O caminho percorrido foi o mesmo do trem. Nascido em Santiago, no interior do Rio Grande do Sul, veio para Santa Maria, com sua família aos 10 anos de idade. O motivo de sua vinda era como o da maioria dos moradores da cidade do coração gaúcho: filho de pai ferroviário em busca do conhecimento, o sonhado Ensino Superior. Mas jamais imaginara-se escritor, pois apenas escrevia cartas em sua juventude para o irmão que morava no Mato Grosso, e nada mais.
Hoje presidente pelo segundo mandato da Cesma (Cooperativa dos Estudantes de Santa Maria), começou a atuar nos conselhos da cooperativa logo após a formatura em Engenharia Civil pela UFSM, em 1983. Athos Ronaldo Miralha da Cunha atuou no Sindicato dos Engenheiros Civis e Sindicato dos Bancários, e é funcionário da Caixa.
Seus dois filhos, Júlia Viana da Cunha, de 20 anos, e Lucas Viana da Cunha, de 13, são frutos do casamento de 20 anos com Tania Maria Bucinha Viana. “O maior problema lá em casa é que às vezes preciso deixar a minha leitura de lado, para colaborar com os serviços domésticos”.
Seu primeiro artigo foi publicado na imprensa local no ano de 2000, quando estava com 40 anos de idade. Por isso, ele considera ter começado a escrever muito tarde. Porém, sempre escreveu artigos e editoriais para os periódicos dos sindicatos. “O incentivo para enviar o artigo para o jornal veio de amigos que consideraram o texto bom. Na época coloquei num disquete e deixei no Jornal A Razão.”
Já fez parte de cinco livros publicados. Segundo ele, como sua veia é do cooperativismo até a escrita é cooperativada. Assim surgiu a idéia do recém lançado, na Feira do Livro de Santa Maria de 2008: ‘Os dez mandamentos’. Uma narrativa romântica, produzida por dez personagens da literatura local e idealizada por ele. A idéia claro, veio de outros livros já publicados, com forte semelhança com o anterior: “Nona assassina”, livro de contos, lançado em dezembro de 2007, em que o conto principal, Nona Assassina, foi feito por 6 escritores.
Mesmo com dúvidas no projeto do livro "Os dez mandamentos", ele deu a partida com o primeiro capítulo. “Teria assim um material concreto para mostrar para os outros.” Como não tinha esses dez parceiros do livro em seu círculo de amizade, falou com o Orlando Fonseca e começaram a tocar o projeto. Ao todo foram 30 meses de produção. O livro já estava pronto na Feira do Livro de 2007, porém, sem editora, os autores resolveram esperar para publicar a obra. Parece até ‘história de livro’, mas foi num simpósio sobre literatura que o Vitor Biasoli e o Orlando Fonseca participaram em Porto Alegre que conseguiram uma editora. “Já tínhamos procurado algumas, mas nenhuma deu crédito.” A editora apenas fez alguns ajustes, Cunha conta que puderam participar de todo o processo.
Athos, escritor e presidente da Cesma acredita na denominação de cidade cultura para Santa Maria. “Aqui a cultura acontece em várias instâncias. Produzimos muito.” Ele cita exemplos como a Feira do Livro, que também considera uma produção cooperativada, por unir estudantes das duas maiores instituições de ensino da cidade. Outro exemplo é o Santa Maria em Dança, que além do espetáculo tem diversos projetos nas escolas da cidade. Cunha diz que falta incentivo para a cultura. As leis feitas para isso ainda são um empecilho, pois necessitam de muita burocracia e não contemplam a realidade da cultura local. “Digamos que a gente quer lançar um livro. Não precisamos de 10 mil reais, apenas uns 3 mil reais. Os projetos da Lei de Incentivo à Cultura aceitam apenas projetos superiores a 10 mil. Isso é um absurdo”.
Para ele, a escrita além de um hábito também deve ser estruturada com boas leituras. “Sou eclético. Mas quando não gosto, deixo de lado e vou para outro livro.” Cunha tem se preocupado com a necessidade de incentivar a leitura. Em sua casa, é o único adepto. Mas fica feliz, quando chega quinta-feira, pois o pessoal se reúne para uma brincadeira literária no Sr. Café (no Shopping Santa Maria). “De lá saem as idéias para os livros. Eu adoro nossos encontros”.
Terminamos o papo, numa manhã no Café Cultura, com pães de queijo e café expresso, vendo a movimentação da Feira do Livro e falando sobre política.
Foto: Beatrice Witt (Núcleo de Fotografia e Memória)