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Matheus Colvero do Prado

“O cinema é mágico” e “a magia do cinema” são frases que podem parecer iguais, mas com um pouco de lógica podemos ver que não existe nada de parecido entre elas.

Quando Georges Méliès apresentou ao mundo do audiovisual suas contribuições mágicas, a população começou a se apaixonar pela capacidade do cinema em criar novos mundos através de efeitos especiais e técnicas de ilusão visual. As pessoas começaram a sonhar com as possibilidades de serem enganadas através da telona, mas não “enganadas” no sentido de serem trapaceadas sem  consenso, mas de serem convidadas a se deixar levar através daqueles outros mundos projetados na tela.

Nós pagamos para sermos enganados. Nós queremos mergulhar naquele oceano de ideias que nos espera do outro lado da tela. Muitos não tam essa consciência, mas todos a sentem, por isso que entramos no cinema – para nos deixarmos levar seja por uma boa história de amor ou por um suspense policial, desde que sejam construídos com verossimilhança.

Magia é atualmente um conceito ficcional que existe dentro de histórias fantásticas em diversas mídias, praticado por magos e seus cajados, num sistema ritualístico baseado em fé e crenças em divindades superiores, conhecidas por leitores de fantasia, jogadores de RPG, cinéfilos e jogadores de videogame, a palavra se espalhou pelo imaginário popular ao longo dos anos.

Enquanto a palavra “magia” se disseminou no mundo todo, com várias interpretações sobre o seu significado, outro conceito parece ter ficado um pouco de lado, a “mágica”. Mágicos existiram sempre no nosso planeta, porém eles parecem fadados ao esquecimento, ou serem (hoje em dia) confundidos com magos e qualquer palavra que seja relacionada a crenças em forças absurdas.

O cinema, assim como a mágica, é feito por truques, ilusões, atos, construções de conceitos que você pode descontruir ao longo de uma narrativa audiovisual. Todo mágico constrói seus truques a partir de ferramentas naturais que nos enganam de uma maneira muito elegante, sem nem ao menos percebermos que somos enganados. Esta é a beleza que o cinema e a mágica compartilham.

O diretor, assim como o mágico, tende a ser o maestro dessa orquestra (todo o restante da equipe por trás de uma produção audiovisual). Um filme é um ato de mágica, onde não existe apenas um mágico (o diretor), mas toda uma equipe de pessoas (atores, compositores, designers de produção e de som, diretores de fotografia, roteiristas e etc…) que trabalham em conjunto para nos apresentar uma obra repleta de significados que à primeira vista nos foge aos olhos, mas se pararmos para uma revisita e prestarmos bastante atenção, podemos ver inúmeros detalhes que não havíamos visto anteriormente.

Não aceito a dublagem ou spoilers (informações essenciais de um filme) pela mesma razão que não acredito na “magia” do cinema, mas sim na Mágica que todos os realizadores de uma obra íntegra constroem e nos entregam após meses ou anos de trabalho. Espectadores devem respeitar a obra que pagaram para olhar e, principalmente, exigirem respeito para com suas experiências subjetivas e objetivas ao apreciarem um bom cinema, lembrando com carinho que um bom mágico nunca revela seus truques.

 O filme 1984 é uma adaptação do livro homônimo escrito por Eric Arthur Blair, mais conhecido pelo seu pseudônimo, George Orwell. O longa-metragem foi realizado no mesmo ano do título da ficção, dirigido por Michael Radford, o elenco conta com a presença do ator John Hurt e Suzanna Hamilton, que interpretam o casal que se envolve romanticamente em um mundo onde o sexo e outros prazeres são considerados crime para o Estado que governa o mundo.

A imagem de poder no filme é representada pelo ditador onipresente chamado de Grande Irmão, que, através de câmeras em vários pontos escondidos da cidade, observa a tudo e a todos, sempre na tentativa de manter a ordem.

Muitas pessoas defendem que uma boa ficção-científica deve ser um retrato filosófico sobre a sociedade de sua época. Neste caso, tanto o livro quanto o filme conseguem estabelecer um questionamento rico e engajado sobre a sociedade em que o autor se encontrava. O livro foi escrito em 1948, numa Inglaterra pós-Segunda Guerra Mundial.

Não precisa muito para perceber as relações do mundo criado por Orwell com a realidade em que ele vivia, pois a sua obra representava um reflexo cruel de uma época em que a inocência havia sido perdida, o país estava numa miséria, o que refletia em seu povo. Não é a toa que os crimes da história sejam coisas simples, como tráfico de chocolate, geleia, comidas, necessidades humanas, que muitas vezes eram luxo para várias pessoas desse contexto histórico.

A ciência do filme é usada exclusivamente para dominar a sociedade. Qualquer avanço científico é usado pelo Estado para estabelecer mais e mais o contexto totalitário da obra, câmeras são usadas para observar o povo, as pessoas trabalham em fábricas que constroem bombas, toda forma de conhecimento é usada para manipular e condicionar a população. É o Totalitarismo em sua forma mais cruel.

Até o alfabeto é encarado como um problema no filme. Dentro do universo criado pelo autor, existem profissionais que estudam um método de diminuir o número de letras apenas para vogais, para que as pessoas não possam se entender, e se elas não se entendem, não podem planejar, conversar, e principalmente, conspirar.

Em um determinado momento no filme, o casal de protagonistas se encontram secretamente em uma sala onde eles fazem planos, discutem suas necessidades,  encontram livros antigos, proibidos, uma série de materiais que eles aprendem a usar e a ler. Materiais que trazem o maior de todos os crimes, o conhecimento.

Tanto o autor como  o diretor criaram algo muito ousado em termos científicos. Toda a ciência é referida de maneira mais caricata do que realista, mas nunca soa falsa, sempre aparece de maneira orgânico. O universo diegético do filme convence graças à forma com que o diretor explora os conceitos do livro.

Talvez o conceito mais interessante criado por Orwell (e explorado com muita eficácia no filme) seja o do Grande Irmão. Ele surge praticamente como uma entidade, com um rosto humano dentro de uma tela de televisão. Talvez essa seja a crítica mais assustadora e genial que ele tenha pensado, principalmente devido ao contexto em que ele se encontrava.

Não é difícil pensar em metáforas para o Grande Irmão. Ele pode ser visto como um aviso do autor sobre a nossa atual mídia, pois ao longo dos anos um dos crimes da obra de Orwell se tornou uma das moedas de troca mais importantes no nosso mundo globalizado, a informação.

Eu acreditava que o programa mais irônico da Rede Globo era justamente o Big Brother Brasil, mas eis que surge Na Moral, onde o ex-apresentador do “BBB”, Pedro Bial, comanda todas as semanas uma discussão sobre assuntos polêmicos. No segundo episódio do programa, Bial discute (ou pelo menos finge discutir) a invasão de privacidade que algumas pessoas “comuns” e “celebridades” sofrem – desde uma professora que instala câmeras de vigilância numa escola particular até atores globais que sofrem perseguições constantes de paparazzi. Mas a todo instante em que o programa parecia se dirigir para uma discussão calcada na razão e nas argumentações, o apresentador fazia questão de manter a polêmica e se desviar de questionamentos que realmente poderiam fazer alguma diferença para este assunto. Assim, o Grande Irmão existe, não da maneira caricata e totalitária que Orwell imaginava (pelo menos por enquanto), mas de uma maneira “idiocrata”.

A televisão que poderia nos ensinar a criticar com argumentos os nossos governantes, acaba por nos confundir e nos desinformar. Em tempos de “BBB” e Na Moral, as pessoas deveriam ler ou olhar o filme 1984 para, pelo menos, terem uma noção de onde vieram as origens de algumas ideias e títulos da nossa programação de TV aberta.

Matheus C. do Prado é acadêmico do curso de Jornalismo da Unifra.

É impressionante e assustadora a quantidade de filmes dublados distribuídos nos cinemas do país.

Após a estreia do filme “O Planeta dos Macacos – A origem”, que contava com mais cópias dubladas do que legendadas, a situação ficou ainda mais complicada.  O que as distribuidoras e o próprio público não percebem é existir um descaso em relação ao cinema em si.

A dublagem desconsidera todo um trabalho de composição do ator que, muitas vezes, treina a própria voz para encarnar com mais naturalidade algum personagem.  Atualmente é comum esse nível de comprometimento com o trabalho de ator e parece que muitas pessoas não respeitam tal esforço. Ao assistirem um filme dublado, uma boa parte deste processo se perde e, muitas vezes, a dublagem acaba por prejudicar os efeitos sonoros da produção como um todo.

Existem casos menos graves como o de algumas animações que são vistas por muitas crianças que não conseguem acompanhar as legendas. Nestes casos é até compreensível, porém, não devem ser definitivas. As crianças devem ser ensinadas sobre a importância da leitura, tanto na literatura quanto no cinema. Qualquer pessoa que tenha o hábito de ler, não terá trabalho ao acompanhar as legendas de um filme.

Quem tem condições de ir até um cinema, pode muito bem ter condições de ler uma legenda. Fato é que muitas pessoas estão cada vez mais conformadas com a dublagem. Muitas não entendem que, ao olharem um filme dublado, elas não só prejudicam a sua própria experiência audiovisual como também menosprezam o trabalho de profissionais que se esforçaram para criar uma atmosfera dentro do filme.

Deveria ser inaceitável o aumento de filmes dublados nas salas de cinema do país. Todo público assíduo dos cinemas deveria reclamar com o cinema da sua cidade sobre esse problema. Tudo bem se um filme vem com cópias dubladas, mas as pessoas deveriam ter no mínimo a escolha de acompanhar o filme dublado ou legendado.

Matheus Prado é acadêmico do 6º semestre  no curso de Jornalismo da Unifra.