Luzes, câmera, ação! Parabéns, você faz parte de uma rede social. Neste momento, representa o centro das atenções. Fotos, frases, opiniões… Publique e faça o que você quiser, e como quiser, afinal de contas, você é o protagonista, e nada vai lhe dete…
“CORTA!”.
Ainda que falsamente possa parecer, a “sociedade” virtual não é filme de faroeste americano. Existem leis tão ou mais rígidas do que aquelas empregadas em nosso mundo real. Incitação ao ódio, compartilhamento de conteúdo pornográfico ou quaisquer outras ações que possam ferir terceiros são delitos, com punições previstas em lei. E se engana quem acredita que infrações cometidas por um menor de idade em redes sociais não são passíveis de punição. Nestes casos, a responsabilidade recai sobre os pais. Quer dizer, pelo menos em tese.
O artigo 932 do Código Civil de 2002, estabelece que os genitores de um menor de idade são os responsáveis pela reparação civil de um delito cometido por seus filhos. Mas, em casos onde crianças e jovens foram denunciados e julgados por suas ações infracionais em redes sociais, o previsto em lei parece não se aplicar, ao menos é o que pode constatar a doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina, Rosane Leal, em resultados colhidos através de recente pesquisa nesse campo. A pesquisadora afirma que o principal objetivo foi realizar um levantamento acerca dos casos relacionados ao tema e suas consequentes sentenças na esfera jurídica: “O projeto não visa levantar os casos diretamente nas redes sociais, ele não tem essa finalidade. Ele visa fazer o levantamento jurisprudencial dos resultados das decisões e, das decisões específicas, onde essa violação gerou um dever de reparar civilmente, indenizando danos morais. Mais especificamente naqueles que geraram danos morais que devem ser suportados, e que devem ser pagos por genitores, por escolas ou provedores”, conclui a também pesquisadora sobre proteção de adolescentes no ambiente virtual.
Segundo a pesquisa – foram investigadas decisões relacionadas ao tema em sete Tribunais de Justiça das regiões Sul e Sudeste do país -, e constatou-se que dos 13 casos encontrados, em quatro deles os autores menores de idade foram condenados ao pagamento de indenização e as decisões restantes, procederam de forma incoerente diante do previsto em lei. Apenas em um dos casos a condenação seguiu à risca o estabelecido em lei.
“Muitas vezes, o tribunal atribui responsabilidade já, de plano, para o menor de idade. Em alguns outros casos, não reconhece a responsabilidade dos pais e vai direto para o incapaz, sendo que isso é uma distorção, uma clara manifestação de que não há uma compreensão do artigo 932 do código civil brasileiro. E não é recente, é um dispositivo que está desde 2002 no código civil, e é claro em atribuir a responsabilidade aos pais”, afirma Rosane.
Mas não é apenas o artigo 932 do código civil que sustenta o fato de que os pais ou responsáveis devem responder por eventuais atos ilícitos cometidos por menores. O artigo 933 apresenta outros elementos para corroborar com o exposto no anterior: “O artigo 932 é complementado pelo teor do artigo seguinte, 933. Este último deixa claro que os pais vão responder independentemente de culpa, ou seja, não se discute se os pais foram negligentes, se foram descuidados, se não zelavam pela forma como esse menor de idade usava o computador, se não ensinaram adequadamente… isso tudo não é considerado”, pontua.
Pais, filhos e redes sociais: conexão complexa
É natural pensar que a preocupação dos pais com os filhos em redes sociais aumenta cada vez mais, afinal de contas, não há como escapar da tecnologia que caracteriza o cotidiano. E se para um adulto a utilização de periféricos como os smartphones passou a ser tão rotineira e importante quanto à ingestão de água, a situação ganha ainda mais adesão quando se trata de crianças e jovens.
A chamada geração Z – denominação dada àqueles que nasceram após a segunda metade da década de 90 – já viu a luz do dia regada a muita tecnologia, internet e conectividade. Neste sentido, predominam as já citadas redes sociais, ambientes de interação virtual onde as relações entre pessoas são tão ou mais amplas e intensas do que aquelas que até pouco tempo eram tidas apenas em universo físico. Diante deste cenário, será que os pais de crianças e jovens conseguem acompanhar e ter controle sobre as atitudes de seus filhos em sites de relacionamento?
Pai de um filho de 14 anos, o agente administrativo Diones Nunes dos Santos, 50, afirma que, apesar de controle não tão rígido acerca do tema, busca, através do diálogo e exemplos reais, prevenir que situações relativas a delitos virtuais não aconteçam com seu filho: “Não tenho um controle rígido, rigoroso em relação a esta questão das redes sociais. Se bem que, de longe, a gente exerce certo controle, que é a verificação do conteúdo que está sendo postado no perfil do Facebook do filho, por exemplo. Mas diálogos existem e acontecem com frequência. Aliás, por trabalhar no Ministério Público de Justiça, busco apresentar alguns casos de meu conhecimento relativos ao mau uso da internet, sites de relacionamento, enfim, situações que o deixem bem ciente dos delitos virtuais e suas consequências”, enfatiza Diones, que conta ter dado de presente ao filho o Estatuto da Criança e do Adolescente, quando esse completou 12 anos.
Diálogo, cuidados, prevenção. A vida turbulenta e regada de afazeres da autônoma Claudia Silva Dallosto, 48, faz com que manter estes três itens em sintonia seja um desafio constante. Mãe de uma menina de 17 anos, Claudia acredita que, na medida do possível, busca saber quais são as atitudes de sua filha em redes sociais, e igualmente, através do diálogo, conversar sobre os riscos que sites de relacionamento podem oferecer quando não bem utilizados: “Não é fácil ter controle de tudo que seu filho faz na internet. O que faço, sempre que posso, é verificar o perfil no Facebook ou Instagran de minha filha, ler os comentários feitos em suas postagens por amigos seus ou simplesmente perguntar a ela se não cometeu nenhuma ação ruim na internet. Coisas assim, para que não passe em branco o importante diálogo”, comenta Claudia.
Como questionamento extra, tanto Claudia como Diones foram apresentados a um cenário onde seus filhos tivessem cometidos delitos em redes sociais, ao passo em que se perguntou quais seriam suas ações um diante da hipotética situação.
Diones afirmou que, inicialmente, iria buscar saber exatamente o que aconteceu, e quem foi lesado. Por fim, contou que iria tomar as medidas cabíveis em relação ao seu filho, ciente de que o caso é de sua responsabilidade como pai.
Claudia, porém, disse não saber formular tal situação, afirmando que nunca cogitou que algo do gênero pudesse acontecer com sua filha. Comentou, também, desconhecer que seria a responsável por eventuais ilicitudes cometidas pela filha.
Prevenção e educação continuam sendo as melhores formas de evitar delitos por menores na internet
Ainda que a preocupação seja existente, assim como o conhecimento da lei, pais ou responsáveis por menores de idade permanecem sem saber exatamente como lidar com as situações que contornam as ações de seus filhos em redes sociais.
Não existe e nem há como haver monitoramento constante. Além disso, a falsa ideia de mundo livre e sem lei que as redes sociais possuem é imensa. Então, como devem verdadeiramente agirem os pais no entendimento do elo que há entre filhos e redes de relacionamento?
Psicóloga, Laise Zanini, 34, atenta que um dos elementos que os pais devem ficar atentos, pois pode influenciar os menores em ações errôneas, é o isolamento que a rede pode ocasionar: “ Apesar de existirem leis que controlam o uso das redes sociais, as crianças estão entrando para o mesmo caminho de nós adultos, o isolamento de contato físico em função da facilidade virtual. Devido a esse boom de informações, os pais descuidam-se do básico que é monitorar as atividades dos filhos esquecendo que assim como existem interações saudáveis, também existem perigos significativos com o uso irrestrito”, pontua.
Ainda que haja o cuidado e que se busque monitorar na medida do possível o que seus filhos acessam na internet, não há como nenhum pai apagar eventuais comportamentos lesivos que seus dependentes causaram em redes sociais. Para tanto, em um cenário onde houve a descoberta de ilicitude, a psicóloga atenta que o diálogo é sempre a melhor solução: “Primeiro os pais devem chamar os filhos para uma conversa amigável, com carinho, buscando muitas vezes reatar um laço afetivo enfraquecido, para assim buscar entender o comportamento do filho. Bater, culpabilizar e fazê-lo passar por situações vexatórias perante os outros, dificulta ainda mais a interação entre pais e filhos. Ainda assim, não se deve assumir a culpa por ele, nem superprotegê-lo, mas apoiá-lo na responsabilização pelo ocorrido de danos a terceiros”, pondera Laise.
Por fim, Laise acredita que a necessidade dos pais em saber dizer não a seus filhos, pode até ser dolorida, mas surge como grande elemento na melhor educação virtual: “A não punição sim é um reforçador negativo, pois a medida que não há responsabilização, o menor internaliza de que tudo é permitido e que nada lhe acontecerá sempre que praticar qualquer ato. Por isso, a importância dos pais em saberem dizer não, imporem limites, sempre com muito amor e compreensão”, concluí.
Por Iuri Patias, Lucas Schneider e Patrese Lehnhart. Matéria realizada para a disciplina de Jornalismo Especializado II.