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Santa Maria, RS, Brazil

Violência contra a mulher: a história de Dona Lívia

Maria da penha (Série de reportagens)-01

Dona Lívia foi encaminhada pela Delegacia de Polícia para Mulher a um abrigo, porque no processo de separação do seu ex-marido abriu mão de tudo. Lívia não sabia da existência da Medida Protetiva e nem onde era a Delegacia da Mulher. “Saí sem destino, fui até o Fórum, e lá me encaminharam para um oficial de justiça, e, por causa das crianças, me passaram direto para o juiz da infância e juventude. Na delegacia da mulher, quando dei parte dele (do então marido), eles me encaminharam para esse abrigo”, relata. Ela deixou tudo para trás e passou a contar com a ajuda das psicólogas, da delegacia e do abrigo onde está.

Cansada das agressões psicológicas frequentes, xingamentos, desmoralização, e do marido sempre muito agressivo, na primeira agressão física, dona Lívia saiu de casa. “Eu não admitia que ele batesse nos meus filhos, pois nem o pai biológico deles (que faleceu) fazia isso. Então, nessa primeira agressão eu saí de casa no mesmo dia”, conta. “Do nada ele ficava brabo, se estressava porque meus filhos pequenos estavam assistindo desenho, começava a gritar e xingar, e eu brigava com ele (o ex-marido). Nunca aceitei que ele falasse nada para minhas crianças e, por isso, as agressões aconteciam.  Eu não queria apanhar e depois ter que inventar desculpas, como a gente vê né… nas novelas, as vítimas dizendo que caíram, que tropeçaram, e eu não quero essa vida pra mim”.

[dropshadowbox align=”center” effect=”lifted-both” width=”450px” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]“Acho que umas 15 vítimas já passaram por aqui. Eu sempre aconselho, conto minha vivência e falo para elas que o agressor não vai mudar”[/dropshadowbox]

A vítima deu queixa de lesão corporal, estava machucada, mas o agressor não foi preso. Ela conta que a delegada explicou que a prisão não pode ser efetivada porque não houve flagrante e ela não tinha testemunhas. A patrulha foi até a casa de Lívia e do agressor. Ele foi levado à delegacia para depor e fazer o registro, mas depois foi liberado. Dona Lívia recebeu uma medida protetiva de 110 metros, que o ex-marido não pode ultrapassar ou chegar perto dela. Ela ouviu de um policial:  “- A gente prende ele… até pode prender ele, mas o juiz vai soltar. É assim”. O ex-marido foi solto, posteriormente. No dia do depoimento, a  patrulha Maria da Penha, para garantir a segurança da vítima, a buscou e levou novamente para casa.

Ela está fora de casa há três meses. No começo Dona Lívia conta que sentia muito medo de que algo acontecesse com ela, de que o agressor aparecesse, mas o suporte no abrigo a ajudaram muito. “Eu fico triste às vezes, quando fico parada ou antes de dormir… penso em tudo que passei, mas no outro dia me distraio, converso com as mulheres, e esqueço, né”. Segundo Lívia, há casos muito difíceis no abrigo, mulheres que quase ficaram paraplégicas de tanto apanhar, filhas abusadas pelo próprio pai. Mas tem vítimas que a dona Lívia consegue ajudar.“Nós conversamos muito, eu e as mulheres nesses três meses. Acho que umas 15 vítimas já passaram por aqui. Eu sempre aconselho, conto minha vivência e falo para elas que o agressor não vai mudar”, diz. “Essas desculpas que a gente ouve, de que o homem bebeu, se drogou, e ficou violento, isso não me convence. Eles batem com força, e ninguém consegue bater com tanta força assim bêbado. Isso é desculpa, não é verdade.  Mas a gente fica muito isolada, as vítimas. Não podemos sair . É para evitar de alguém nos ver e do agressor saber onde estamos. E eu não aguentei ficar muito tempo assim. Arrumei um trabalho, e agora pretendo me mudar”, diz.  [dropshadowbox align=”center” effect=”lifted-both” width=”450px” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ] “Eu não queria apanhar e depois ter que inventar desculpas, como a gente vê nas novelas, as vítimas dizendo que caíram, que tropeçaram, e eu não quero essa vida pra mim!“[/dropshadowbox]

Dona Lívia nunca mais viu o ex-marido. Seus filhos, dois meninos de sete e quatro anos, vão na escola, estudam, e acostumaram a ficar no abrigo. No início, os meninos questionaram a ida para o local protegido, e o porquê não podiam sair dali, mas depois acostumaram. Eles voltaram à ir no colégio e participam de projetos de ensino ali oferecidos. Dona Lívia comenta que encontrou força nos filhos para fazer a ocorrência e sair de casa, pois não queria que eles crescessem num ambiente violento, vendo a mãe apanhar.

No abrigo Dona Lívia é reconhecida pelo seu bom humor e  pela alegria de viver. As vítimas desabafam com ela, que tenta ajudar no que pode. “Nunca esperei por ninguém, sempre corri atrás, trabalhei, fiz qualquer coisa para ganhar dinheiro e cuidar dos meus filhos. Agora consegui um terreno, com a ajuda de uma ONG. Eles me deram todo o material para a construção e eu arrumei alguém para fazer a mãe de obra”.

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Maria da penha (Série de reportagens)-01

Dona Lívia foi encaminhada pela Delegacia de Polícia para Mulher a um abrigo, porque no processo de separação do seu ex-marido abriu mão de tudo. Lívia não sabia da existência da Medida Protetiva e nem onde era a Delegacia da Mulher. “Saí sem destino, fui até o Fórum, e lá me encaminharam para um oficial de justiça, e, por causa das crianças, me passaram direto para o juiz da infância e juventude. Na delegacia da mulher, quando dei parte dele (do então marido), eles me encaminharam para esse abrigo”, relata. Ela deixou tudo para trás e passou a contar com a ajuda das psicólogas, da delegacia e do abrigo onde está.

Cansada das agressões psicológicas frequentes, xingamentos, desmoralização, e do marido sempre muito agressivo, na primeira agressão física, dona Lívia saiu de casa. “Eu não admitia que ele batesse nos meus filhos, pois nem o pai biológico deles (que faleceu) fazia isso. Então, nessa primeira agressão eu saí de casa no mesmo dia”, conta. “Do nada ele ficava brabo, se estressava porque meus filhos pequenos estavam assistindo desenho, começava a gritar e xingar, e eu brigava com ele (o ex-marido). Nunca aceitei que ele falasse nada para minhas crianças e, por isso, as agressões aconteciam.  Eu não queria apanhar e depois ter que inventar desculpas, como a gente vê né… nas novelas, as vítimas dizendo que caíram, que tropeçaram, e eu não quero essa vida pra mim”.

[dropshadowbox align=”center” effect=”lifted-both” width=”450px” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ]“Acho que umas 15 vítimas já passaram por aqui. Eu sempre aconselho, conto minha vivência e falo para elas que o agressor não vai mudar”[/dropshadowbox]

A vítima deu queixa de lesão corporal, estava machucada, mas o agressor não foi preso. Ela conta que a delegada explicou que a prisão não pode ser efetivada porque não houve flagrante e ela não tinha testemunhas. A patrulha foi até a casa de Lívia e do agressor. Ele foi levado à delegacia para depor e fazer o registro, mas depois foi liberado. Dona Lívia recebeu uma medida protetiva de 110 metros, que o ex-marido não pode ultrapassar ou chegar perto dela. Ela ouviu de um policial:  “- A gente prende ele… até pode prender ele, mas o juiz vai soltar. É assim”. O ex-marido foi solto, posteriormente. No dia do depoimento, a  patrulha Maria da Penha, para garantir a segurança da vítima, a buscou e levou novamente para casa.

Ela está fora de casa há três meses. No começo Dona Lívia conta que sentia muito medo de que algo acontecesse com ela, de que o agressor aparecesse, mas o suporte no abrigo a ajudaram muito. “Eu fico triste às vezes, quando fico parada ou antes de dormir… penso em tudo que passei, mas no outro dia me distraio, converso com as mulheres, e esqueço, né”. Segundo Lívia, há casos muito difíceis no abrigo, mulheres que quase ficaram paraplégicas de tanto apanhar, filhas abusadas pelo próprio pai. Mas tem vítimas que a dona Lívia consegue ajudar.“Nós conversamos muito, eu e as mulheres nesses três meses. Acho que umas 15 vítimas já passaram por aqui. Eu sempre aconselho, conto minha vivência e falo para elas que o agressor não vai mudar”, diz. “Essas desculpas que a gente ouve, de que o homem bebeu, se drogou, e ficou violento, isso não me convence. Eles batem com força, e ninguém consegue bater com tanta força assim bêbado. Isso é desculpa, não é verdade.  Mas a gente fica muito isolada, as vítimas. Não podemos sair . É para evitar de alguém nos ver e do agressor saber onde estamos. E eu não aguentei ficar muito tempo assim. Arrumei um trabalho, e agora pretendo me mudar”, diz.  [dropshadowbox align=”center” effect=”lifted-both” width=”450px” height=”” background_color=”#ffffff” border_width=”1″ border_color=”#dddddd” ] “Eu não queria apanhar e depois ter que inventar desculpas, como a gente vê nas novelas, as vítimas dizendo que caíram, que tropeçaram, e eu não quero essa vida pra mim!“[/dropshadowbox]

Dona Lívia nunca mais viu o ex-marido. Seus filhos, dois meninos de sete e quatro anos, vão na escola, estudam, e acostumaram a ficar no abrigo. No início, os meninos questionaram a ida para o local protegido, e o porquê não podiam sair dali, mas depois acostumaram. Eles voltaram à ir no colégio e participam de projetos de ensino ali oferecidos. Dona Lívia comenta que encontrou força nos filhos para fazer a ocorrência e sair de casa, pois não queria que eles crescessem num ambiente violento, vendo a mãe apanhar.

No abrigo Dona Lívia é reconhecida pelo seu bom humor e  pela alegria de viver. As vítimas desabafam com ela, que tenta ajudar no que pode. “Nunca esperei por ninguém, sempre corri atrás, trabalhei, fiz qualquer coisa para ganhar dinheiro e cuidar dos meus filhos. Agora consegui um terreno, com a ajuda de uma ONG. Eles me deram todo o material para a construção e eu arrumei alguém para fazer a mãe de obra”.