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Santa Maria, RS, Brazil

Bairro Itararé: nos trilhos da história

Bairro Itararé, em Santa Maria (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)
Bairro Itararé, em Santa Maria (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)

“Tchau na estação quem ainda não deu, não entendeu quem lá vai quem já vem. Triste é sentir virar som de saudade quando vai longe o apito do trem”.  Na canção de Beto Pires é retratada a nostalgia de quem viveu com o som dos trens. A tamanha saudade é uma das características do Itararé – bairro localizado na região nordeste de Santa Maria -, e que possui uma história diferente das outras regiões da cidade: ele surgiu por conta da ferrovia, a VFRGS, Estação Férrea do Rio Grande do Sul.

A estação férrea de Santa Maria da Bocca do Monte, nome original, inaugurada em 1885, deu início ao desenvolvimento do bairro que, no seu começo, abrigou os ferroviários e seus familiares. Contudo, com o fechamento da empresa no ano de 1997, a realidade do local transformou-se, mas sem nunca perder as histórias e memórias de quem um dia já viajou de trem.

De acordo com o Censo de 2010, Itararé abriga mais de 7300 pessoas. Entre os habitantes, encontramos dona Véra, dona Terezinha e seu Selvino que nos ofereceram suas lembranças para reconstituir a história do bairro.

O nascimento

(Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)
Véra Terezinha conta sobre o desenvolvimento do bairro Itararé (Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)

“O Itararé sempre foi um bairro muito tranquilo, caracteristicamente ferroviário. A gente não tinha tanto recurso aqui, mas se dirigia daqui para o centro”, conta a aposentada Véra Terezinha Germani, 68 anos. A professora aposentada, que nasceu e viveu boa parte de sua vida no bairro, comenta que vivenciou de perto a época da ferrovia. “Meu pai não foi ferroviário, mas meu avô e todos os meus tios foram. Todos moravam no Itararé”, completa. Além disso, afirma que grande parte da população era imigrantes ou descendentes. “A vizinhança toda era de ferroviário e a maioria de origem italiana”, aponta.

“Quando eu me mudei para cá, eu não gostava. Hoje eu me enraizei, me sinto muito bem”, relembra Terezinha Borin, 74 anos. Moradora do bairro há mais de 50 anos, a também professora aposentada se mudou para o Itararé em 1964, quado casou com o empresário Nelson Borin. A família Borin possuía um dos principais armazéns da região e fornecia diversas mercadorias para os ferroviários.

(Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)
Terezinha Borin relembra as memórias do bairro (Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)

Dona Terezinha conta que seu marido morou no bairro desde seu nascimento até seu falecimento, em 2014. Borin foi presidente por diversos anos da Associação Amigos do Bairro Itararé, além de promover diversas melhorias na localidade e ser o responsável por trabalhos voluntários, como os papais noéis no período de Natal. “Quem fazia o trabalho de entrevistas e pesquisas sobre o Itararé era meu marido, então eu o acompanhava”, comenta a professora aposentada de educação física.

“Meu monumento estradas e trilhos”*

Vista do Monumento (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)
Vista do Monumento (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)

Em 1935, como uma homenagem do então governador à época, General José Antônio Flores da Cunha, aos trabalhadores das ferroviais, foi inaugurado o Monumento Ferroviário. Ele localiza-se na rua Antônio Dias e quem o visita pode ter uma vista panorâmica da cidade de Santa Maria – ou pelo menos podia, antes dele ser abandonado.

“Uma das coisas marcantes daqui do bairro é o Monumento Ferroviário. O Nelson fez uma campanha muito grande para a restauração do monumento, em 17 de maio de 1975. Até tinha uma escola aqui perto, dos filhos de ferroviários. Os alunos ajudaram na reconstrução”, relembra dona Terezinha.

Monumento dos Ferroviários (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)
Monumento dos Ferroviários (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)

Mais de 40 anos após a reinauguração, o Monumento se encontra abandonado. Com pichações e muita sujeira, até o percurso dos 130 degraus da escadaria foi comprometido. A vista panorâmica que o lugar proporciona foi tomado pelas vegetações. Os moradores da região reclamam do descaso com um patrimônio tão bonito. “Infelizmente, ele está completamente abandonado”, afirma Selvino Luiz Cogo, 70 anos.

A nostalgia 

Seu Selvino Luiz Cogo, morador do bairro há mais de trinta anos, lembra quando chegou no bairro a infraestrutura era diferente dos dias de hoje. “Não existia esgoto ou asfalto”, conta. Contudo, aponta que a ferrovia trouxe grande desenvolvimento e o seu fechamento, no final dos anos de 1990, desestruturou a realidade do Itararé.

“Eu vejo como um bom bairro. Nós temos mercados, farmácias, ambulatório médico”, completa Selvino. “O Itararé é um bairro que até teve uma época que foi chamado de bairro-cidade, porque tinha tudo, como tem até hoje”, sustenta Terezinha. Os moradores observam que antes a região era menos violenta.

Selvino conta que onde hoje é a avenida Assis Brasil, antigamente era onde o trem passava. “O trem subia a avenida Assis Brasil e subia a serra”, complementa. O trem que saia de Santa Maria percorria os trilhos até a cidade de Itararé, em São Paulo – de onde originou o nome do bairro.

Apesar dos moradores reconhecerem que as paisagens culturais do Itararé são únicas, a saudade de um tempo que não volta ainda bate à porta. “A gente sente muita falta dos trens de passageiros. A gente viajava nos trens. Viajava com meus tios, com minha vó, ia para Porto Alegre de trem, trem Húngaro, de Minuano. A gente viveu de perto toda essa realidade”, finaliza dona Véra.

*Música “Santa Maria”, de Beto Pires

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Bairro Itararé, em Santa Maria (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)
Bairro Itararé, em Santa Maria (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)

“Tchau na estação quem ainda não deu, não entendeu quem lá vai quem já vem. Triste é sentir virar som de saudade quando vai longe o apito do trem”.  Na canção de Beto Pires é retratada a nostalgia de quem viveu com o som dos trens. A tamanha saudade é uma das características do Itararé – bairro localizado na região nordeste de Santa Maria -, e que possui uma história diferente das outras regiões da cidade: ele surgiu por conta da ferrovia, a VFRGS, Estação Férrea do Rio Grande do Sul.

A estação férrea de Santa Maria da Bocca do Monte, nome original, inaugurada em 1885, deu início ao desenvolvimento do bairro que, no seu começo, abrigou os ferroviários e seus familiares. Contudo, com o fechamento da empresa no ano de 1997, a realidade do local transformou-se, mas sem nunca perder as histórias e memórias de quem um dia já viajou de trem.

De acordo com o Censo de 2010, Itararé abriga mais de 7300 pessoas. Entre os habitantes, encontramos dona Véra, dona Terezinha e seu Selvino que nos ofereceram suas lembranças para reconstituir a história do bairro.

O nascimento

(Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)
Véra Terezinha conta sobre o desenvolvimento do bairro Itararé (Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)

“O Itararé sempre foi um bairro muito tranquilo, caracteristicamente ferroviário. A gente não tinha tanto recurso aqui, mas se dirigia daqui para o centro”, conta a aposentada Véra Terezinha Germani, 68 anos. A professora aposentada, que nasceu e viveu boa parte de sua vida no bairro, comenta que vivenciou de perto a época da ferrovia. “Meu pai não foi ferroviário, mas meu avô e todos os meus tios foram. Todos moravam no Itararé”, completa. Além disso, afirma que grande parte da população era imigrantes ou descendentes. “A vizinhança toda era de ferroviário e a maioria de origem italiana”, aponta.

“Quando eu me mudei para cá, eu não gostava. Hoje eu me enraizei, me sinto muito bem”, relembra Terezinha Borin, 74 anos. Moradora do bairro há mais de 50 anos, a também professora aposentada se mudou para o Itararé em 1964, quado casou com o empresário Nelson Borin. A família Borin possuía um dos principais armazéns da região e fornecia diversas mercadorias para os ferroviários.

(Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)
Terezinha Borin relembra as memórias do bairro (Foto: Amanda Souza/ Lab. Fotografia e Memória)

Dona Terezinha conta que seu marido morou no bairro desde seu nascimento até seu falecimento, em 2014. Borin foi presidente por diversos anos da Associação Amigos do Bairro Itararé, além de promover diversas melhorias na localidade e ser o responsável por trabalhos voluntários, como os papais noéis no período de Natal. “Quem fazia o trabalho de entrevistas e pesquisas sobre o Itararé era meu marido, então eu o acompanhava”, comenta a professora aposentada de educação física.

“Meu monumento estradas e trilhos”*

Vista do Monumento (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)
Vista do Monumento (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)

Em 1935, como uma homenagem do então governador à época, General José Antônio Flores da Cunha, aos trabalhadores das ferroviais, foi inaugurado o Monumento Ferroviário. Ele localiza-se na rua Antônio Dias e quem o visita pode ter uma vista panorâmica da cidade de Santa Maria – ou pelo menos podia, antes dele ser abandonado.

“Uma das coisas marcantes daqui do bairro é o Monumento Ferroviário. O Nelson fez uma campanha muito grande para a restauração do monumento, em 17 de maio de 1975. Até tinha uma escola aqui perto, dos filhos de ferroviários. Os alunos ajudaram na reconstrução”, relembra dona Terezinha.

Monumento dos Ferroviários (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)
Monumento dos Ferroviários (Foto: Diego Garlet/ Lab. Fotografia e Memória)

Mais de 40 anos após a reinauguração, o Monumento se encontra abandonado. Com pichações e muita sujeira, até o percurso dos 130 degraus da escadaria foi comprometido. A vista panorâmica que o lugar proporciona foi tomado pelas vegetações. Os moradores da região reclamam do descaso com um patrimônio tão bonito. “Infelizmente, ele está completamente abandonado”, afirma Selvino Luiz Cogo, 70 anos.

A nostalgia 

Seu Selvino Luiz Cogo, morador do bairro há mais de trinta anos, lembra quando chegou no bairro a infraestrutura era diferente dos dias de hoje. “Não existia esgoto ou asfalto”, conta. Contudo, aponta que a ferrovia trouxe grande desenvolvimento e o seu fechamento, no final dos anos de 1990, desestruturou a realidade do Itararé.

“Eu vejo como um bom bairro. Nós temos mercados, farmácias, ambulatório médico”, completa Selvino. “O Itararé é um bairro que até teve uma época que foi chamado de bairro-cidade, porque tinha tudo, como tem até hoje”, sustenta Terezinha. Os moradores observam que antes a região era menos violenta.

Selvino conta que onde hoje é a avenida Assis Brasil, antigamente era onde o trem passava. “O trem subia a avenida Assis Brasil e subia a serra”, complementa. O trem que saia de Santa Maria percorria os trilhos até a cidade de Itararé, em São Paulo – de onde originou o nome do bairro.

Apesar dos moradores reconhecerem que as paisagens culturais do Itararé são únicas, a saudade de um tempo que não volta ainda bate à porta. “A gente sente muita falta dos trens de passageiros. A gente viajava nos trens. Viajava com meus tios, com minha vó, ia para Porto Alegre de trem, trem Húngaro, de Minuano. A gente viveu de perto toda essa realidade”, finaliza dona Véra.

*Música “Santa Maria”, de Beto Pires