Em todo o Brasil, 46 mil crianças e adolescentes vivem em abrigos, segundo o Conselho Nacional de Justiça. Há um total de 7.493 crianças e adolescentes que estão no Cadastro Nacional de Adoção. Destas, 4.826 (10,5% das crianças que vivem em abrigos) crianças estão disponíveis para adoção. Outras 2.667 ainda estão vinculadas a suas famílias, ou seja, os processos de adoção começam enquanto ainda há possibilidades de recursos por parte da família biológica, o que gera riscos para os adotantes. As demais, cerca de 38 mil crianças, ainda nem tiveram seus processos de destituição do poder familiar iniciados, e estão crescendo nos abrigos. Alguns dos motivos para isso são a morosidade da Justiça, leis ultrapassadas e pessoas que não abrem mão da guarda dos filhos, mesmo não os querendo. Apenas para não perder benefícios sociais.
“Se uma mãe está na dúvida para adotar, não adote! Maternidade e paternidade isso não se faz com dúvida. Filho é realização, mas filho é responsabilidade, é preocupação, é zelo e isso é 26 horas por dia”, declarou Márcia Marinho de Faria, jornalista, sobre mães que estão na dúvida em relação adoção.
Márcia e Rodrigo de Faria ganharam a guarda do B.M.F em dezembro de 2018, na época ele tinha 11 anos. A adoção está por ser concluída. Assim que sair a sentença. Márcia e Rodrigo poderão ter a certidão do filho com o sobrenome do casal.
Em Santa Maria existe o Grupo de Apoio e Incentivo a Adoção, Gaia. Ele prepara os candidatos para a realidade afetiva de uma adoção, a responsabilidade paterna e materna e o caráter legal.
Processo de adoção
O caminho da adoção é longo. Primeiro, há um processo de habilitação que consiste em uma série de documentos entregues pelos futuros adotantes, além de avaliação técnica com um Assistente Social e psicólogo forense para avaliar as principais condições psicológicas e afetivas do casal. Depois de entregue ao cartório do fórum a documentação solicitada, o órgão remete ao Juizado da Infância e da Juventude, e o juiz autoriza ou não a habilitação para adoção. Feito tudo isso, o casal começa a fazer parte do Cadastro Nacional de Adoção (CNA) – que está em transição para Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA).
Posteriormente, há perfis da parte adotada e do adotando. Quando eles se cruzam é porque as características descritas em cada perfil são compatíveis . Quando isso acontece a família é chamada na vara da infância a que está vinculada a criança, o que pode ser em qualquer região do País, pois a adoção é nacional. Posteriormente, com autorização do juiz daquela comarca são passadas para o casal algumas informações da criança, aquilo que seja mais grave para evitar que ocorra devolução. Em primeiro lugar são levados aos pretendentes os detalhes das crianças, quais as suas necessidades e o que ela vai precisar da nova família.
Primeiro há uma visita despretensiosa, apenas para conhecer a instituição sem a criança saber. Depois sim, ela vai ser notificada que o casal veio conhecê-la e, com o consentimento do menor, realiza-se o encontro. Lembrando que, conforme o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) essas perguntas são feitas apenas para maiores de 10 anos, pois eles têm, legalmente, maturidade psicológica e intelectual para responder acerca do próprio bem estar.
B.M.F, filho de Márcia e Rodrigo, é o 12º adotado na família. Além de ser uma prática nada incomum para a família, Márcia pondera que teve outros motivos particulares para realizaram adoção e que era um sonho do casal.
Adoção de recém-nascido e adoção tardia
Márcia é categórica, é contra a decisão dos pais adotivos de não contarem às crianças sobre a verdade do passado. A não transparência pode gerar no futuro sensações de traição, engano e não pertencimento. Muitas vezes, na adoção de crianças novas, os pais não contam à criança sobre a adoção, o que pode criar problemas futuros.
Já na adoção tardia há o medo que a criança seja rebelde. Márcia destaca que é importante ter a consciência que a adolescente/criança acima de 10 anos está sendo adotada e adotando. Por já ter vivido um tempo com a família biológica antes de ser retirada dela, as vezes ela vivia em um ambiente de violência e hostilidade mas, mesmo assim, há casos de resistência na separação da família. Então, os vilões para essas crianças podem ser o conselho tutelar e a rede de proteção. São casos delicados de lidar, que precisam de paciência e dedicação da família adotante.
“Há pretendentes que ainda cometem o luxo de viver com a criança, vender uma ilusão de família, e depois a família não se adaptar e devolver ela para o sistema. Isso aconteceu com meu filho três vezes. Há mais risco para crianças que para o pretendente”, comentou Márcia quando se referiu a adoção tardia, com crianças acima de 10 anos.
Sobre os riscos legais, se o processo ocorrer dentro do que regra a legislação da Infância e da Juventude do Brasil não há riscos, e se os pretendentes estiverem a par disso não haverá ameaças no processo.
A adoção tardia é um processo em que a criança responde por si. Ela participa da audiência e responderá se aceita ficar com os pretendentes. “Esse foi o momento mais bonito. Ele foi ouvido o tempo todo”, comentou Márcia sobre o processo que envolveu seu filho na adoção tardia. Ela ainda destacou: “E ouvir desse menino diante do juizado da infância, promotor de justiça e do ministério público que você e seu marido são os pais que ele sempre quis, isso é indescritível”.
Esmiuçando os dados
Segundo o Ministério de Desenvolvimento Social e Agrário, antes da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), as instituições existentes para acolhimento de crianças e adolescentes eram os antigos orfanatos, educandários ou colégios internos, amparadas pelo Código do Menor. Durante décadas, essas instituições ficaram conhecidas como espaços de abandono, funcionando como grandes instituições fechadas, isolados da comunidade e atendendo muitas crianças ao mesmo tempo. Nelas, as crianças e adolescentes permaneciam até completar 18 anos.
- Dos 7.493 adolescentes e crianças cadastradas para adoção, 2.540 são brancos, 3.640 pardos, 1.280 negros, 23 indígenas e 10 amarelos;
- 316 são do sexo feminino e 4.178 do masculino;
- 892 crianças ou adolescentes apresentam algum problema de saúde;
- 578 possuem irmãos;
- Por outro lado, há 39.447 pretendentes a pais habilitados;
- 627 aceitam crianças e adolescentes de todas as raças;
- Somente 7.788 candidatos aceitam apenas crianças e adolescentes brancos, o que representa menos de 20% do universo;
- 756 aceitam brancos e pardos, 19.712 brancos, pardos e negros, 19.153 também indígenas e 20.647 também amarelos;
- 906 pretendentes são indiferentes ao sexo da criança;
- 973 aceitam adotar irmãos;
- 145 aceitam adotar crianças ou adolescentes com algum tipo de problema de saúde, desde que não deficiência física ou mental e Aids;
- 581 aceitam crianças ou adolescentes com AIDS;
- 154 aceitam crianças ou adolescentes com deficiência física;
- 149 aceitam crianças ou adolescentes com deficiência mental.
A planilha abaixo mostra um resumo dos dados em que podemos concluir que nenhum dos critérios acima impede crianças e adolescentes de serem adotados, já que a proporção de pretendentes dispostos é sempre maior.
Quanto a idade, na tabela abaixo é possível ver, na segunda coluna, o número de crianças e adolescentes para adoção e na terceira e última coluna o número de pessoas dispostas a adotar.
O dado preocupante é que, a partir dos 11 anos das crianças, os pretendentes habilitados que os aceitam é menor que o número de crianças e adolescentes disponíveis.
Para mais informações sobre o processo de adoção, acesse a página do Adoção Brasil. Em Santa Maria é possível participar do Gaia, Grupo de Apoio e Incentivo à adoção, que se propõe ser um “Espaço para divulgar, incentivar e principalmente receber todos os interessados e simpatizantes com a ideia da adoção.”
Matéria produzida na disciplina de Jornalismo III, no 2º semestre de 2019, e supervisionado pela professora Glaíse Palma.