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transfobia

Brasil é um dos países que mais matam pessoas LGBTQI+

  A orientação sexual é algo pessoal, uma escolha de cada um, mas, caso não se encaixe no que os padrões heteronormativos, ela encontra barreiras em diferentes níveis de convívio, desde a família nuclear até a

Transfobia e a violência institucional no sistema de saúde

O país mais transfóbico do mundo. Esse foi o título que o Brasil recebeu no ano passado, após 144 travestis e transexuais serem assassinados. Os dados assustadores de 2016 levaram o País ao primeiro lugar, num

Transfobia e o recorde que não queremos ter

A cada 25 horas, um LGBT (lésbicas, gays, bissexuais,  transexuais e travestis) é assassinado no Brasil. Os dados alarmantes, fazem do país o campeão mundial de crimes contra as minorias sexuais. O ano de 2016 registrou

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Vivência e resistência de pessoas trans em Santa Maria

Relatos de mulheres e homens trans a partir de suas narrativas.

Marquita segurando a bandeira trans, símbolo que representa a comunidade transgênero. Foto: Heloisa Helena.

“Eu digo que a gente foi uma geração muito resistente porque viemos de um estigma de preconceito muito grande em cima da nossa população, por causa de uma doença. Nós sobrevivemos a tudo aquilo e estamos aqui”

Era outono do ano de 1967 quando veio ao mundo um menino, julgado por seu sexo biológico. Aos 17 anos começou o processo de se reconhecer como uma pessoa trans, termo que era pouco utilizado naquela época, pois usavam a palavra travesti como definição. Assim surge Marquita Quevedo, no ano de 1985, em plena pandemia de HIV/AIDS no Brasil, em um ambiente cheio de preconceito contra a população LGBTQIA+ e desinformação sobre a doença.

Ela relata a discriminação que sofreu nos anos 1980 por conta da epidemia, era agredida, xingada e expulsa de bares. “Era muito real na nossa cidade, em pleno Calçadão tinha uns espaços que quando a gente passava ouvia gritos ‘olha a AIDS’, ‘vocês estão matando a população’.” Porém, esse não foi o primeiro preconceito em sua trajetória.

Somente há quatro anos o Ministério dos Direitos Humanos retirou a transexualidade da lista de doenças ou distúrbios mentais. Em agosto de 2018, a Organização Mundial da Saúde publicou a 11ª edição do CID (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde), que deixou de incluir o chamado “transtorno de identidade sexual” ou “transtorno de identidade de gênero”. Desde 1952 a população trans era considerada portadora de distúrbios mentais, reforçando o estereótipo de que eram doentes.

Aos 15 anos, Cilene deu o grito de liberdade. Se reconheceu como mulher, feminina e delicada. Na infância foi apelidada de “sorriso”, o sorriso largo estava quase sempre presente em sua trajetória. Mas, aos 11 anos, seu sorriso desmanchou ao ser abusada na escola. Após ser descoberta, através de uma carta contendo uma declaração de amor para um colega de sala de aula em um colégio apenas de meninos, Cilene foi encaminhada ao psicólogo.

“Na sala dele eu tirava toda a minha roupa e ele tocava nas minhas partes íntimas. Na segunda sessão foi piorando, embora eu sentia dor, na época eu imaginava que fazia parte do tratamento. Na terceira sessão, eu parei de ir e acredito que ele iria concluir o ato.”

E nessa travessia perigosa que é a vida, Cilene começou sua caminhada em busca de ser quem realmente desejava. “Eu tenho muitos motivos para ser uma pessoa revoltada e agressiva, porque só a gente sabe o que carregamos nessa vivência toda”.

Cilene menciona uma das suas principais marcas de resistência:

Cilene Rossi trabalha como assessora parlamentar no Legislativo de Santa Maria gerando representatividade para o público trans em espaços políticos. Foto: Vitória Gonçalves.
Cilene Rossi trabalha como assessora parlamentar no Legislativo de Santa Maria gerando representatividade para o público trans em espaços políticos. Foto: Vitória Gonçalves.

É sobre o caminho difícil que Cilene fala. É sobre um caminho de perdas e abandonos. De pedras e espinhos. De preconceito e discriminação. De luta e resistência. Mesmo diante de todos os desafios, Cilene não se recolheu em si mesma. E procurando compreender o que havia nela que tanto incomodava os outros, foi construindo para si a história de sua vida.

Viver no país que mais mata travestis e transexuais é um ato de resistência. O Brasil lidera o ranking mundial de mortes por transfobia, de acordo com a ONG Transgender Europe (TGEU). Os dados são alarmantes. Segundo o dossiê anual da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), em 2021, 140 pessoas trans foram assassinadas no país, sem contabilizar os demais atos de violência física e moral. 140 vidas, 140 histórias interrompidas. A idade média das vítimas foi de 29 anos. “Nossa maior vingança será envelhecer. Qualquer travesti que passe dos 35 anos estará se vingando desse CIS-tema” – Keila Simpson Presidenta da Antra.

Cisgênero é o indivíduo que se identifica com o sexo biológico com o qual nasceu.

Gráfico produzido a partir dos dados do dossiê anual da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) divulgado em 2021. Produzido por Vitória Gonçalves.
Gráfico produzido a partir dos dados do dossiê anual da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) divulgado em 2021. Produzido por Vitória Gonçalves.

No começo do século 21 surgiram entidades nacionais como a Articulação Nacional de Travestis, Transexuais e Transgêneros (Antra), a Rede Trans e o Instituto Brasileiro de Transmasculinidades, com o propósito de falar sobre questões relacionadas a população tras e gerar visibilidade. Entretanto, descobrir-se neste cenário ainda possui dificuldades.

“Eu sou uma mulher trans, mas é nítido que a maioria nem me considera mulher”. Descobrir-se diferente. Reconhecer-se. Autoproclamar-se. Assumir-se enquanto mulher trans exigiu de Davina Kurkowski todo um processo de negociação, consigo mesma e com o mundo externo. “Pelo fato de eu ser transsexual, a maioria dos homens acham que eu sou alvo de sexo fácil. Já fui assediada várias vezes em Santa Maria, na rua, indo para o cursinho, quando estava trabalhando. Era algo que acontecia quase todos os dias.”

Davina relata como as pessoas reagem de forma preconceituosa ao vê-la na rua:

Sem contar com qualquer respaldo social, mulheres como Davina estão desprotegidas e se tornam extremamente vulneráveis a múltiplas formas de assédio e ataque, sendo radicalmente privadas de direitos. Neste momento, a jovem se depara com a bruta realidade de uma mulher trans na sociedade. O desconforto em utilizar o banheiro feminino do shopping, olhares que transmitem medo, nojo e ódio acompanham Davina no seu cotidiano.

“Escutei vários comentários, uma vez me chamaram de traveco. No começo da transição eu não me sentia confortável para usar vestido e saia em público mas, pela primeira vez, devido ao verão e ao calor, coloquei um vestido. Estava voltando do shopping com duas amigas, eu me sentia ótima e  quando estávamos passando pelo calçadão, aquele homem que está sempre cantando música gospel e gritando com as pessoas começou a gritar olhando pra mim ‘porque vocês adoram o diabo’.”

Quando se fala em homens trans há pouco levantamento aprofundado no país sobre a população masculina, o reconhecimento das identidades de gênero desses sujeitos, a invisibilidade social e política enfrentada por eles, bem como as várias formas de violência que os atingem diariamente.

“Eu posso não ter passado nenhum confronto físico, nem moral, mas é bem humilhante e degradante não ter acesso a um direito básico. É de certa forma violento na vivência”. Cauã de Bairros tem apenas 21 anos, mas já possui uma grande bagagem de experiências e vivências. Aos 17 anos deu adeus ao gênero feminino, rótulo que foi imposto a ele ao nascer, mas que nunca o pertenceu. O direito básico a que o jovem se refere é ser reconhecido pelo nome social na documentação.

 

Cauã atualmente cursa música na UFSM e faz parte da equipe da Casa Verônica Foto Cauã - Arquivo pessoal.
Cauã atualmente cursa música na UFSM e faz parte da equipe da Casa Verônica Foto Cauã - Arquivo pessoal.

No ano de 2019 ele era calouro, no curso de licenciatura em Teatro na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e ainda não tinha modificado o nome na certidão de nascimento e RG. “Na época ainda não tinha uma política facilitada para o nome social. A maior burocracia era o nome, porque as pessoas olhavam o nome social e achavam que era enfeite. Pra mim isso foi o pior, questão do nome na carteira do Restaurante Universitário (RU), portal do aluno, matrícula e carteira de ônibus”.

O jovem conseguiu fazer a retificação do nome por conta de uma lei  (Provimento n° 73 de 2018) instaurada no ano de 2018, que facilitou o processo ao retirar a obrigatoriedade do requerimento de laudos médicos para alteração. Atualmente, para mudar basta a autodeterminação da pessoa interessada em modificar o nome. “Pensa que desagradável ter que pedir para um médico olhar teu corpo e atestar aquilo, para você poder ter acesso ao nome básico. É só teu nome”. Felizmente Cauã não precisou passar pela consulta médica graças a alteração da lei.

Alguns direitos e o acesso a eles tem evoluído ao longo dos anos, mas o preconceito persiste intrínseco na sociedade como mencionado nos relatos de quem convive diariamente com essa realidade.

O desafio no mercado de trabalho

A realidade das pessoas trans em busca da sua independência financeira

“A falta de oportunidade e de inclusão me fez trabalhar na noite. Eu não vou dizer que todas estão na noite por necessidade, mas 95% sim […] Hoje o público trans tem muitas oportunidades, por conta de quem esteve na linha de frente batalhando pelo público LGBT.” 

A noite muitas vezes não tem regra, não tem leis, não tem descanso. Mas não para Cilene, que optou por ter disciplina nos 15 anos que viveu a rotina do trabalho na prostituição. Conheceu todas as drogas na noite – ou quase todas. Mas se considera abençoada de não ter se viciado em nenhuma delas.

“Esses 15 anos para mim era um trabalho. Do qual, eu tinha horário para chegar na rua e horário para ir embora, e final de semana eu não trabalhava. O corpo precisa descansar e a alma também. Porque você sobrecarrega”

Ao falar sobre as marcas que a compõem, sobre as experiências que vivenciou, sobre a sua vida, a sua história, a sua luta, Cilene relatou as agressões, os assédios e a conquista pelo território. No mundo da prostituição, toda esquina é conquistada, assim como os clientes.

“Muitas vezes a gente apanha mas a gente revida para apanhar com dignidade. Tu não aceitou quieta, tu lutou também. Perdeu, infelizmente perdeu. Mas no mundo da noite, tu só conquista seu espaço assim, apanhando e voltando, apanhando e voltando, uma hora desistem e te permitem ficar”

De acordo com Cilene, o mundo da noite envolve muitos gritos e xingamentos. E o desejo de estar em cima de um salto alto, muitas vezes se torna um pesadelo. Há noites em que não é escolhida e noites em que o corpo implora por descanso. Quando jovem, sempre contribuiu em casa, apesar das tentações de um mundo perverso, seu objetivo sempre foi o mesmo.

“Eu nunca joguei meu dinheiro fora, sempre ajudei meus sobrinhos. Geralmente a mulher trans que trabalha na noite, elas estão vulneráveis ao álcool e a droga, uma coisa leva a outra.”

Depois de vivenciar muitos mundos, conhecer seus próprios abismos e reencontrar-se consigo mesma diversas vezes nesse caminho, uma oportunidade de emprego surgiu na Estação Rodoviária de Santa Maria contribuindo com a sua construção.

“Eu se pudesse aparecer de forma mais feminina, ótimo. Mas não é privilégio de muitas. Cilene Rossi foi toda uma construção. Antigamente as condições eram precárias, algumas já tinham sorte de nascer bonitas, conseguir clientes à noite. Chamávamos na rua de “bater portinhas”. Atualmente, Cilene tem 51 anos e exerce a profissão de assessora parlamentar da vereadora Marina Callegaro (PT). Com seu trabalho, auxiliou 23 mulheres trans a fazerem a troca do nome social. Considera esse passo como um empoderamento para que pessoas como ela se reconheçam como cidadãs e como desejam ser reconhecidas.

Definitivamente, a inclusão de pessoas trans no mercado de trabalho ainda é um desafio. Mas, como conta Marquita, a área da beleza era uma alternativa para pessoas trans trabalharem, pois o local se mostrava parcialmente receptivo a essa população.“Eu digo que a minha profissão era ser cabeleireira.  Até alguns anos atrás era a profissão onde a gente se encontrava e não tinha preconceito, a gente era aceita no meio do salão”, relembra. Atualmente, Marquita trabalha com a produção cultural de eventos em Santa Maria.

Tentar se colocar no mercado de trabalho sendo uma pessoa trans pode resultar em cicatrizes profundas e desgastes emocionais. No final de 2019, logo antes da pandemia do coronavírus, Cauã estava procurando emprego, mas não havia resultados. Nas experiências para conquistar algumas vagas, houve muitos questionamentos desnecessários e nem um pouco profissionais dos colegas da empresa.

“Fiz o teste de uma semana em uma sorveteria. A moça que estava me treinando começou a me perguntar por que eu tinha cabelo comprido, se eu era gay, se eu ‘dava’, coisas bem íntimas que não tem nada a ver com o espaço de trabalho e, por causa do meu cabelo comprido, ela achou que eu era gay e ela tinha essa permissão.”

Davina também se deparou com dificuldades ao buscar por empregos. Antes da transição, ela conseguiu uma oportunidade de estágio, mas quando terminou o ensino médio, o estágio foi cancelado. De acordo com a jovem, após trocar seu nome social e começar a fazer currículo como Davina, as entrevistas de emprego nunca mais surgiram. Até o momento, seu único trabalho depois da transição foi como babá e como modelo.

Essa realidade reflete a dificuldade desse público ao tentar ingressar no mercado de trabalho. Muitas vezes não avançam sequer nos processos seletivos e não são contratados apenas por serem quem são.

As adversidades no dia a dia de pessoas trans

O impacto do preconceito na vida da comunidade T

“O momento que sofri o primeiro preconceito foi dentro da família e aí tive que me tornar forte”

Como acontece com a grande maioria das mulheres e homens trans, Marquita não teve apoio da família. A exclusão familiar ocorreu quando tinha apenas 14 anos, foi expulsa de casa e mudou de cidade para morar com um tio, após dois anos retornou para Santa Maria apenas com a roupa do corpo. Sem lugar para morar e família para acolhê-la, dormiu nas ruas da cidade e foi amparada pelos iguais a ela.

Marquita comenta como era o preconceito na década de 80:

Na trajetória de Davina, seu pai se tornou um dos primeiros desafios preconceituosos que ela enfrentaria. Na busca por tentar encontrar uma explicação para os seus sentimentos, resolveu assumir-se, a princípio, como um homem homossexual para a família, iniciando um processo de negociação entre a sua identidade e a aceitação dos outros. Após Davina e sua mãe saírem de casa na pandemia da covid-19, a jovem começou a refletir e descobriu que haveria uma (des)construção em sua vida. No final de 2020, Davina nasceu e a relação com o pai ficou em pedaços.

Cauã, por sua vez, teve o apoio da mãe desde o começo da transição, tanto emocional quanto financeiro. Por mais que fosse difícil, ela estava sempre presente para apoiá-lo. Porém, por parte do pai houve, no início, uma certa rejeição e dificuldade durante o primeiro ano de transição. Seus avós paternos optaram por cortar relações e nunca mais falaram com o neto. Alguns familiares mais próximos de Cauã se mantiveram em sua vida, pessoas que ele chama de parceria.

“Infelizmente grande parte das mulheres trans encontram o preconceito dentro da família. Muitas são expulsas de casa, pela própria mãe ou pelo pai, geralmente pelo pai. Tem mães que também não aceitam, porque esperavam um homem que casasse e tivesse filhos. Mas também tem muitas mães que abraçaram a causa junto aos filhos, eu acho isso lindo” – Cilene

Cilene costuma dizer que foi abençoada por ter sido acolhida pela família, apesar de ter sido uma construção. Foi criada em um meio onde predominava o amor e o respeito. O pai era militar, no começo foi difícil a aceitação e compreensão, mas com a convivência ele a aceitou, embora não a chamasse de Cilene. “Ele nunca me chamou pelo nome social, e eu não esperaria isso de um homem de 80 anos”. Cilene sempre colocou a família em primeiro lugar e amou-os de forma incondicional. Infelizmente, seus pais já faleceram, mas ela recorda carinhosamente dos dois e segue a vida pregando os ensinamentos de amor e respeito que ambos a ensinaram.

Passabilidade: a influência da aparência na vida de pessoas trans

Cilene fala sobre sua história com muita leveza e humor, assim como compartilha a sua vida de uma forma muito sincera, aberta e acolhedora. Apesar de ser designada ao gênero masculino ao nascer, sempre lutou pela existência da mulher que vivia dentro de si, sem perder o humor, a graça e a alegria.

De acordo com a revista Veja, aproximadamente 70% das mulheres trans se submetem a cirurgia de redesignação sexual e apenas 35% dos homens trans procuram pela cirurgia genital. Segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), as filas de acesso para a redesignação sexual superam os dez anos de espera, atualmente.

Mas apesar do índice ultrapassar a metade da população trans feminina, algumas mulheres optam por não realizá-la e se consideram satisfeitas com seu corpo. Este é o caso da Cilene, embora a aparência feminina, o cabelo longo, os seios fartos, a maquiagem, façam parte da sua personalidade. Cilene nunca cogitou realizar a cirurgia de redesignação sexual.

“Estou satisfeita com meu corpo, não pretendo me mutilar, nunca tive a idéia de cirurgia. Respeito aquelas que não aceitam o órgão, mas eu me aceito perfeitamente”.

Apesar da cirurgia ser considerada uma afirmação de gênero pela revista Veja, a mudança na forma de se vestir, de se comportar ou até mesmo de se montar, passou a ser a principal necessidade de mulheres que se descobriram trans, logo, quanto mais feminina, mais mulher aos olhos da sociedade.

Cilene participou, em 2019, da Parada do Orgulho LGBT Alternativa organizada pelo Coletivo Voe apresentando uma de suas performances - Foto: Vitória Gonçalves.
Cilene participou, em 2019, da Parada do Orgulho LGBT Alternativa organizada pelo Coletivo Voe apresentando uma de suas performances - Foto: Vitória Gonçalves.

No “processo da Marquita”, como ela mesma chama, começou a se montar, passar maquiagem e usar roupas femininas. Em suas próprias palavras, essa construção vem muito da heteronormatividade. “Tem que ter peito, tem que ter cabelo comprido, tem que ter uma passabilidade para poder estar inserida na sociedade e no mercado de trabalho. Independente da aparência estética que se tem, a identidade de gênero é uma coisa e a aparência é outra coisa. Em uma sociedade que julga as pessoas pelo órgão genital, isso tem de ser repensado.”

Atualmente, Marquita é uma ativista da causa LGBTQIA+ e coordenadora do ONG Igualdade - Foto: Vitória Gonçalves.
Atualmente, Marquita é uma ativista da causa LGBTQIA+ e coordenadora do ONG Igualdade - Foto: Vitória Gonçalves.

“É um processo de auto-aceitação, olhar o seu corpo e se aceitar, isso tem uma pressão muito grande. Afeta a autoestima e saúde mental da nossa população. A saúde mental é muito debilitada, por todo esse processo da pressão, da transfobia e lgbtfobia.” – Marquita

Assim como Marquita e Cilene, apesar de terem vivido as experiências em épocas diferentes, Davina também sentiu uma pressão estética ao se assumir como mulher trans. “[…] no começo eu sentia muita pressão estética, de me parecer com uma mulher cis. Sentia essa necessidade de vestir coisas femininas e me esforçar ao máximo para ter essa aparência delicada […]”.

Davina considerava seu corpo fora do padrão e vivenciou um período difícil e delicado, onde foi necessário uma constante luta por reconhecimento e aceitação. A jovem sentia muita disforia pelo próprio corpo, se sentia desconfortável com sua altura, seus ombros largos e suas mãos grossas. O verão era um incômodo, suas veias das mãos ficavam nítidas, mais um motivo para despertar a sua frustração.

Foi complicado, no começo foi bem difícil. Eu sentia mesmo essa pressão, mas não sei se a pressão vinha das pessoas ou eu me pressionava, acredito que eu mesma. Agora eu sei que não precisa, eu aceito meu corpo, sinto falta de alguma coisa as vezes, me incomoda bastante ter pelo no rosto, odeio ter pelo no rosto, é o que mais me incomoda na verdade.”

Davina em um dos seus trabalhos como modelo no desfile do curso de moda da UFN - Foto: Arquivo Pessoal.
Davina em um dos seus trabalhos como modelo no desfile do curso de moda da UFN - Foto: Arquivo Pessoal.

Quando Davina iniciou a transição, ela tinha como prioridade fazer terapia hormonal, mas agora não vê mais necessidade de tomar hormônio, pois gosta bastante do seu corpo. Porém, pretende avaliar na terapia com uma psicóloga e decidir se realmente quer ou não começar o processo de hormonização.

A pressão estética não atinge só as mulheres trans, mas os homens trans também se deparam com essa realidade, e foi uma das questões para Cauã. Em 2019, quando retificou o nome, sua aparência era diferente, tinha os cabelos compridos, ele gostava, mas muitas pessoas não gostavam. Frustrado com os questionamentos sobre seu cabelo, cortou. “Certamente, teve uma pressão pra deixar essa aparência. Os endócrinos diziam para eu fazer academia pra ficar mais musculoso. Mas eu sempre caminhei ou fiz algum tipo de esporte, então aquilo não era questão de saúde, eles estavam falando sobre aparência física. Isso é cobrado, para todas as pessoas trans é cobrado, para mulheres trans com certeza é pior”.

Em 2018, ele começou a fazer o tratamento da hormonização em Porto Alegre, sua cidade natal, no sistema privado, já que em Santa Maria ainda não existiam os ambulatórios pelo SUS que hoje auxiliam a população trans no processo de transição.

“Agora que tenho cabelo curto, barba e voz, eu tenho acesso a um respeito que nunca tive na vida. Nem antes e nem durante a transição. As pessoas parecem que me ouvem mais, é surreal”

Cauã compartilha as vantagens de se parecer com uma pessoa cis:

Entre o amor e a dor

Amar sempre foi algo complexo. Às vezes o amor não correspondido pode definir como uma pessoa vai ser daquele momento em diante. Assim como o amor muda um ser humano, a rejeição muda mais ainda. Cilene relata a sua realidade como mulher trans no mundo de relações afetivas e a dificuldade em encontrar o reconhecimento e aceitação que tanto anseia.

“Às vezes a pessoa tá com vergonha de estar do teu lado por ser quem tu é. O coração é um ponto muito fraco nosso. A gente está sempre procurando um amor, mesmo sabendo que aquele amor não vai ser correspondido e isso te frustra muito.Eu vivi quatro anos com um homem e sofri muito quando ele me deixou. Ele me trocou por uma mulher cis. Ele não estava errado, eu que estava errada de me entregar inteira”

Iniciativas de apoio à comunidade trans em Santa Maria

A importância da assistência à saúde física e mental

Utilizo o Sistema Único de Saúde (SUS), é um direito e acredito que devemos fortalecer o SUS”

Durante a transição, Marquita não teve apoio psicológico. Hoje em dia ela faz tratamento porque foi diagnosticada com Transtorno de Personalidade Borderline. Em Santa Maria, recentemente, dois ambulatórios para o público trans foram instaurados na cidade para dar auxílio a essa população: o Ambulatório Transcender e o Ambulatório Trans do Hospital Casa de Saúde.

“É muito importante esses espaços de saúde que a gente tem hoje, os ambulatórios trans, porque a saúde é fundamental e para nossa população mais ainda. Porque a nossa população não acessa a saúde facilmente, é importante ter acesso a esses locais”

O Ambulatório Trans do Hospital Casa de Saúde, inaugurado em 2022, oferece atendimento médico a pessoas que buscam iniciar ou prosseguir com a transição de gênero. O local especializado conta com atendimento clínico, psicológico, psiquiátrico e endócrino via SUS. O foco do ambulatório é dar atendimento clínico e psicossocial a pessoas que queiram fazer a transição com tratamento hormonal. Além de Santa Maria, o espaço atende também as 33 cidades da Região Central.

O Laboratório Transcender atendeu cerca de 65 pessoas trans em um ano de atendimento - Divulgação Prefeitura de Santa Maria Crédito: Marcelo Oliveira/PMSM.
O Laboratório Transcender atendeu cerca de 65 pessoas trans em um ano de atendimento - Divulgação Prefeitura de Santa Maria Crédito: Marcelo Oliveira/PMSM.

Destinado apenas aos residentes de Santa Maria, o Ambulatório Transcender nasceu em 2020 como um laboratório destinado à população T, mas ampliou os atendimentos a toda a população LGBTQIA+. O laboratório funciona junto à Policlínica de Saúde Mental, localizado na Rua dos Andradas, número 1.397. Os serviços oferecidos são: apoio psicológico, médico clínico e odontológico. Já os pacientes que desejam fazer a hormonização são encaminhados à Casa de Saúde. Em um ano de atendimento do ambulatório, 65 homens e mulheres trans e travestis foram acolhidos. É necessário reforçar que o atendimento é gratuito, via SUS e não é necessário agendar consulta ou ter encaminhamento de um posto de saúde, tudo para facilitar o acesso da população ao atendimento.

O ambulatório realiza uma busca ativa principalmente a pessoas Trans, Travestis e Transgêneros, para oferecer assistência. “A população T já tem historicamente uma dificuldade de acesso às Unidades Básicas de Saúde e, hoje, estamos fazendo um movimento de captação dessa população. No início, nós achamos que seria mais fácil eles aparecerem, mas não foi isso que aconteceu. A solução que encontramos é fazer visita domiciliar, vamos até as Unidades Básicas e conversamos com as agentes de saúde, elas já tem mais ou menos um mapa daquele território e das pessoas que têm interesse. A partir disso, a enfermeira vai até a casa, explica como funciona e oferece os serviços que disponibilizamos”, relata o psicólogo e coordenador do ambulatório Transcender, César Bridi, sobre a necessidade da busca ativa.

Bridi reforça que o atendimento é gratuito, público e acessível para todos e todas - Foto: Vitória Gonçalves.
Bridi reforça que o atendimento é gratuito, público e acessível para todos e todas - Foto: Vitória Gonçalves.

O Transcender também abre espaço para as pessoas que querem falar sobre questões de identidade. Ele tem grupos de afirmação de gênero para adultos – maiores de 18 anos – e grupos para adolescentes, dando oportunidade de se descobrir e se entender. Além do atendimento em grupo, dispõe de atendimento individual e para família, como conta Bridi: “Quando uma pessoa transiciona ou descobre sua orientação sexual, todos que estão no entorno precisam lidar com isso. A gente acolhe, explica, orienta os familiares e, caso necessário, encaminhamos para a psiquiatria da policlínica. Nós pensamos que, quando a pessoa vem pra cá, ela precisa se sentir protegida e acolhida.”

Outro espaço que acolhe vítimas de violência de gênero e tem como foco o público LGBTQIA+ e feminino é a Casa Verônica. O projeto é ligado ao Observatório de Direitos Humanos (ODH) e Pró-Reitoria de Extensão (PRE) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). O local recebeu o nome Casa Verônica para homenagear e manter viva a luta e ativismo de Verônica Oliveira, conhecida como Mãe Loira. Ativista trans e referência na militância LGBTQIA+ na cidade, Verônica foi violentamente assassinada no ano de 2019 a facadas.

A Casa Verônica pretende promover rodas de conversa, eventos e oficinas, focalizadas na saúde mental e física do público alvo, assim como promover a inclusão de nome social, para fomentar políticas públicas voltadas para essas questões. Cauã, atualmente, faz parte da equipe e expõe a importância de existir um espaço como esse, devido a alta demanda: “É um projeto que poucas universidades têm até agora. Mas não é porque esses projetos são raros e escassos que há pouca demanda, a demanda é grande. As pessoas têm sede e fome de reconhecimento, de diálogo e de troca”.

Logo da Casa Verônica. Ilustração: Noam Wurzel/ Casa Verônica.

Logo da Casa Verônica

Ilustração: Noam Wurzel / Casa Verônica.

Os atendimentos ainda não começaram, pois a Casa Verônica está trabalhando na contratação dos profissionais, processo que envolve trâmites administrativos. Mas a Casa oferece orientações sobre os serviços disponíveis na universidade e na cidade e, conforme o caso, realiza encaminhamentos para a rede.


Reportagem produzida na disciplina de Jornalismo Investigativo, no 2º semestre de 2022, sob orientação da professora Glaíse Palma.

Foto: Foto da Shopify Partners do Burst

 

A orientação sexual é algo pessoal, uma escolha de cada um, mas, caso não se encaixe no que os padrões heteronormativos, ela encontra barreiras em diferentes níveis de convívio, desde a família nuclear até a sociedade como um todo. Hoje vivemos tempos em que discursos de ódio, atos homofóbicos, transfóbicos e violência contra pessoas LGBTs acontecem todos os dias a céu aberto em nosso país.
Em setembro desse ano, dois casos de assassinato de mulheres transgêneras em menos de 24 horas em nossa cidade levantaram novamente a discussão sobre crimes motivados por homofobia e transfobia. O primeiro desses casos foi o de uma vítima de 27 anos, morta a tiros na esquina da Avenida Presidente Vargas com a Avenida Borges de Medeiros. A segunda, de 37, foi morta com 13 facadas, no bairro Tancredo Neves.

Uma pesquisa conjunta realizada em 2012 pela professora Martha Souza, doutora em Ciências pela USP, e pelo professor Pedro Paulo Pereira, doutor em Antropologia pela UnB, acompanhou a trajetória de 49 travestis residentes em Santa Maria para verificar como é a busca por cuidados médicos na rede de saúde da cidade. A pesquisa traz diversos relatos dessa população, entre eles a marginalização que as travestis sofrem, inclusive com uma tentativa de homicídio com travestis gêmeas. As irmãs contam que saíram com dois homens e quando eles notaram que se tratava de duas travestis, elas foram espancadas com alicate e chave de fenda. Quando pediram socorro para a segurança de uma boate, foram chamadas de bandidas e encaminhadas para a delegacia junto com os homens. “Mesmo com testemunha, acabamos como bandidas. Ninguém acredita em travesti. Depois, precisamos ir até o serviço de saúde. […] Mesmo explicando que estava doendo muito, não deram remédio”, conta Whitney, uma das irmãs, com 22 anos na época. Há especulações de que os crimes foram por motivos fúteis ou tentativa de estupro, descartando a transfobia. Mas, analisando os dados do Brasil, pode-se concluir que não se trata apenas de motivos fúteis.

Segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB) – entidade que há 39 anos registra dados de violência contra LGBTs no Brasil – ano passado foram computadas 420 mortes no país. Delas, 76% foram homicídios e 24% suicídios, uma morte a cada 16 horas no País. Os números colocam o Brasil no ranking dos países que mais mata LGBTs no mundo. Já de acordo com Julio Pinheiro Cardia, ex-coordenador da Diretoria de Promoção dos Direitos LGBT do Ministério dos Direitos Humanos, 8.027 pessoas LGBT’s foram mortas no país entre 1963 e 2018 em razão de orientação sexual ou identidade de gênero. Entre 2011 e 2018, foram 16.326 casos relatando 26.938 violações. No ano passado, por exemplo, 667 pessoas ligaram para o governo alegando ter sofrido violência física. É menos do que as 864 denúncias de 2017, mas superior às 561 de 2016. O canal também registrou 1.871 acusações de violência psicológica sofridas por LGBTs no ano passado, número maior apenas do que em 2011, quando 1.647 pessoas fizeram denúncias. Ainda em 2018, 170 pessoas teriam sofrido alguma violência em razão de sua identidade de gênero. Em 2017, foram 258; em 2016, 184; e, em 2015, foram 220 denúncias. A violência física sofrida pela comunidade LGBT continua como uma das acusações mais frequentes: 667 no ano passado, contra 864 em 2017 e 561 em 2016.

De acordo com a Transgender Europe, com sede na Alemanha, os dados sobre pessoas trans assassinadas não são especificados em grande parte dos países, o que impossibilita uma estimativa real do número de casos. Para Jackeline Romio, doutora em Demografia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é necessário que os registros de homicídios contra a população trans tenham uma identificação para possibilitar um diagnóstico de suas causas com base em informações mais realistas.

A violência LGBTIfóbica no Brasil em uma semana (27/05 a 03/06/2019):

– 5 Travestis Assassinadas (tiros, pauladas, espancamento, corpo incendiado)
– Lésbica encontrada morta com sinais de espancamento e violência sexual
– Homem gay encontrado morto em matagal com sinais de espancamento
– Homem trans vitima de estupro corretivo
– Mulher trans internada compulsoriamente pela família
– Homem trans se suicida (assassinato social).
– Diversos ataques homofóbicos
– Psicólogos a favor da ”Cura-gay” lançam candidatura no CFP

Entre 1º de outubro de 2017 e 30 de setembro de 2018, 167 transexuais foram mortos no Brasil. A pesquisa, feita em 72 países, classificou o México em segundo lugar, com 71 vítimas, seguido pelos Estados Unidos, com 28, e Colômbia, 21. A organização contabilizou um total de 369 homicídios de transexuais e indivíduos não-binários, indicando um aumento de 44 casos em comparação com a pesquisa do ano passado e de 74 casos com relação a 2016. No Brasil, foram contabilizadas 171 mortes, em 2017, e 136, em 2016. Em ambas situações, o país ocupou o primeiro lugar no ranking.

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que discriminação por orientação sexual e identidade de gênero é crime no Brasil. Os ministros determinaram que a conduta passe a ser punida pela Lei de Racismo (7716/89) que atualmente é um crime inafiançável e imprescritível. O dia 17 de maio é marcado como o dia Mundial da luta contra a Homofobia. A data foi escolhida porque em 17 de maio de 1990, após pressão da comunidade LGBT, a Organização Mundial da Saúde (OMS) excluiu a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID). No Brasil, a data foi instituída por meio de decreto presidencial do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nos estados em que não há delegacias especializadas, as denúncias podem ser feitas pelo 190 (número da Polícia Militar) e pelo Disque 100 (Departamento de Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos).

 

*Texto produzido por Guilherme Superti e Caroline Scremin, para a disciplina Jornalismo Investigativo, do Curso de Jornalismo da Universidade Franciscana, durante o 2º semestre de 2019. Orientação: Professora Carla Torres.

Em 2016, o Brasil foi considerado o país mais transfóbico do mundo. Arte: Deivid Pazatto

Em 2016, a ex-presidenta Dilma Rousseff assinou um decreto que permite a travestis e transexuais usarem o nome social em todos os órgãos públicos, autarquias e empresas estatais federais. O nome social é nome escolhido por essas pessoas de acordo com o gênero ao qual se identificam, independentemente do nome com que foram registrados no nascimento, como forma de legitimar a sua existência de acordo com a identidade que expressam na sociedade. Porém, esse decreto muitas vezes não é cumprido, o que leva ao constrangimento dessas pessoas ao serem chamadas pelo nome de nascimento em algumas instituições.

Um dos grandes fatores que acometem esse desrespeito é a transfobia, e está muito ligado à estrutura machista da sociedade – e aqui podemos frisar a brasileira. O Brasil desponta como o país mais transfóbico do planeta, com altos índices de homicídio contra a população trans.

Segundo a ONG europeia, a Transgender Europe (TGEu), em nenhuma outra nação há tantos registros de homicídios de pessoas transgêneras como no Brasil. O Grupo Gay da Bahia (GGB), em seu relatório anual, aponta que em 2017, 42,9% das LGBT assassinadas eram travestis ou transexuais – em número, foram 191 vítimas de transfobia, dos 445 homicídios registrados no ano passado.

Ser travesti ou transexual no país que mais mata essa população é uma tarefa de resistência diária. No levantamento feito pela Transgender Europe, que traz os números de transfobia entre 2008 e 2016, revela o quão assustador é pertencer à população trans e morar no Brasil. Os números levantados mostram que o Brasil teve 868 mortes durante o período de oito anos, liderando o ranking. Em seguida aparecem México, com 259; Estados Unidos, com 146 e; Colômbia e Venezuela, empatadas, com 109. O Brasil registrou 3,5 vezes mais mortes que o segundo colocado. Além disso, a expectativa de vida da população trans é de 35 anos, metade da média nacional.

Imagem: Projeto Transformar

O nome é a nossa primeira identidade. É através dele que nos apresentamos e o que nos diferencia em público. Em nossa cultura, os nomes possuem uma binaridade de gênero que nos é atribuído logo no nascimento, após o reconhecimento do sexo. Muitas vezes não gostamos do nome que nos é dado ao nascer, mas essa situação se torna muita mais complexa quando se trata de travestis e transexuais. Ao perceber que o sexo atribuído ao nascer e sua identidade são opostas, transgêneros travam diversos conflitos internos, começando pela utilização de um nome social que é desrespeitado. Algo que parece tão simples, porém, é uma questão de dignidade humana.

Sexo e gênero estão ligados à construção da identidade. O sexo é um atributo biológico, que nos classifica como feminino, masculino ou intersexo. O gênero representa como nos reconhecemos na sociedade e aí entram diversos fatores para a sua construção. Segundo a filósofa Judith Butler, o gênero é uma construção cultural, no sentido de que vamos nos apropriando de diferentes significados culturais para a construção de nossa identidade. Mas há uma associação cultural padrão entre o sexo e gênero. Essa expectativa nos limita logo ao nascer, e está muito ligada ao sexo biológico – órgão masculino = homem; órgão feminino = mulher. Essa construção cisgênera acaba caindo por terra quando os transgêneros se diferem desse padrão binário. O sexo acaba sendo o oposto do gênero vivenciado. E ter recebido um nome que não condiz com o gênero o qual se identifica, é muito difícil para travestis e transexuais.

Ao se perceber e entender com uma identidade diferente, o nome civil de travestis e transexuais representa uma pessoa que elas não são mais. A utilização e reafirmação desse nome gera diferentes conflitos internos e o que configura uma violência, seja no momento em que o outro pronuncia esse nome ou quando uma travesti ou transexual é obrigada a escrever o nome civil.

Essa autoagressão também é um dos fatores de provocam a depressão dessas pessoas. Por sofrerem violência, a população trans está mais suscetível a desenvolver quadros depressivos, levando muitas vezes ao suicídio. A transfobia vivenciada no dia-a-dia de transgêneros perpassa o âmbito familiar e está presente em diversos setores da comunidade. A violência institucional em relação a travestis e transexuais é a que mais fere quando se fala em respeito ao nome social. Universidades, hospitais e delegacias provocam diferentes tipos de constrangimento a essa população, começando pelo desrespeito ao nome social.

Após ataques transfóbicos e ao recorrerem às delegacias para prestar um boletim de ocorrência, transgêneros não tem seu nome social respeitado. Nesse sentido surge a necessidade de delegacias especializadas no atendimento a pessoas LGBT em todo Brasil. No que confere às travestis e transexuais, algumas delegacias das mulheres no país acabam direcionando o seu foco de atendimento também para essa população, como é o caso das delegacias especializada de Atendimento à Mulher (Deam) do Acre e na Paraíba, que desde 2017 garantem o direito de travestis e mulheres transexuais.

Após ouvirem e obrigadas a fazer o boletim de ocorrência com o nome de batismo nas delegacias, se agredidas, muitas vezes travestis e transexuais recorrem aos hospitais e a história se repete. O constrangimento retorna quando, para o atendimento, os profissionais da saúde utilizam o nome civil para cadastros. Em muitos casos, alguns profissionais negam atendimento, como foi o caso de uma travesti de Canela (RS), que após passar mal foi até o Hospital de Caridade de Canela. Ao se deparar com a travesti usando roupas ditas femininas, uma enfermeira omitiu socorro e ameaçou chamar o segurança. O caso aconteceu em 2011, mas só em novembro do ano passado o hospital foi condenado a pagar R$ 30 mil reais por omitir atendimento à travesti.

Bandeira arco-íris, símbolo dos homossexuais e também do movimento LGBT. Foto: internet

Uma pesquisa conjunta realizada em 2012 pela professora Martha Souza, doutora em Ciências pela USP, e pelo professor  Pedro Paulo Pereira, doutor em Antropologia pela UNB, acompanhou a trajetória de 49 travestis residentes em Santa Maria em busca de cuidados com a saúde. Intitulada Cuidado com saúde: as travestis de Santa Maria, Rio Grande do Sul, a pesquisa traz diversos relatos dessa população, entre eles a posição de marginalização que as travestis são colocadas. Durante a pesquisa, os autores contam que ocorreu uma tentativa de homicídio com travestis gêmeas. As irmãs relataram que após saírem com dois homens e eles perceberem que as duas eram travestis, foram agredidas com chave de fenda e alicate. Após pedirem socorro para um segurança de uma boate, foram todos para a delegacia. “Mesmo com testemunha, acabamos como bandidas. Ninguém acredita em travesti. Depois, precisamos ir até o serviço de saúde. […] Mesmo explicando que estava doendo muito, não deram remédio”, conta Whitney, uma das irmãs, com 22 anos na época.

Felizmente as irmãs gêmeas de Santa Maria se salvaram. Mas essas agressões se repetem dia após dia. A forma como a vida de travestis e transexuais são assassinadas é muito cruel. Facadas, pedradas, tiros. Mutiladas, dilaceradas, torturadas. Dandara é o maior exemplo da crueldade que a população trans está suscetível. Em fevereiro de 2017 ela foi torturada, agredida com socos, chutes, e golpes de pedra e pau em praça pública na cidade de Fortaleza, no Ceará. A exposição na qual Dandara foi submetida não ficou apenas em praça pública, mas foi parar nas redes sociais. 12 homens foram acusados de tirar a vida da travesti – até o mês de outubro desse ano, seis agressores foram condenados e estão presos.

O uso das redes sociais facilitou a comunicação e ampliou que mais informações pudessem circular e que esses casos viessem a conhecimento público. Essas mortes não são contabilizadas por delegacias e cabe às ONG’s fazer esse registro. O Grupo Gay da Bahia, criado em 1980, a mais antiga associação em defesa dos direitos LGBT, colhe todas essas informações, anualmente, através da internet, amigos ou outras redes que vão se fortalecendo para que eles possam contabilizar a proporção da LGBTfobia no país. A Rede Trans Brasil e a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) também são duas associações que fazem esse monitoramento, voltado apenas para a população trans. Até novembro desse ano, a ANTRA já registrou 149 assassinatos contra pessoas trans no Brasil.

Toda a vulnerabilidade a qual travestis e transexuais estão submetidas vem da transfobia que está impregnada nas raízes culturais do nosso país, muito ligada ao machismo, que acaba por refletir na população trans pelo fato de elas transpassarem os padrões heteronormativos. Não podemos esquecer dos homens transexuais, que por vezes são invisibilizados. Em casos de homicídios, os homens trans não são contabilizados nas estatísticas, por serem registrados com o nome de batismo nas ocorrências, novamente ferindo a identidade dessas pessoas. As mortes desses homens muitas vezes não são investigadas ou passam a ser enquadradas na lei do feminicídio, não configurando como um ato de transfobia.

Na luta pelo reconhecimento dos direitos da população LGBT, membros do Coletivo Voe posam frente ao público da 4ª Parada LGBT. Foto: Denzel Valiente

Os reflexos da transfobia ferem todos os campos da sociedade que são por direito de travestis e transexuais. A população trans é marginalizada em todos os setores da sociedade e essa exclusão reflete no grande número de travestis e transexuais que trabalham na prostituição. Devido a falta de oportunidade, essa acaba sendo a única opção de sobrevivência para a população trans, já que a oportunidade de outros empregos são muito pequenas, e se restringe a poucas empresas dispõem dessas políticas. Uma estimativa feita pela ANTRA, aponta de 90% da população trans recorre a prostituição ao menos em algum momento da vida.

Entre os motivos para a exclusão e marginalização da população trans, estão os grandes níveis de violência no contexto histórico do país – e aqui podemos citar a ditadura militar, onde travestis e transexuais eram perseguidas e mortas. A falha do Estado em investigar os crimes contra essa população, também é um dos motivos que leva ao aumentos desses números de violência. A vulnerabilidade da população trans na prostituição também é uma falha do Estado. Existem pouquíssimas políticas públicas que inserem essas pessoas seja nas universidades ou empregos.

A inclusão de travestis e transexuais nas universidade permite a oportunidade de entrarem no mercado de trabalho. O respeito ao nome social nesses espaços, pode representar uma importante condição de permanência dessa população nas faculdades, pois ali elas passarão a ser respeitadas e incluídas. Hoje, diversas universidades respeitam o nome social no Brasil. Em janeiro desse ano, o Ministério da Educação (MEC) autorizou o uso do nome social na educação básica para travestis e transexuais.

No Brasil não há legislações que garantam os direitos básicos de travestis e transexuais. Das poucas iniciativas nacionais, só constam o decreto sancionado pela ex-presidenta Dilma Rousseff que determina o uso do nome social em órgão públicos. Com isso travestis e transexuais também passam a ter o nome social respeitado, por exemplo, no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), onde são reconhecidos pelo nome que escolheram e nas eleições, a partir desse ano, onde mais de 6 mil eleitores votaram com o nome social. Também há uma portaria (nº 2.803, de 19 de novembro de 2013,) que determina a oferta do processo transexualidor (processo de hormonioterapia e cirurgia de adequação do corpo biológico à identidade de gênero e social), pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Essa decisões são frágeis, devido a falha do Estado e as diversas repressões que as pautas LGBT sofrem no Congresso Nacional. Reflexo disso é a não criminalização da LGBTfobia no país que mais mata LGBT. Em 2006, o projeto da ex-deputada Iara Bernardi chegou a ser aprovado na câmara, mas ao chegar ao Senado foi adiado e arquivado em 2014. Desde o início do mês de outubro desse ano, o site do Senado Federal está realizando uma consulta pública sobre o projeto de Lei do Senado nº 515/2017 que criminaliza a LGBTfobia, com autoria da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa. A consulta dá direito de votar sobre a alteração da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para punir a discriminação ou preconceito de origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero.

Mesmo com mais de 400 mil votos a favor e quase 7 mil contra a alteração, as bandeiras que envolvem a comunidade LGBT sofrem ataques e não seguem em discussão no Congresso devido aos parlamentares da bancada BBB (do boi, da bala e da bíblia) que vão contra os direitos dessa população. Todos os processos de transfobia citados, são reafirmados por lideranças conservadoras, que buscam a invisibilização do movimento e a exclusão de LGBT em todos os espaços.

O que ainda garante esses direitos, são as poucas lideranças representativas eleitas e algumas iniciativas estaduais e municipais. Uma dessas iniciativas é o Transcidadania, criado em 2015 pelo então prefeito da cidade de São Paulo, Fernando Haddad, que tem o objetivo de promover os direitos humanos e oferecer melhores condições de vida a uma parcela tão marginalizada da sociedade, como as travestis e transexuais. O programa concede bolsas de estudo e transferência de renda à população trans, levando educação, capacitação e garantia de direitos.

O nome social frente às diversas violências contra a população trans é um direito a dignidade humana.

O nome social frente às diversas violências contra a população trans é um direito a dignidade humana. Ser reconhecida ou reconhecido com o nome o qual se identifica é uma forma de existir e legitimar a sua existência enquanto cidadãs(os). O uso do nome social auxilia a população em tarefas que parecem corriqueira para pessoas cisgêneras, mas que são um problema para quem é transgênero, como a simples tarefa de abrir uma conta em um banco ou se candidatar a uma vaga de emprego. O uso da aceitação do nome social deveria ser obrigatório em todas as instituições e estabelecimentos para evitar os diferentes tipos de constrangimentos já mencionados quando utilizado o nome de batismo.

Ter o nome social reconhecido é o passo inicial na luta contra a transfobia, por isso a extrema importância para que a aceitação desse nome seja ampliada a todos os setores da sociedade. Um processo que era burocrático, hoje está mais acessível. Para obtenção da Carteira do Nome Social, a pessoa precisa ter no mínimo 16 anos e levar a Certidão de Nascimento no local onde feita a Carteira de Identidade na sua cidade. Após solicitar a Carteira de Nome Social, leva cerca de 10 dias para ficar pronta. Em fevereiro desse ano, o presidente Michel Temer sancionou o decreto nº 9.278/18 que regulamenta a lei nº 7.116 de 29 de agosto de 1983, para que as carteiras de identidade possam abranger o nome social de pessoas transgêneras. Para emitir a Carteira de Identidade com o nome social, basta que o interessado manifeste sua vontade através de um requerimento escrito e apresentar a Certidão de Nascimento. Junto com o nome civil, a identificação no novo documento virá acompanhada de “nome social”. A partir de 2019, todos os órgãos identificação deverão obedecer o novo decreto.

Desse modo, com a nova norma, não é mais necessário contratar advogados e passar por processos na Justiça para conseguir o nome social. O decreto articulado pelo Ministério do Direitos Humanos, é uma homenagem a João W. Nery, um dos maiores ativistas transgêneros do país. João, que faleceu em 26 de outubro desse ano, foi o primeiro homem trans no Brasil a passar por uma cirurgia de redesignação sexual (mudança de gênero). O projeto que leva o nome do ativista, parado há anos no Congresso, visa que a pessoa trans não precisará se submeter a cirurgia ou hormonização caso deseje alterar os documentos.

A nova carteira que trará o nome civil e o nome social juntos, pode não ser o suficiente para evitar situações constrangedoras, já que ela sugere os dois nomes e isso ainda permite ataques transfóbicos. As falhas do Estado são muito grandes é de extrema urgência políticas públicas para uma população que é dizimada no país. O desrespeito ao nome social é apenas a ponta do iceberg em um país que omite, esconde, máscara a transfobia em todos os setores da sociedade. Ser travesti e transexual no Brasil, é resistir e lutar pela vida todos os dias.

Artigo produzido para a disciplina de Jornalismo Humanitário, no segundo semestre de 2018, sob a orientação da professora Rosana Cabral Zucolo

Imagem: Divulgação / Projeto Transformar

O país mais transfóbico do mundo. Esse foi o título que o Brasil recebeu no ano passado, após 144 travestis e transexuais serem assassinados. Os dados assustadores de 2016 levaram o País ao primeiro lugar, num ranking elaborado pela rede europeia Transgender Europe (TGEU). Porém, esses números alarmantes não param de subir. Segundo a Rede Trans Brasil – que realiza coleta de dados através de notícias e relatos que chegam a organização -, até outubro de 2017, 171 travestis e transexuais já foram assassinados no país, batendo o recorde do ano que passou.

O Brasil, novamente, se colocará num infeliz destaque. De acordo com uma projeção realizada pela equipe de reportagem, apoiada nos dados já registrados até outubro de 2017 pela Rede Trans Brasil, podemos encerrar o ano com cerca de 200 vítimas da transfobia. Os números só comprovam a onda conservadora que assola o país e a falta de políticas públicas destinadas para essa parcela da população. Em fevereiro deste ano, o caso da travesti Dandara chocou o país. Morta brutalmente por um grupo de jovens no Ceará, o vídeo de Dandara  sendo assassinada a chutes e pauladas ganhou repercussão na internet.

Em 2016, o Brasil foi considerado o país mais transfóbico do mundo. (Arte: Deivid Pazatto)

Vulneráveis, o risco de travestis e transexuais serem assassinados é 14 vezes maior do que um homem gay.  Seja por um ato físico ou verbal, a transfobia marca vidas. Essas ações transfóbicas não estão presentes só na rua, mas também em instituições públicas, sejam universidades, delegacias policiais e hospitais. Locais que deveriam acolher essas pessoas, acabam por não terem profissionais capacitados para essa população. A violência institucional está presente no cotidianos desse grupo.

VIOLÊNCIA NOS SERVIÇOS DE SAÚDE

Uma vida de negação de direitos. Assim é a trajetória de travestis e transexuais no Brasil. Além do grande números de assassinatos, agressões físicas e verbais, relatos de violências também se fazem presentes no dia-a-dia dessa população. Nos hospitais, a omissão de socorro e o desrespeito ao nome social são as declarações mais frequentes entre travestis e transexuais.

Os relatos espalham-se pelo Brasil. Em março deste ano, a assessora parlamentar Barbara Reis foi até um hospital público na cidade de Rio de Janeiro, para uma ressonância magnética dos seios, que receberam próteses de silicone. Ao ser chamada para a consulta pela médica residente, Barbara ouviu seu nome de batismo, mesmo apresentando a carteira de nome social.

“O fato de tu não respeitar o nome social, o nome que aquela pessoa escolheu, pra mim, já é transfobia. E temos um problema bem sério com os hospitais. Eles respeitam o que está nas certidão de nascimento e não como a pessoa se identifica. Esse é o grande problema que a gente tem” (Bruna de Nicol Brum, enfermeira residente em saúde mental)

Para Guilherme Dias, o que seria uma consulta de rotina na ginecologista, para um exame papanicolau, acabou em trauma. Ao explicar que era um homem trans e que iniciaria um tratamento hormonal, o carioca foi violentado pela médica após despir-se. “Ela disse que se eu era homem, deveria fazer outro exame”, conta Dias, fazendo referência ao exame de próstata.

Já em Canela, no Rio Grande do Sul, no mês de novembro, um hospital foi condenado a pagar R$ 30 mil por negar atendimento a uma travesti. Após passar mal, a travesti e seu companheiro foram até o Hospital de Caridade de Canela. Ao solicitarem atendimento, uma enfermeira se escandalizou com as roupas ditas femininas que a travesti usava e omitiu socorro, ameaçando chamar o segurança. O caso aconteceu em 2011. Após o incidente, a travesti levou o caso à justiça e o hospital reconheceu o episódio como um “ato falho” da funcionária.

No ano passado, imprensa e redes sociais divulgaram 54 casos de violação dos direitos humanos. O estado de São Paulo aparece em primeiro lugar, com 21 notificações de descumprimento dos direitos humanos. Conforme dados obtidos pelo site UOL via Lei de Acesso a Informação, o paciente não tem à disposição nenhuma ferramenta de verificação para saber se  o médico que presta serviço já sofreu  punição. Mesmo que o Conselho Federal de Medicina (CFM) não proteja os profissionais, após  denúncias,  pode levar anos para o caso ser julgado. Contudo, quando há punição, são eles os únicos com pena perpétua, como, por exemplo, cassação do registro profissional.

(Arte: Deivid Pazatto)

O direito à saúde não permite que hospitais recusem atendimento a uma pessoa, sob nenhuma justificativa. Porém, a falta de capacitação profissional pode ser considerada é um dos principais fatores para que atos transfóbicos ocorram no sistema público de saúde. “Desde a escolarização básica, a gente não tem uma educação voltada a aceitar as pessoas na sua diversidade. Está tudo errado por aí. Na graduação isso só continua, pelo fato de não termos em todos os cursos – ou, pelo menos, nos cursos de humanas e saúde – uma disciplina de gênero e sexualidade”, frisa Bruna de Nicol Brum, Enfermeira Residente em Saúde Mental pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 

Segundo Bruna, o Plano de Ação Prioritário na Igualdade de Gênero 2008-2013, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), prevê que haja uma educação permanente de profissionais da saúde em relação gênero e sexualidade. “Os estudos de gênero são muito recentes. O que se veem são ações pontuais, mas nada de uma política ou de  grandes programas que possam abordar essas questões”, destaca a estudante.

A também Enfermeira Residente em Saúde Mental (UFSM), Patrícia Mattos Almeida, reforça a falta de capacitação de profissionais em Santa Maria. Patrícia fala da falta de serviços para atender essa população. “Ano passado (2016), nós tivemos uma capacitação, mas não foi  para trabalhar com a transexualidade, e, sim,  para falar sobre a LGBTfobia, onde discutimos as formas de acesso. Muitas vezes  transexuais sofrem violência nos serviços onde são recebidos. É uma discussão que tem que ser aberta e levado a tona”.

Quando se trata de gênero e sexualidade, ainda há uma série de tabus para a sociedade. Nos últimos meses, a mídia abriu espaço para a problematização da transexualidade. A telenovela A Força do Querer, da Rede Globo, trouxe o processo de descoberta, aceitação e transformação corporal de Ivan – um garoto trans.  Patrícia cita a importância de a transexualidade ser dialogada em todos os espaços, e a necessidade de políticas públicas voltadas a essa minoria. “O assunto só vai vir quando tiver uma coordenação da política das minorias no município.  Essa coordenação se responsabilizará por organizar as capacitações, educação permanente em saúde que traga o viés do gênero, e que não seja só cis-gênero, para trabalhar só com mulheres, mas para trabalhar com toda a população”.

TRANSEXUAIS E O ACESSO À SAÚDE

O acesso de travestis e transexuais a hospitais, muitas vezes gera preconceito e discriminação, devido à falta de capacitação de profissionais. Uma atenção voltada a essa população no Brasil ainda é recente e precária. Até 1997, a cirurgia de redesignação sexual (adequação dos genitais ao gênero com o qual a pessoa se identifica) era proibida no País. O processo de transformação corporal, que engloba as cirurgias de redesignação sexual, a plástica mamária reconstrutiva (incluindo próteses de silicone) e mastectomia (retirada de mama), só começou a ser ofertado pelo SUS em 2008.

Atualmente, o Brasil possui apenas nove centros ambulatoriais pelo SUS, que realizam o processo transexualizador. Ele inclui a hormonioterapia e as cirurgias, entre elas a de redesignação sexual, que não é realizada em todos os ambulatórios, pois muitos apenas realizam a parte da hormonioterapia. No Rio Grande do Sul, apenas o Hospital de Clínicas de Porto Alegre realiza esses processos.

Imagem: Divulgação/ Projeto Transformar

 

O processo de redesignação sexual ainda é muito burocrático. Um protocolo transexualizador é feito para homens e mulheres trans, para que a cirurgia seja realizada, conta Bruna. “Eles precisam passar por dois anos de terapia psiquiátrica, além de endocrinologista, psicólogo, e assistente social, para receberem um laudo, que vai atestar que estão aptos a fazer essa cirurgia”, acrescenta a enfermeira.

Desde que as medidas foram estabelecidas em 2008, a expansão da rede acontece de forma muito lenta para a demanda existente. Em 2013, foi criado a Política Nacional de Saúde LGBT, que reconhece as demandas dessa população em condição de vulnerabilidade. A inclusão de políticas voltadas para a população trans no SUS foi celebrada pelos movimentos organizados, que sempre defenderam o atendimento a essa parcela da sociedade como uma questão de direitos humanos. Porém, os relatos de transfobia no sistema de saúde confirmam que entre o que está escrito e o que se tornou realidade, há um grande abismo.

” Já ouvi inúmeros casos, como na capacitação que nós tivemos com a Verônica. Ela relatou que as meninas  sofreram algum tipo de violência durante o trabalho, à noite, e buscaram serviços de emergência e tiveram um tratamento preconceituoso” (Patrícia Mattos Almeida)

Outra demanda recorrente do movimento trans, e que causa muitos constrangimentos, é o tratamento do nome social nesses ambientes. Apesar de ser um direito garantido na Carta de Direitos dos Usuários do SUS desde 2009, muitas pessoas trans ainda têm dificuldade de ser identificadas corretamente. “Desde 2013, já é possível registrar o nome social no sistema eletrônico. Ainda assim, os profissionais da saúde não estão capacitados para atender a população. As pessoas têm esse estigma: ‘como chama’, ‘é homem?’, ‘é mulher?’, ‘como eu trato?’”, conta Bruna sobre o sistema de saúde da cidade.

DESPATOLOGIZAÇÃO TRANS

Em 1997, o Conselho Federal de Medicina autorizou as chamadas cirurgias de transgenitalização. A partir de 2008, o Sistema Único de Saúde passou a oferecer serviços  para o processo de transição, as chamadas tecnologias biomédicas.

Contudo, para o acesso a tratamento hormonal e cirurgias corporais, o Conselho Federal de Medicina considera pessoas transexuais como portadoras de transtornos psicológicos permanentes de identidade sexual. Além disso, conforme portaria em vigência do Ministério da Saúde, profissionais da psicologia devem fornecer laudos à equipe de atenção especializada no processo transexualizador e terapia compulsória por dois anos.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) já divulgou nota, na qual afirma que “a transexualidade e a travestilidade não constituem condições psicopatológicas“.  Em 2015, o Órgão lançou a Campanha para Despatologização das Transexualidades e Travestilidades. No vídeo, profissionais psicólogos abordam que a transexualidade e a travestilidade não constituem nenhum tipo de transtorno do ponto de vista psíquico.

A relação entre transexuliadade e saúde mental reforça uma ideia errônea, em que condiciona pessoas trans a doentes em âmbito mundial.  A Classificação Internacional das Doenças (CID), estabelecida  pela Organização Mundial da Saúde, apresenta a transexualidade como transtorno de identidade de gênero; já o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) aponta a transexualidade como disforia de gênero. Essas terminologias apoiam a concepção de transexualidade como patologia.

Um fato que pode denunciar essa relação ainda feita entre transexualidade e patologia no sistema público ocorreu durante a produção desta reportagem. Ao procurar a Secretaria de Saúde, a produção foi encaminhada à Coordenação de Saúde Mental do Município. Entretanto, Bruna e Patrícia, enfermeiras residentes em saúde mental, reafirmaram  o posicionamento do CFP. “Não é legal vincular saúde mental a política das minorias, por que corrobora que isso seja uma patologia, o que na verdade não é. Mas uma questão de gênero, uma orientação sexual, pessoal e individual de cada um. Não é o que os estudiosos e as pessoas que trabalham na área da saúde preconizam”, declara Patrícia.

“É bem complicado. Eu tenho, hoje, dois internados.Uma menina que internei em São Francisco de Assis, saiu daqui e perguntou ‘Posso levar minhas maquiagens? Minhas roupas? Minhas coisas?’. Aí eu comuniquei o hospital, como que eu estava internando ela em uma unidade masculina se iria levar vestidos. Então lá a gente teve sérios problemas. Tivemos que pedir alta administrativa, porque foi muito complicado” (Elieze Santos Machado, enfermeira)

Patrícia chama a atenção ainda para a associação entre transexualidade a Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs). Essa preocupação deve-se, por exemplo, ao fato de que a 16º Parada Livre da Região Centro foi realizada por meio da verba destinada a Políticas ligadas ao HIV. “Nós não podemos concordar com essas coisas, com essas patologias, ou então que essa população está vinculada ao HIV”, frisa a enfermeira.

A Parada Livre da Região Centro foi produzida com verbas  ligadas ao HIV por não ter nenhum incentivo por parte de outras instituições e programas. “O que a gente tem são ações pontuais em algumas políticas, por exemplo a política do HIV, que recebe uma verba do Ministério da Saúde para realizar estratégias de redução de danos. A verba anual do Ministério da Saúde é utilizada para fazer essas estratégias e também para a promoção da parada livre do município. O que a gente ainda precisa mesmo é que seja criada uma política LGBT ou alguém que cuidasse das políticas de equidades no município. Que pudesse ter estratégias, programas definidos”, destaca Bruna.

A sociedade passa por um importante momento de visibilidade e representatividade LGBT, mas ainda há um longo caminho a percorrer. E esse caminho deve ser percorrido com muito diálogo,  para assim desconstruir ideias preconceituosas, lutar contra a violência, garantir direitos, igualdade e, acima de tudo, respeito.

[dropshadowbox align=”none” effect=”lifted-both” width=”auto” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]Vídeo: Projeto Transformar (desenvolvido por estudantes de Publicidade e Propaganda do Centro Universitário Franciscano)[/dropshadowbox]

 

Por Deivid Pazatto, Emily Costa, Paola Saldanha, para a disciplina de Jornalismo Investigativo, no segundo semestre de 2017, sob a orientação da professora Carla Torres.

Bandeira do Orgulho Trans (Foto: divulgação)

A cada 25 horas, um LGBT (lésbicas, gays, bissexuais,  transexuais e travestis) é assassinado no Brasil. Os dados alarmantes, fazem do país o campeão mundial de crimes contra as minorias sexuais. O ano de 2016 registrou 343 homicídios contra essa população, que é vítima de LGBTfobia todos os dias. Os dados são do relatório de 2016 do Grupo Gay da Bahia (GGB), a mais antiga associação brasileira de defesa dos direitos LGBT. A pesquisa foi baseada em notícias publicadas na mídia, internet e informações pessoais.

O ano de 2016 foi marcado por várias atrocidades contra os LGBT’s. Em agosto a jovem travesti Brenda, foi espancada e jogada de cima de uma passarela no Pará. Em dezembro, o ambulante Luiz Carlos Ruas, foi assassinado no metrô de São Paulo, quando tentava defender um gay e uma travesti perseguidos por dois lutadores. Também no final do ano, Itaberly Lozano, 17 anos, foi espancado, esfaqueado e carbonizado pela própria mãe.

Essas são algumas das mortes registradas no ano passado. O antropólogo Luis Mott, responsável pelo site “Quem a homofobia matou hoje”, ressalta os números alarmantes, e diz que são apenas a ponta de um iceberg de violência e sangue. “A falta de estatísticas oficiais, diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos, é prova da incompetência e homofobia governamental”.

O relatório divulgado pelo GGB, mostra que 2016 foi o ano mais violento desde a década de 1970. Além de enforcamento, pauladas, apedrejamento, muitas vítimas foram torturadas e  tiveram seus corpos queimados. São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro são os estados que mais mataram LGBT’s no ano passado.


TRANSFOBIA

Apesar de gays corresponderem a 50% das vítimas, quando se trata de vulnerabilidade, travestis e transexuais são as que mais sofrem violência. O GGB afirma que proporcionalmente, essa parte da população são as mais vitimizadas. O risco de travestis e transexuais serem assassinadas, é 14 vezes maior que um homem gay. Uma pesquisa realizada pela rede europeia Transgender Europe (TGEU), confirma que o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo. Só no ano de 2016, foram 144 travestis e transsexuais mortas no país, segundo a Rede Trans Brasil, que faz um monitoramento do número desses homicídios.
Apenas no intervalo de janeiro a maio de 2017, houve 81 assassinatos de pessoas trans no País. O dado é do monitoramento da Rede Trans Brasil. Em fevereiro desse ano, o caso da travesti Dandara chocou o país. O vídeo que ganhou repercussão nas redes sociais mostra a jovem sendo brutalmente assassinada a chutes e pauladas por um grupo de jovens no Ceará.

A exposição a situações de violência física faz parte do cotidiano dessas pessoas. Vezes agredidas, encontram no sistema de saúde e delegacias mais violência, onde não respeitam suas identidades de gênero. A violência verbal não fica apenas nesse meio, permeando também muitos espaços públicos.

Martha Souza, Doutora em Ciência, militante e pesquisadora nas questões de igualdade de gênero, trabalha há mais de 20 anos com travestis e transexuais, além de produzir artigos que abordam a temática. Ela ressalta a forma como essa população é assassinada cruelmente. “Uma morte de travesti, nunca é um tiro, uma facada, são pedaços arrancados”.  Martha, em seu artigo “Violência e sofrimento social no itinerário de travestis de Santa Maria”, publicado em 2015, fez um estudo com 49 travestis, onde todas relataram ter vivenciado agressões físicas e xingamentos, muitos iniciados no contexto familiar.

As histórias de exclusão social e discriminação são reafirmadas a todo instante pela população trans. Após serem expulsas de casa e sofrerem rejeição familiar, resta as travestis e transexuais a busca por um local onde sejam aceitas. Em Santa Maria, o Alojamento Verônica faz o trabalho de abrigar travestis e transexuais na cidade. “O perfil da maioria das trans que chegam até aqui, são meninas que sofreram justamente a rejeição da família”, conta Verônica Oliveira, administradora do local.
O pensionato que tem 10 anos de existência, já abrigou mais de mil travestis e transexuais, segundo Verônica, que também milita pela causa trans. O pensionato funciona como um hotel, onde dispõe de quartos e área de lazer para quem passa por ali.

A dificuldade para encontrar moradia, acaba tornando os pensionatos destinados a pessoas trans, um local exclusivo. Ali se criam novos laços e novas conjunturas de família. As situações de opressão e discriminação, acabam dando espaço a relações de afeto.

Alojamento Verônica abriga travestis e transexuais em Santa Maria (Foto: Juliana Brittes/ LABFEM).

A população trans vivencia a discriminação desde a descoberta da sexualidade, principalmente quando suas mudanças corporais começam a se tornar mais visíveis. A feminilização ou masculinização de seus corpos, no caso de homens trans, acabam afastando essas pessoas do núcleo familiar. A desestabilização com a família e a opressão da sociedade, acabam levando muitas travestis e transexuais ao suicídio.

O despreparo social acaba por marginalizar travestis e transsexuais, o que resulta também no desemprego de pessoas trans. Verônica, dona do pensionato, ressalta o não reconhecimento da identidade de gênero dessa população. “Algumas meninas trabalham de manicure, cabeleireira… muitas acabam trabalhando na noite”. O preconceito ainda é evidente quando transsexuais tentam se candidatar a uma vaga de emprego. Segundo uma estimativa da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), 90% da população trans se prostitui no país.

Martha, que também é professora do Centro Universitário Franciscano (Unifra), relata a  necessidade de pautar questões de gênero em todos ambientes. “A gente precisa se perguntar: quem é que incentiva isso? Somos nós, sociedade, no momento em que não discutimos isso numa escola ou faculdade”.
Os insultos instigados por uma sociedade culturalmente machista, acabam respingando no núcleo escolar. Travestis e transexuais, assim com toda a classe LGBT, acabam sofrendo suas primeiras discriminações ainda na infância. A escola, tem como espaço exercitar a cidadania e reconhecer a igualdade, mas não é o que se vê em muitas instituições.

VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL

A maioria das pessoas trans no Brasil ainda vivem à margem da sociedade, sem acesso à educação, saúde e oportunidade de inclusão no mercado de trabalho. As delegacias especializadas de atendimento à mulher não são  preparadas para casos de violência contra travestis e transsexuais.
Após sofrerem agressões físicas e/ou verbais nas ruas, travestis e transexuais, passam por outras experiências de preconceito. As delegacias, locais onde essas pessoas deveriam ser amparadas, acabam por causar mais discriminação, devido ao despreparo dos “profissionais”.

Não bastasse o preconceito nas delegacias, após sofrerem agressão física nas ruas, travestis e transexuais, muitas vezes, precisam procurar um sistema de saúde, onde novamente sofrem discriminação. Pessoas trans acabam virando motivo de “chacota” nos espaços onde deveriam ser bem tratadas. Além disso, o desrespeito a identidade de gênero e ao nome social é recorrente causando constrangimento por quem passa pelos sistemas de saúde.
A acadêmica de Design de Moda, Maria Eva Bevilaqua, que é transexual, relata o caso de uma amiga que sofreu transfobia na Unidade de Pronto Atendimento de Santa Maria (UPA). “O nome social dela não foi respeitado, sendo tratada a todo instante no masculino”. Maria Eva ainda conta que após dizer que o médico seria filmado – devido péssimo atendimento – o profissional ameaçou não atender a paciente.

Uma das maiores lutas do movimento trans, além do tratamento e respeito à sua identidade de gênero, é o nome social. Em 2016, a então presidenta, Dilma Rousseff, assinou o decreto que permite transexuais e travestis a usarem seu nome social em todos os órgãos públicos. A obtenção da carteirinha social, demanda grande trabalho. São precisos laudos de psicólogos para comprovar para o Estado qual é o seu gênero.
A transfobia pode ser entendida como preconceito, discriminação, ou demais violências contra pessoas em função da sua identidade de gênero. No Brasil não há uma lei federal que ampare as agressões sofridas por essa população . O Projeto de Lei nº 122/2006 (PL 122), apresentado em 2006 na Câmara dos Deputados – que criminaliza a LGBTfobia – encontra-se arquivado no Congresso Nacional.
Estados como Paraíba, Piauí, São Paulo e Sergipe que visam à proteção de trans e homossexuais, contam com delegacias especializadas nesses crimes. Em março de 2017, o governo do Ceará autorizou o atendimento de travestis e transexuais nas delegacias das mulheres do estado. No Rio Grande do Sul, não existem delegacias especializadas em crimes de LGBTfobia.

ENTENDA AS DIFERENÇAS:

Transgênero
O termo é  uma criação social para englobar as travestis e transexuais.

Transexual

A identidade de gênero não corresponde ao sexo biológico. Não há relação direta com orientação sexual. O transexual pode ser tanto homossexual,  heterossexual ou bissexual.
Mulher Trans: biologicamente homem, mas se identifica com o gênero feminino;
Homem Trans: biologicamente mulher, mas se identifica com o gênero masculino.

Travesti
Pessoas que não se reconhecem como homens ou como mulheres, mas como integrantes de um terceiro gênero. Vivenciam e preferem ser tratadas em papéis femininos. Também não há relação com a orientação sexual.

 Reportagem produzida para a disciplina de Jornalismo Especializado III, do Curso de Jornalismo da Unifra, durante o primeiro semestre de 2017. Edição: Professora Carla Simone Doyle Torres.