função do acidente aéreo que vitimou integrantes da delegação da Associação Chapecoense de Futebol e profissionais de imprensa brasileiros, nesta madrugada.

Dentre as 71 vítimas estão três pessoas ligadas a Santa Maria e região: o ex-professor do Centro Universitário Franciscano, Rafael Corrêa Gobbato, que era fisioterapeuta-chefe do clube catarinense, o diretor comercial do clube, Décio Sebastião Burtet Filho, natural de Tupaciretã e o jornalista Douglas Boelter Dorneles, que tinha sua família em Santiago.

O prefeito José H. Farret manifesta solidariedade aos familiares dos jogadores, dirigentes, jornalistas, convidados, a todos os torcedores da Chapecoense e ao prefeito de Chapecó, Luciano Buligon.

Programação do Natal do Coração transferida

O decreto de Luto Oficial assinado pelo prefeito Farret estabelece o cancelamento da programação do Natal do Coração marcada para quarta e quinta feira, dias 30 de novembro e 1º de dezembro respectivamente. As apresentações marcadas para estes dias serão transferidas para a próxima segunda e terça-feira, 5 e 6 de dezembro. O Natal do Coração segue com a programação retorna na sexta-feira, 2 de dezembro, como programado previamente. A praça de alimentação instalada na Praça Saldanha Marinho segue funcionando normalmente.

Encontro de Bandas da 3ª DE cancelado

Outro evento programado para esta semana, o 1º Encontro de Bandas da 3ª Divisão de Exército de Santa Maria, foi cancelado. O Chefe de Comunicação Social da 3ª DE informa que o festival que teria mais de 50 apresentações até sexta-feira (2), foi cancelado em função do luto nacional de três dias, decretado pelo presidente Michel Temer. “Em virtude do luto oficial de três dias no país decorrente a tragédia que vitimou a delegação do Clube Chapecoense e profissionais da imprensa. Essa decisão é em pesar e atendendo o que consta no comunicado oficial e não há perspectiva se irá ocorrer este evento em outra oportunidade e em Santa Maria”, diz o Coronel Paulo Roberto de Almeida Rosa.

A informação é de Rodrigo Ricordi, assessor de comunicação da Prefeitura Municipal de Santa Maria.

 

Congresso está discutindo formas de prevenção para que se evite tragédias como a da boate Kiss. Fotos: Gabriel Haesbaert

Começou na manhã de hoje, 25, o I Congresso Internacional Novos Caminhos- A Vida em Transformação. O evento é organizado pela Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM) e tem por finalidade trazer a todos os envolvidos à catástrofe que aconteceu em 27 de janeiro do ano passado, na cidade de Santa Maria, momentos de reflexão e a discussão sobre formas de prevenções a incêndios para que futuramente outros erros que tiraram à vida de 242 jovens, não sejam repetidos.

Durante a solenidade de abertura compôs à mesa o reitor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Paulo Burmann, o presidente da Assembleia Legislativa, Pedro Westphalen (PP), a coordenadora do Congresso, Rosemar Thies, a assessora do Governador Tarso Genro, Jussara Dutra Viera, Valdir Pretto, representando o Centro Universitário Franciscano-Unifra, o presidente da AVTSM, Adherbal Ferreira e representando a Prefeitura Municipal de Santa Maria, Patricia Bueno.

Autoridades presentes. Foto Gabriel Haesbaert

Aproximadamente 250 pessoas presentes no Salão de Atos do Conjunto I do Centro Universitário Franciscano- Unifra e se emocionaram após a fala do presidente da ATVSM, Adherbal Ferreira, que não conteve as palavras e a emoção. Para ele o que Santa Maria viveu não é considerado uma tragédia e sim um massacre. Adherbal fez referência à tragédia no país vizinho, a Argentina, e expressou seus agradecimentos a todas as entidades governamentais, filantrópicas e a todos os voluntários que estiveram atuando desde janeiro passado.

Após o discurso de agradecimento, ele foi saudado e, em pé, todos os presentes o aplaudiram por instantes. Durante coletiva com a imprensa o presidente não se calou diante às câmeras: “O primeiro passo pela prevenção foi dado: a ação! Nós não fomos omissos, eu poderia ficar omisso no meu cantinho e não fazer nada, só ficar com a minha dor com o meu luto… A força do meu choro, da minha angústia, da minha amargura, eu resolvi colocar aos outros, apoiar as outras pessoas, e, eu me sinto feliz assim”, desabafou Ferreira.

Familiares das vítimas estavam presente. Foto Gabriel Haesbaert

O presidente acredita que com o Congresso será possível dar uma grande resposta que ainda não foi obtida pelo Ministério Público à sociedade. “Essa resposta vai ser parte de um novo momento, de novos caminhos, de novas prevenções, para que não ocorram novas tragédias como em Santa Maria”, ressaltou Adherbal.

À frente da Associação dos familiares das vítimas da tragédia da Kiss há quase um ano, diz que a justiça é cega, “e é mesmo, e acho que ela vai ficar é morta se não der uma resposta pra nós. Nós queremos e acreditamos que possa haver uma reversão, queremos que todos os culpados paguem, todos dentro das suas culpabilidades, porque são vários, de acordo com que eles fizeram ou deixaram de fazer, pelas omissões que fizeram, dentro das fiscalizações não feitas, dentro de sua culpabilidade ou maior ou menor”, reafirma o presidente.

Foto Gabriel Haesbaert

Questionado sobre qual é o temor a partir de agora, em quase um ano de inquérito, ele responde que teme não haver punição de ninguém. ” Há de haver! Nós queremos que a justiça seja feita, tanto dos bombeiros, como entes públicos, réus… são vários os culpados. Não é um só”, critica o pai. “Nem que aquele um lá,tenha que pagar somente uma cesta básica, aquele outro tenha que ir pra cadeia, aquele outro lá perca o seu cargo, mandato! São vários os culpados, não é um só, claro que tem os graves, os proprietários, esses sim a dor é eventual. Não podemos pensar em culposo, pois eles assumiram os riscos de matar”, afirma revoltado.

Exposição faz parte do Congresso.

O Congresso conta com o trabalho da jornalista e professora de fotografia, Laura Fabrício, do curso de Jornalismo do Centro Universitário Franciscano (Unifra)  que montou a exposição  “O Luto no Tapume”.

A exposição traz fotografias que retratam as homenagens em frente a fachada do prédio da Boate Kiss, capturadas por Laura  todos os dias 27 de cada mês entre abril e setembro de 2013.

Por Tiéle Abreu, curso de jornalismo do Centro Universitário Franciscano.

Nilson Vargas e Silvana Silva. Foto: Rodrigo Ledel

Encerrando o Seminário Desafios do Jornalismo, o Centro Universitário Franciscano recebeu na noite de ontem, o editor chefe de Zero Hora, Nilson Vargas, a editora de geral do Diário de Santa Maria, Carolina Carvalho, e a Coordenadora de Produção, Silvana Silva, para o debate sobre as coberturas dos dois jornais no caso da boate Kiss.

Nilson Vargas começou demonstrando, através de um vídeo, a agitação dentro da redação num dia em que o planejamento é atropelado pelo factual. O exemplo usado foi o da Operação Concutare que trouxe a público fraudes ambientais e pagamentos de propina para liberação de autorizações.

O vídeo mostrou desde as primeiras horas da cobertura da operação, às coletivas e as estratégias tomadas para apuração das informações, os debates sobre capa, espaço, relevância e como essas informações são publicadas nas redes sociais e no site do jornal. Para ele,  as dinâmicas envolvem dois fatores que vem transformando o trabalho jornalístico: o grande fluxo de modificações que sofre o jornal a partir da internet e como as redes sociais interferem no dia de uma redação.

Editor Chefe de Zero hora, Nilson Vargas. Foto: Rodrigo Ledel

O editor continuou sua apresentação relatando como foi o trabalho  no dia 27 de janeiro. As perguntas tinham como temas, a dor pública, a interpretação do fato, cenas fortes justificadas e a até que ponto a solidariedade e sentimentos subjetivos são manchetes.

Os palestrantes esclareceram como os dois jornais lidaram com esses fatores  através de capas, fotos, estratégias de cobertura e feed back dos leitores e familiares sobre o que estava sendo feito. Carolina Carvalho lembra que “fizemos uma ação com informações vindas dos familiares. Eram textos, fotos, poemas, enfim,  manifestações que poderiam ser enviadas para o jornal para publicarmos. Foram publicadas 157 texto” .

Eles concordaram que trabalhar dentro do caos que se estendeu por vários dias  implicou numa “bagunça”  emocional, pessoal e coletiva, dentro da redação. Silvana disse ter havido confusão nos horários e  que fizeram muitas reuniões para tentar encontrar o caminho mais certo para fazer essa cobertura. Entre tantos movimentos e reuniões perceberam que, “dentro daquela bagunça existia um certo planejamento”, afirmou a coordenadora, dizendo também ter ficado evidente que a sensibilidade para fazer a cobertura  da tragédia teria que ser muito grande, pois o jornalista também é humano e teria que controlar o emocional.

 

Seminário fala sobre o desafio de fazer jornalismo em tragédias. Foto: Lucas Schneider

Na noite de ontem,  numa parceria entre o curso de Jornalismo do Centro Universitário Franciscano e  a RBS TV, discutiu-se a  cobertura jornalística em televisão da tragédia da boate Kiss. No local, além de professores, alunos e funcionários da Unifra.

O evento contou com a presença do Coordenador da RBS Santa Maria, Luís Eduardo da Silva, da repórter e editora do RBS Notícia de Santa Maria, Juliana Motta e com o coordenador da Rede e de todas as equipes da RBS TV do interior, Norton Kappel.

O assunto foi marcado com relatos dos palestrantes acerca dos bastidores da tragédia.  Norton que esteve em Santa Maria na semana do acontecimento, intitulou como a maior cobertura e a mais impactante do jornalismo gaúcho.  A cobertura teve 50 profissionais da RBS TV do Rio Grande do Sul e Santa Catarina e, ainda, com 20 profissionais da Rede Globo.

Norton Kappel. Foto: Lucas Schneider

Norton falou sobre a dificuldade de administrar tantas pessoas dentro de um caos, e entende que senão fosse à ética e confiança no trabalho de suas equipes não teria conseguido, “esses pontos são essenciais para uma equipe de televisão.” afirma.

Juliana Motta esteve presente em quase todas as inserções da RBS e, em 15 programas da TV Globo. Relatou como foram as primeiras horas de cobertura, dizendo que por mais que já estivesse passado por algumas situações extremas, nada foi e pode ser comparado com a tragédia. Quando se defrontou com aquela situação não teve reação por, no mínimo, dez minutos e só depois conseguiu pensar em começar a trabalhar. “Fomos atropelados pelo factual”, comenta a repórter.

A palestra teve ainda, muitas perguntas dos ouvintes e de internautas que acompanhavam a cobertura pelo site da Agência Central Sul, sobre credibilidade, assistência psicológica, espaço, tempo e sensacionalismo na televisão.

A palestra faz parte do seminário Desafio do Jornalismo que hoje à noite  vai debater o jornalismo impresso, com a presença do editor chefe de Zero Hora, Nilson Vargas. O evento acontece a partir das 19 horas, no prédio 16, na sala de videoconferência.

A tragédia do dia 27 conseguiu fazer o povo parar. Literalmente parar e pensar. Não reconheci, até agora, alguém que não tenha tido um momento de reflexão.

Nessa sociedade midiática na qual assistimos as guerras da poltrona de casa, comendo um sanduíche e comentando sobre os ataques e os mortos, tudo é possível. Mas, tudo está muito distante do quintal da nossa casa. Queremos acreditar nisso. Olhamos os mortos que se acumulam dia a dia na Síria e não mudamos nossa rotina. Essas barbaridades, como diz o gaúcho, não é  parte do nosso dia a dia, não estão próximas do nosso quintal.

Grandes tragédias são coisas para as grandes metrópoles, que estão sujeitas a elas. Esses lugares que tem mais de 5 milhões de habitantes. Essas cidades que estão na rota dos terroristas, dos grandes assaltos, das grandes obras. Essas catástrofes não são para Santa Maria, que é uma cidade relativamente calma, ainda não tem 300 mil habitantes. Aqui as coisas ainda são pacatas. Vive-se em torno da estudantada, das trocas de experiências dos que aqui chegam para viver, do movimento nos vestibulares e algumas manifestações aqui e acolá. Vivemos a tranquilidade de uma cidade interiorana e muitos aqui se instalam para viver essa paz.

O bafo dos morros que circula a cidade,  tanto reclamamos da panela de pressão durante os meses de janeiro e fevereiro, deu lugar a outro calor.  O fogo que modificou para sempre a vida de todos que circulam pela Av. Rio Branco, que andam de ônibus para o Campus, dançam na noite e curtem um barzinho no final do dia.

A fumaça que tirou as tragédias da tela de led da TV e colocou a catástrofe no nosso quintal.. As referencias eram outras. A realidade nua e crua batia na nossa porta e sem pedir licença. Sim,  da forma mais cruel, levando 236 jovens, aqueles que outro dia assistiam aula, dobravam a esquina, trabalhavam na cidade e viviam a vida.  E nesse momento nossas vidas perderam o sentido. Ficamos perplexos, estarrecidos, inseguros e incrédulos.

Agora somos estatísticas no mundo inteiro. Da forma mais cruel: pela contagem daqueles que deixam a vida. Passamos a entender o verdadeiro sentido de tantas perdas. Não olhamos mais para a televisão da mesma forma. Deixamos a rotina de lado e choramos com todas aquelas imagens, pela nossa  impotência. Queríamos parar o tempo, voltar as imagens e editar tudo de novo. Não queríamos acreditar no que estava acontecendo, não naquelas proporções. Por que?? Santa Maria não era cenário para isto. Mais parecia uma história mal contada.

Mas, para a infelicidade de todos o quadro que pintava era pior,  maior do que todos nós sonhamos um dia. A tragédia estava no nosso quintal. Agora começamos a entender a dor, o sofrimento, o desespero de algumas pessoas que vivem uma guerra, um ato terrorista e tantos outros modos brutescos de perder a vida. As imagens que cansamos de ver na ficção,  estão na nossa vida, agora fazem parte do nosso mundo e não terão a licença poética do diretor, pois a realidade é mais dura.

Ainda não compreendemos de que forma trabalhar tudo isso. Mas, com certeza, aprendemos que a vida pode ser interrompida a qualquer hora. Que as tragédias não estão somente na tela da TV. Elas chegam sem avisar e deixam muitas, muitas vidas sem sentido. Não existe lugar e nem hora para acontecer. Entendemos que a dor dilacera, que nada ampara e que o desespero é muito maior numa morte trágica.  Aprendemos a olhar de outra forma as tragédias e suas vítimas. E, principalmente, passar a olhar a nossa vida de outra forma, com mais solidariedade, carinho e amor.

Maria Cristina Tonetto, jornalista e professora do curso de jornalismo da Unifra.

Eu tenho 29 anos de idade. E levei esse tempo todo para conhecer o que é a sensação de impotência. Já tive lá minhas aventuras pessoais trágicas (e eu pensei que esse termo tinha magnitude finita), mas o que eu vivi e vi nessas últimas 20 horas me deu a dimensão do infinito. Da tragédia infinita. Aprendi, hoje, de verdade, o que são o medo, a tensão e a agonia.
Me tornei jornalista há pouco tempo e, por um impulso (que deveria ter velado), embarquei num pesadelo que eu jamais vou esquecer. Ao presenciar o incêndio que vitimou 233 pessoas, eu estive numa dimensão que não recomendo ao meu mais vultuoso inimigo. Eram centenas de pessoas desesperadas, sujas, feridas. Homens sem camisa abanando outros que não conseguiam respirar. Mães e pais desesperados procurando os filhos em meio a sapatos quebrados, cacos de vidro, madeiras queimadas e uma fumaça traiçoeira que avisava lentamente sobre o horror coberto pelas paredes que voluntários e bombeiros tentavam derrubar para salvar os demais espremidos entre outros espremidos.
Amigos banhados de suor e lágrimas abraçados. Choravam a perda dos queridos companheiros que deixaram a vida dentro de um salão enfumaçado. Tão negras eram as manchas em seus corpos quanto a aura que envolvia aquele sexto de quadra.
A quantidade de corpos jogados no chão me chamou a atenção. Inocente, pensei ser aquele o lugar em que os feridos estavam aguardando atendimento enquanto litros e litros de água jorravam dos caminhões do Corpo de Bombeiros. Mal sabia eu que as pessoas deitadas na rampa de um estacionamento recebiam o choro dos amigos, que imploravam para que daqueles corpos, manchados de vermelho e preto, um sopro de ar saísse. Me deparei com a linha de frente da guerra em que caí de paraquedas. A expressão de perplexidade ainda não abandonou meu rosto.
Depois veio o dever às devas. Recrutado para a redação do jornal Diário de Santa Maria, no qual sou freelancer,corri, às 5h da manhã, para ajudar na cobertura, estruturada às pressas, da maior catástrofe que a minha cidade querida já comportou. A tristeza, o choro contido, o olhar marejado, a dificuldade de olhar no olho do colega. Uma mistura de pavor e tristeza tomou conta daquele lugar que num domingo teria uma equipe costumeiramente muito bem humorada. Esse plantão vai ser eterno. Aos poucos a rotina da cobertura foi escondendo mais a tristeza. Ela se manifestava aos poucos em lágrimas que corriam vez em quando pelos olhos dos repórteres, fotógrafos, cinegrafistas, editores e motoristas.
Era uma tristeza desumana. Vi minha chefe e amiga chorar, vi minha irmã de coração aflita por notícias do irmão. Por incontáveis vezes estufei o peito e suspirei para me manter forte. Desci, fumei, bebi litros de água e café. Me entreguei ao falar com minha mãe pelo telefone (mãe tem o direito e o poder de fazer o machões chorarem). Contando pra ela isso que escrevi acima em versão reduzida, minhas lágrimas se soltaram em litros. Solucei com o abraço silencioso que dei na minha chefe e quase irmã Carolina. Ali, a gente se deu um tempo para ganhar um pouco de fôlego e coragem para voltar lá para cima e encarar os telefonemas, as fotos, as buscas por informação, os textos e o clima de união de uma redação de jornal que jamais deveria estar tão cheia num domingo de verão com um céu azul escancarado. Porém, sem o brilho que a dor da perda de tantas vidas nos roubou.
Por Rodrigo Ricordi, jornalista formado pela Unifra.
Santa Maria chora seus jovens.

Quem não é de Santa Maria, talvez não esteja entendendo o porquê de tamanha comoção. A questão é que Santa Maria não é apenas uma cidade, é uma fase na vida de boa parte dos gaúchos.

Santa Maria é uma cidade onde muita gente se descobre adulto. Deixamos a casa dos pais e acabamos fazendo amizades com uma facilidade imensa, porque todo mundo se sente meio órfão em Santa Maria.

É aqui que vivemos com estes amigos as histórias que não poderemos contar para os nossos filhos, mas que com certeza lembraremos para sempre. É onde conhecemos as melhores pessoas que levaremos para a vida, muitas destas perdidas nessa tragédia.

Aqui o desconhecido do início da festa se torna amigo de infância até o final da noite. Uma cidade onde é difícil ficar sozinho, porque em qualquer lugar que se vá, algum conhecido da faculdade estará por lá. Aliás, a impressão que tenho é que o mundo é uma porção de terra ao redor de Santa Maria, porque é incrível como sempre encontramos um santa-mariense, seja lá qual dos cantos do planeta estejamos.

Santa Maria é uma cidade onde se pode sair com 2 pilas no bolso e voltar bêbado para casa, porque sempre surgem copos de cerveja durante a madrugada. É aqui que conhecemos um bando de loucos que daqui uns anos serão profissionais das mais diversas áreas pelo país todo, afinal, aqui todo mundo é universitário.

Santa Maria é uma cidade pequena com cara de cidade grande, ou uma cidade grande com o sentimento de uma cidade interiorana. O que fica disso tudo é que, deveras, Santa Maria é a cidade coração do Rio Grande.

Por Ana Rauber,  jornalismo/Unifra.