Na última quinta-feira,17, um tema duro da história brasileira foi retomado na forma de Conversa Pública: “A Ditadura em Santa Maria: Testemunhos da repressão e da resistência”.
O seminário foi organizado pela APPOA (Associação Psicanalítica de Porto Alegre), através do projeto “Clínicas do Testemunho”, um projeto da Comissão de Anistia/Ministério da Justiça que visa a acolher testemunhos de pessoas afetadas pela ditadura civil-militar no Brasil, discutindo os efeitos psíquicos, sociais e políticos da violência de Estado. Segundo a APPOA, o ciclo de seminários visa ” sensibilizar para algumas questões que compõem o complexo tema dos efeitos do trauma e do silenciamento frente às violações perpetradas pelo Estado durante o período ditatorial”.
O evento ocorreu no Auditório do Centro de Ciências Sociais e Humanas da Antiga Reitoria da UFSM e reuniu um público interessado, entre eles profissionais de diversas áreas, universitários e professores da Unifra e da UFSM, e mesa foi mediada por representantes da APPOA em Santa Maria. O seminário contou com a presença do professor Diorge Alceno Konrad, doutor em história e membro da Comissão e do Conselho Editorial de “História & Luta de Classes”. Konrad, que é pesquisador e autor do livro “Sequelas de Santa Maria: memórias de apoio e da resistência ao Golpe de 1964” evidenciou o contexto local no período da ditadura, evidenciando o trabalho com as fontes orais e documentais no trabalho de resgate da memória.
Os testemunhos ficaram a cargo de Dartagnan Luiz Agostini, professor de história e atual dirigente do Cpers, e Geisa Batista Obetine, filha de Balthasar Melo, líder ferroviário, preso e torturado em Santa Maria, no período da ditadura.
Dartagnan contou episódios do período em que lutou, ao lado de companheiros, pelo fim do regime militar. Compartilhou as lembranças sobre as suas duas prisões, e as agressões físicas e psicológicas decorrentes. Ele, hoje, afirma não ter traumas, mesmo que ainda se lembre dos fatos, e acha a militância importante. “O silêncio é fundamental para a luta das classes oprimidas.”, disse referindo-se à quando, mesmo sob tortura, não revelou nada a respeito de seus colegas de militância. Destacou também que não era toda a força armada brasileira que apoiava a ditadura, e nesse processo, parte dos militares brasileiros foram expurgados do exército. “O povo em 64 foi golpeado, mas nunca foi derrotado.”, disse ele.
Já Geisa Obetine narra que viu trincheiras em Santa Maria “como nos filmes que assistimos hoje”. Viu o pai, Balthasar, ser preso numa verdadeira operação de guerra e, depois de torturado, tentar o suicídio duas vezes. Ela também deu relatos sobre como eram severas as revistas feitas na época e as perseguições às famílias de quem era preso. Segundo ela, muitos parentes, mesmo concursados, não puderam assumir aos cargos públicos conquistados por pertencerem à família de um comunista. Conta com tristeza que, ao longo de sua vida, já viu três golpes acontecendo em seu país: em 1954, 1964 e 2017. E com alegria lembrou que conheceu Prestes e João Goulart. Ela diz: “Por pior que seja o governo, ditadura nunca mais.”