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Santa Maria, RS, Brazil

Continuo sendo filha

Não estamos mais na mesma vida, mas continuo sendo filha. Certo dia, do meu quarto, ouvi o barulho das chaves do carro sendo largadas sobre a mesa e senti um frio no estômago. Parecia ser ele, chegando depois do trabalho. Logo constatei que não era, pois ele não vem já fazem alguns anos. Enquanto isso, meus dias seguem normais. Continuo fazendo o que sempre fiz e gostando do que sempre gostei.

Neste momento, fiquei triste ao perceber que estou aguardando a chegada de mais um natal que se aproxima e sabendo que, de novo, não haverá cartões, presentes e nem mesmo uma simples ligação de quem não me já não me procura há algum tempo. Não dói mais. Não o tempo todo, pois sempre existirão outras pessoas ao redor da árvore de natal para lembrar de que eu não fiquei sozinha.

Imagem gratuita px.

Na nossa casa, não há mais vestígios sobre ele, mas sempre algo vai me lembrar de que, por mais que não doa tanto assim, sempre vai machucar. E hoje, o que machuca é o que não existe mais como a chegada depois do trabalho no sábado e o churrasco de domingo. Como a carona na garupa quando eu cansada, sentava na calçada.   Só dói quando as lembranças resolvem aparecer para que eu reflita sobre como seria se estivéssemos na mesma vida. Ainda gosto de parques de diversão, mesmo que quase nunca pudesse ir. Gosto de ler e estudar, mesmo que tenha sido ele quem me orientou sobre isso. Gosto de cerveja e churrasco no final de semana, mesmo que ele tenha me deixado beber quando eu ainda não tinha idade.

A mais recente lembrança que tenho agora é a da pensão. Isso é tudo o que recebo dele, todo mês. Não supre ausência, nem amor, nem saudade, mas está lá todo dia dez. O nosso único contato de pai e filha resumido a um comprovante de depósito que substitui o encontro físico.

Dormir no chão da sala. Risadas e saudades. E quanto mais eu me esforço para lembrar, mais ficam vagas as lembranças. Já não me lembro de tudo, já não me lembro de quase nada. Mas, às vezes, dói saber que tem algo de que já não me lembro. No entanto, não deveria lembrar, deveria viver.

Não estamos mais na mesma vida, mas continuo sendo filha, sabia Pai?

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Não estamos mais na mesma vida, mas continuo sendo filha. Certo dia, do meu quarto, ouvi o barulho das chaves do carro sendo largadas sobre a mesa e senti um frio no estômago. Parecia ser ele, chegando depois do trabalho. Logo constatei que não era, pois ele não vem já fazem alguns anos. Enquanto isso, meus dias seguem normais. Continuo fazendo o que sempre fiz e gostando do que sempre gostei.

Neste momento, fiquei triste ao perceber que estou aguardando a chegada de mais um natal que se aproxima e sabendo que, de novo, não haverá cartões, presentes e nem mesmo uma simples ligação de quem não me já não me procura há algum tempo. Não dói mais. Não o tempo todo, pois sempre existirão outras pessoas ao redor da árvore de natal para lembrar de que eu não fiquei sozinha.

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Na nossa casa, não há mais vestígios sobre ele, mas sempre algo vai me lembrar de que, por mais que não doa tanto assim, sempre vai machucar. E hoje, o que machuca é o que não existe mais como a chegada depois do trabalho no sábado e o churrasco de domingo. Como a carona na garupa quando eu cansada, sentava na calçada.   Só dói quando as lembranças resolvem aparecer para que eu reflita sobre como seria se estivéssemos na mesma vida. Ainda gosto de parques de diversão, mesmo que quase nunca pudesse ir. Gosto de ler e estudar, mesmo que tenha sido ele quem me orientou sobre isso. Gosto de cerveja e churrasco no final de semana, mesmo que ele tenha me deixado beber quando eu ainda não tinha idade.

A mais recente lembrança que tenho agora é a da pensão. Isso é tudo o que recebo dele, todo mês. Não supre ausência, nem amor, nem saudade, mas está lá todo dia dez. O nosso único contato de pai e filha resumido a um comprovante de depósito que substitui o encontro físico.

Dormir no chão da sala. Risadas e saudades. E quanto mais eu me esforço para lembrar, mais ficam vagas as lembranças. Já não me lembro de tudo, já não me lembro de quase nada. Mas, às vezes, dói saber que tem algo de que já não me lembro. No entanto, não deveria lembrar, deveria viver.

Não estamos mais na mesma vida, mas continuo sendo filha, sabia Pai?