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redução maioridade penal

Serviço Social e a Redução da Maioridade Penal

Na manhã desta sexta-feira,10, no Salão Azul do Conjunto I do Centro Universitário Franciscano, ocorreu a aula inaugural do curso de Serviço Social. Na oportunidade, o tema Redução da Maioridade Penal e seu impacto para a

Por que o Brasil voltou a discutir a maioridade penal?

Com 42 votos a favor e 17 contra, foi aprovada no dia 31 de março, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/93, que reduz a maioridade penal de

Intervenção teatral abriu o debate (foto por Arcéli Ramos)
Intervenção teatral abriu o debate (Foto: Arcéli Ramos)

Ocorreu na tarde de sábado (23), em Santa Maria, o “Ato contra a redução da maioridade penal”. O Ato estava previsto para ser na Praça Saldanha Marinho mas, em função da chuva, foi transferido para a boate do DCE da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), na rua Professor Braga, 79.

O Teatro do Buraco, composto por Greice Morati, estudante de Relação Públicas na UFSM, e Gelton Quadros, ator, diretor e formado em Teatro pela UFSM, abriram o Ato com uma intervenção teatral: “Você não me conhece?”.

“Você não me conhece?” nos leva para a realidade de um menor de idade, negro, crescido numa família desestruturada, na periferia. O ator interpretou o policial e o menor infrator, contando a história de vida de um negro que veio de um meio criminalizado pela sociedade e todas as barreiras que são impostas a ele. “Eu acredito que o ser humano não nasce ruim, a sociedade torna ele ruim”, comentou Quadros sobre a construção da peça e o roteiro, que foi escrito por ele.

“Tu vai reclamar pra quem? Só que eu precisava comer! Só que os manos aí não deixam. Mano, aí ó! Veio o rancho. Encostam como quem não quer nada e tchau, viram tua marmita. Tu vai reclamar pra quem? A gente aguenta como pode, e foi isso que eu fiz, aguentei, mas a barriga berra! E o frio? Já passou frio? Voltei pra rua, vendi raspadinha, vendi suco no asfalto. Alguém aqui já vendeu suco no asfalto? Eu tinha um trampo massa, vendendo jornal, mas aí chega o filho do dono e vem com ‘quem é esse neguinho aí? Não que eu tenha preconceito, mas tem que ver da onde vem esse tipo de gente!’. Eu tenho a cor do medo, do desassossego, da desconfiança” – o ator traz cenas e diálogos que chocam, fazem refletir sobre o preconceito impregnado na sociedade e a discriminação que nasce com a cor.

Debate fez parte da programação

(Foto por Amanda Souza)
Alice Carvalho, Rafaela Mello e Leandro Sassi (Foto: Amanda Souza)

Após a encenação, Alice Carvalho, estudante de Psicologia e integrante do DCE-Unifra e da Juventude Negra Feminina (JUNF), e Leandro Augusto Sassi, Juiz de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de Santa Maria, participaram de um debate acerca do assunto, mediado por Rafaela da Cruz Mello, da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SM.

O juiz se colocou contra a redução e considera que essa medida é “tratar da consequência e não da causa”. Para ele é dever do Estado e da família garantir à criança e ao adolescente desenvolvimento, saúde, liberdade e educação, segundo o Artigo da Maioridade, número 227. Para Sassi o Estado não consegue arcar com esses deveres nem garantir os direitos do jovem e o pune, então não precisa mais se preocupar. “A problemática do Ato Constitucional da prática de delitos por adolescentes está diretamente ligada à falta de estrutura. Hoje, 57% dos jovens que cometeram delitos pararam de estudar antes dos 14 anos e 8% são analfabetos, então estamos no século 21 com adolescentes analfabetos”, argumenta o juiz. Segundo Sassi fica clara a inter-relação entre a falta de oportunidade com a marginalização desses jovens.

A integrante da JUNF problematizou a questão do genocídio do povo negro. Hoje, para cada jovem branco que morre, temos 18 jovens negros que são mortos. Ela também ressaltou o caso do menino Eduardo de Jesus, 10 anos, que foi morto pela PM no Complexo do Alemão, Rio de Janeiro. “Deveríamos estar discutindo empregabilidade, educação, descriminalização desses grupos, a redução é uma ação violenta do Estado contra a juventude pobre e negra”, disse Alice.

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Público compareceu ao Ato no sábado. (Foto por Arcéli Ramos)

Outras pautas

A legalização da maconha, a guerra às drogas, o preconceito e machismo contra a mulher negra no Brasil também foram pautas do Ato. Geanine Escobar, integrante da JUNF, declamou adaptações de vários poemas sobre juventude, além de outras intervenções artísticas, como a apresentação poética das meninas do Levante Popular da Juventude, e uma apresentação musical do Coletivo de Resistência Artística Periférica (CO-RAP). Este foi um dos vários eventos que os grupos organizadores pretendem realizar na cidade para problematizar os temas e trazer um espaço de reflexão.

Na manhã desta sexta-feira,10, no Salão Azul do Conjunto I do Centro Universitário Franciscano, ocorreu a aula inaugural do curso de Serviço Social. Na oportunidade, o tema Redução da Maioridade Penal e seu impacto para a sociedade foi debatido. Participaram do debate o diretor da CASE ,Robson Zinn, as assistentes sociais Socorro Portollann e Leila Moura.

Socorro Portollann, representante do Cededica (Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente), defende que os jovens de 12 anos já pagam pelos seus atos por meio das medidas sócio educativas. No entendimento da assistente social,  é dessa forma que esses jovens são punidos.

Robson Zinn e Leila Moura comentaram que a entidade abrange cerca de 40 municípios. A assistente social Leila acredita que se aprovada esse projeto, não vai diminuir a criminalidade.

Segundos dados do Programa de Oportunidade e Direitos, com ajuda da Secretária Estadual da Justiça e dos Direitos Humanos, por volta de 65% dos jovens atendidos pela Case saíram trabalhando.

 

Com informações da Assessoria de Comunicação do Centro Universitário Franciscano


Em entrevista com a professora de direito do Centro Universitário Franciscano, Rosane Leal, ela afirma ser contra a Redução da Maioridade Penal. Foto: Bruna Milani
Em entrevista, professora Rosane Leal, do Curso de Direito do Centro Universitário Franciscano, afirma ser contra a redução da maioridade penal (Foto: Bruna Milani)

Maioridade Penal é o assunto que não quer calar. Desde o dia 31 de março, quando a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou a proposta de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, o Brasil não fala de outra coisa. O tema ainda continuará em discussão nos próximos três meses no CCJ e, por todo o país, a sociedade divide-se em opiniões contra e a favor.

A professora Rosane Leal da Silva, do curso de Direito do Centro Universitário Franciscano, defende que a exigência normal para que uma pessoa responda por seus atos é ter 18 anos.  Ela explica que  isto está previsto no artigo 228 da Constituição Federal de 1988 e que aprovar tal proposta é alterar a Carta Magna do Brasil.

Para saber mais sobre o tema, nossa equipe conversou com a professora Rosane:

Agência Central Sul: Quais seriam as consequências sociais, jurídicas e políticas da redução da menoridade penal?

Rosane Leal:  A  pressão política vai gerar o clamor da sociedade por penalizações. Isso se dará por meio do papel simbólico na parte penal, o qual tem a finalidade de responder à sociedade a respeito das ondas de violência. Além disso, sou contra. Reduzir a menoridade penal vai deixar o Brasil na contra mão de outros países.No contexto jurídico, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) traz proteção especial. O Brasil se comprometeu com esses princípios quando estabeleceu o artigo 228 da Constituição Federal, que diz que os menores de 18 anos têm limitações de entendimento. Isso não significa dizer que são irresponsáveis.Essa proposta contraria o ECA e a Constituição.No aspecto sociológico, se formos verificar eles são vitimas do descaso da sociedade e da educação.

Agência Central Sul: Qual seria o impacto para os jovens?

Rosane Leal: O impacto seria maior para os menos favorecidos pela sociedade:  os negros e os pobres. É uma resposta a um segmento da sociedade. Penso que ainda temos uma grande luta para esclarecer a sociedade de que isso não é uma solução, que têm várias falácias associadas à violência proveniente dos jovens. Na verdade, não. Os dados não demostram isso. Tem penas brandas como advertência, prestação de serviço comunitário e liberdade assistida. Mas, para os casos mais graves, existe a internação educacional de três anos na Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (FASE). Às vezes a pena é mais severa para os jovens do que para os adultos. É um equivoco. A criminalidade está muito distante dos dados que apresentam o envolvimento do adolescentes num montante total.

Agência Central Sul: A senhora acredita que a PEC da redução da maioridade penal possa ser aprovada?

Rosane Leal: Receio que sim. Percebo que existe um movimento conservador de direita comprometido com ideais anti-democráticos e que tem muita força política. Vai ser uma briga política.

 

 

 

 

Com 42 votos a favor e 17 contra, foi aprovada no dia 31 de março, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. A proposta será submetida à votação dos deputados e, também terá de ser avaliada pelos senadores.

Embora não tenha se tornado lei, a aprovação na CCJ trouxe de volta um assunto problematizado em 2013, quando Victor, um jovem de 19 anos foi assassinado por outro, de apenas 17, em São Paulo.  Esse assunto começou gerar polêmica já na época desse assassinato, mas esse tema já existia a mais de 20 anos e estava parado, voltando agora a discussão, pois como outros assuntos, ele tem relevância.

O que é a PEC 171/93 e como ela funciona?

O advogado e professor de Direito do Centro Universitário Franciscano Fábio Freitas Dias explica que existem três critérios que sustentam essa medida: político, jurídico e sociológico. Segundo ele,a aprovação da PEC fica a cargo da parte política ” mas sabemos que o PT, o atual partido que governa o Brasil, é historicamente contra essa aprovação, entre outros partidos” relata o professor.Pelo jurídico ela comenta que dificilmente será aprovada. O terceiro critério vem do ponto de vista sociológico, que em relação a sociedade essa nova proposta, se aprovada, prejudicaria uma parte da sociedade que envolve negros e pobres, que não tenham tido um acesso maior ao nível de educação.

“Sob o ponto de vista político, o projeto foi proposto e aprovado, inicialmente, na Comissão de Constituição e Justiça, mas acho que não será aprovado porque essa PEC depende da aprovação dos três quintos e dois turnos  da legislação. Sob o ponto de vista jurídico, sou contrário não só a apresentação, mas ao trâmite. Tudo vai depender se a maioridade penal é pétrea ou não. Na minha visão, ela é pétrea, ou seja, um direito individual, porque representa um limite no poder reformador.  Ainda sob o ponto de vista sociológico, sou contrário  por serem pessoas em desenvolvimento de formação e que precisam de proteção. Não vejo como a redução da maioridade penal possa contribuir para esse desenvolvimento. Colocar essas crianças em um presídio seria uma injustiça”, enfatiza o advogado.

Por que o Brasil voltou a discutir a maioridade penal?

Em 1993, quando o assunto foi colocado em questão pela primeira vez, não foi aprovado do ponto de vista político. “Em 1990, o Brasil determinou que os jovens menores de 18 anos, são pessoas em desenvolvimento.  Além disso, alguns assuntos vão e voltam no Brasil, como no caso do aborto, por exemplo”, destaca Dias.

A coordenadora e professora do curso de Psicologia do Centro Universitário Franciscano, Josiane Abaid, também se posiciona contra a redução da maioridade penal. Ela explica que, do ponto de vista do desenvolvimento da criança e do adolescente, os menores de 18 anos são considerados, legalmente, pessoas em transição, em pleno desenvolvimento moral, portanto, sem capacidade de responder por si. “Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), menores de idade são pessoas que estão em processo de formação de  identidade e personalidade. Em função disso, eles precisam ser orientados antes de tomar suas decisões”, esclarece Josiane.

E continua: “Na maioria das vezes, os adolescentes se submetem sem julgar o que é certo ou errado. Assim, não são capazes de responder pelos atos com maturidade”, argumenta.

Mas, quais seriam as consequências dessa medida?

Reduzir a maioridade penal é acreditar que os adolescentes estejam desenvolvidos em todos os aspectos, a ponto de lidar com as consequências de seus atos, segundo a psicóloga.

Outro ponto negativo da redução da maioridade penal é a convivência de jovens e adultos nas prisões, onde há uma grande probabilidade de aprenderem coisas ruins  se e envolverem em contextos que coloquem eles em risco são maiores. “Eles terão menores chances de solucionar seus problemas, serão rotulados logo no início e tachados, sem nem poder descobrir alternativas para melhorarem”, finaliza.

Segundo o professor Dias, a redução da maioridade penal não diminuirá a criminalidade porque , na maioria das vezes, os crimes praticados por pessoas de 16 anos, não são assassinatos. “Os jovens não devem ser punidos. Devem ser educados. Além disso, caso essa PEC entre em vigor, o Brasil cometerá uma grande injustiça já que colocará pessoas que podem ser educadas, em um presídio onde receberão péssimas influências”, alerta.

O que pensam os santa-marienses sobre o tema?

Nossa equipe perguntou para 20 pessoas se são “a favor” ou “contra” a redução da maioridade penal e o porquê. Dos 20 entrevistados, 14 afirmaram ser contra a redução e a maioria justificou a resposta alegando que o sistema carcerário brasileiro é falido, sem estrutura e com superlotação nos presídios.

Jewison Cabral, 20, denomina os presídios brasileiros como uma “escola do crime”. Maurício Dias, 36, e Pedro Corrêa, 20, chamaram atenção para a proteção legal que o adolescente têm pelo Conselho Tutelar, e que a PEC vai contra as medidas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sendo, então, inconstitucional. As outras seis pessoas que se colocaram a favor da redução alegaram que os jovens devem responder pelos seus crimes e que se um adolescente comete um homicídio ele deve cumprir a pena como adulto.

Embora, as opiniões sejam divergentes, a violência é uma questão fática neste país e deve ser tratada com seriedade, a começar por adotarem medidas protetivas às crianças e adolescentes em vulnerabilidade social, antes que estas vejam no crime e nos maus exemplos as possíveis soluções para os seus problemas.

Por Bruna Bento Milani e Amanda Souza