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Opinião

Saudades de mim

Lembra quando a gente achou que passaríamos 15 dias em casa dividindo os dias entre pães gostosos, livros que estavam há anos esperando uma chance e horas a fio com os olhos pregados em uma série

Competências emocionais para enfrentamento da pandemia

Viver nesse período de pandemia com as medidas protetivas incorporadas no nosso cotidiano tem sido um desafio. Parece que alguns hábitos são mais fáceis de serem absorvidos; o uso da máscara sempre, a higienização constante das

O pior inimigo

Quando penso em inimigos, em especial nas nefastas circunstâncias que estamos (e até mesmo fomos impostos), lembro de uma passagem de “Assim Falou Zaratustra”, de Nietzsche. Na descrição exausta do Zoroastrismo, é dito: Mas o pior

Superação e Terra Vermelha

De longa data, vejo o passar do tempo como uma elipse de 24h. Só que, ao invés de um dia, refere-se a anos. A paixão pelo esporte, em específico ao tênis, é de tempos distantes. Algo

Pandemia transformou a convivência familiar

O ano é 2019, mês de dezembro. Na televisão, notícias vindas da cidade de Wuhan, na China, relatavam o surgimento de um vírus que afetava os pulmões, causava pneumonia e, inevitavelmente, causava a morte. O que

Saudade da roda de chimarrão

A pandemia exigiu de nós transformações em todos os aspectos da vida. No âmbito profissional, foi preciso adaptar-se a novas rotinas; na vida diária, adquirimos hábitos que permanecem nossos grandes aliados em 2021: etiqueta respiratória, higiene

Abracadabra!

Há um ano fechei o consultório e imaginei: por três semanas? um ou dois meses? Tantas incertezas, inseguranças, desconhecimento do entorno e do que ainda estava por vir. Muita coisa a pensar, aguardar, aprender, surpreender. A

Ajudar os necessitados tem nos ajudado a seguir em frente

O ano de 2020 foi uma realidade nova, uma pandemia nunca antes vivida, uma necessidade de afastamento social e novas medidas a serem incorporadas. Aprendemos rápido a usar máscaras, álcool gel, não abraçar mais, não aglomerar.

“Notícias ambientais” e depois?

Alice Dutra Balbé Há muito pouco tempo dizia-se que a pauta ambiental não era notícia no quotidiano. As razões para isso são várias e a primeira é categorização de uma pauta “ambiental” em uma seção separada

Quando acordei não sabia que isso iria acontecer

Existe a beleza dos dias planejados, as tarefas completas, a via sem trânsito, janta na mesa e o banho antes de deitar. Um alívio em não esbarrar em contratempos. E os dias passam e passam e

Imagem: pexels

Lembra quando a gente achou que passaríamos 15 dias em casa dividindo os dias entre pães gostosos, livros que estavam há anos esperando uma chance e horas a fio com os olhos pregados em uma série qualquer? Lembra quando achamos que seria incrível trabalhar de casa, sem precisar acordar tão cedo para enfrentar o trânsito e livres para usar calças de pijama durante reuniões? 

Mas aquela ilusão de duas semanas se aproxima da marca de 500 mil mortos e  500 dias de isolamento (sem previsão de acabar) e estamos longe de conhecer todos os impactos que essa história terá em nosso futuro, além da óbvia saudade dos que partiram e de quem éramos.

Isolamento social parecia uma experiência que nos levaria de volta a nós mesmos, conectados ao que realmente gostávamos de fazer quando acompanhados de apenas nós mesmo ou das pessoas que vivem conosco. Parecia que seria possível isolar o enfrentamento a pandemia, as máscaras, o álcool em gel e “todos os protocolos de segurança” do lado de fora de casa. Aqui dentro ficaríamos acompanhados das calças de pijama, café quente, pão novo feito em casa, animais de estimação, plantas e pequenos ritos de autocuidado que salvaguardam a sanidade. Não que as expectativas de enfrentar 15 dias de pandemia (ô dó) fossem leves e positivas, havia muito medo e receio do que estava por vir,  mas nós éramos nós mesmos e usamos a memória do que conhecemos como um apoio para aguentar. E agora que quase não nos reconhecemos mais? 

É curioso visitar as memórias das primeiras semanas de isolamento e não conseguir se reconhecer naquilo que esperamos (re)encontrar quando o mundo puder ver a covid-19 como uma crise superada. As rotinas mudaram, as relações não são mais as mesmas, adaptamos o jeito de trabalhar e estudar e inventamos outras formas de celebrar os dias felizes. Diariamente chegam as notificações das redes sociais, “neste dia há 2 anos”, e tanta coisa mudou que é recorrente pensar “que saudades de mim”. 

Que saudades da energia que a gente tinha. Que saudades de mim num bar, que saudades de mim batendo perna por aí, que saudades de mim quando usava maquiagem de festa, que saudades de mim abraçando tanta gente. Que saudades da gente saudável na rua, na praia, nas salas de aula, dançando nas festas e na vida. 

Arcéli Ramos é jornalista, egressa do curso de Jornalismo da UFN e colaboradora da CentralSul.

Viver nesse período de pandemia com as medidas protetivas incorporadas no nosso cotidiano tem sido um desafio. Parece que alguns hábitos são mais fáceis de serem absorvidos; o uso da máscara sempre, a higienização constante das mãos e a tecnologia mediando nossas atividades profissionais. O mais difícil, na minha vida, foi enfrentar o distanciamento familiar, social, dos meus alunos e colegas. Afinal, eu gosto de gente, do convívio, do afeto e da sensibilidade de saber estar junto, com diferenças e afinidades, mas junto.
Então, surgiu o meu desafio de enfrentamento da pandemia. Obviamente, em primeiro lugar, preservar a saúde, não me contaminar nem a minha, familiar nem tão pouco o coletivo, mas cultivando um mínimo de alegria, de felicidade e esperança no futuro. Preciso dessa esperança, sou virginiana, gosto de planejamento, de organização, de metas e como lidar com essa imprevisibilidade.
Foi um mergulho interior, de solidão, meus três filhos são casados e têm suas famílias constituídas. Busquei competências emocionais para dar suporte aos longos dias e intermináveis finais de semana. Para tanto, pedi ajuda a livros, músicas, filmes, culinária, trabalhos manuais, orações e o que foi fundamental – um olhar atento ao próximo, aos mais necessitados e fazer minha parte para minimizar tanto sofrimento . Estender a mão para quem precisa é transformador.
Agora, com as duas doses da vacina no braço, sem pressa, percebo que os movimentos da vida começam a florescer. Noticias de Nova York contam da vida voltando ao normal. E me dou conta que esse momento foi realmente transformador.
A leitura do livro Longe da Árvore, Pais, filhos e a busca da identidade, de Andrew Solomon, aborda exatamente esse entendimento emocional de conviver com a diversidade de momentos, de épocas e de gente. Conviver com a frustração. O livro resgata o fortalecimento de laços afetivos entre as famílias com crianças especiais, que nasceram longe da árvore, ou seja, não são como diz o ditado; A fruta não cai longe do pé. Cai sim….e aprende-se com as diferenças.
Nesse sentido, a cultura da pandemia tem efeitos. Afinal, cultura é tudo aquilo que a gente se lembra após ter esquecido o que leu. E ela revela-se no modo de falar, de sentar, de ler um texto , de comer , de olhar o mundo. É uma atitude que se aperfeiçoa com a arte. Entendo, que cultura não é aquilo que entra pelos olhos, é o que modifica o nosso olhar. (João Paulo Paes, 1926-1998).
Sim, 15 meses de distanciamento social modificou meu olhar. Exigiu competências emocionais que desconhecia. Mergulhei no meu íntimo, tive perdas e tive ganhos e tenho renovadas esperanças, tipo o Dom Quixote, quando ele diz: Sabe, Sancho, todas essas tempestades que acontecem conosco são sinais de que em breve o tempo se acalmara; por que não é possível que o bem e o mal durem para sempre, e segue-se que, havendo o mal durado muito tempo, o bem deve estar por perto.  Tomara…

 

Por Sibila Rocha
Jornalista , Professora da UFN cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda

Quando penso em inimigos, em especial nas nefastas circunstâncias que estamos (e até mesmo fomos impostos), lembro de uma passagem de “Assim Falou Zaratustra”, de Nietzsche. Na descrição exausta do Zoroastrismo, é dito:
Mas o pior inimigo que podes encontrar será sempre tu mesmo; espreitas a ti mesmo nas cavernas e florestas.
 Ó solitário, tu percorres o caminho para ti mesmo! E teu caminho passa diante de ti mesmo e dos teus sete demônios!
A passagem, que provoca uma reflexão e ação sobre a nossa própria conduta no mundo, sobre a nossa existência e a relevância da alma para progredir, encontramo-nos abruptamente com o nosso pior inimigo: nós mesmos.
O efeito lupa da pandemia, que fez com que parte de nós trabalhássemos de casa, sentados na cadeira, olhos cansados na tela e dedos beirando à loucura do ato de digitar, encontramo-nos, mesmo que rodeados, com nós mesmos.
É como se tivéssemos um espelho de altura e largura imensuráveis em nossa frente: ao fixarmos o olhar, o reflexo põe-se a devolver, indiscretamente, a contemplação.
Quem somos?
É a pergunta hermética cravada em cada canto que a mente alcança. Quem nós somos quando vejo a minha espécie não fazendo jus à tradicional distinção entre racionalidade e irracionalidade?
É ubíquo o sentimento de tristeza ao vermos aglomerações, festas clandestinas, a máxima irresponsabilidade para com o outro?
Ponho-me novamente a pensar, quase na lógica de Zaratustra: é verídico que a linha que me diferencia minha espécie é uma suposta racionalidade autodenominada?
Minha alma e meu espírito se entristecem, de tal forma que o próprio ato de esperança, ação e reforma sociais, frente ao inimigo biológico, acaba no estado diminuto. Um choro preso, sufocado, sem esperança ou mesmo vontade.
Minha mente torna-se errática: então, somos racionais ou não?
A prova se concretiza: não sou capaz de vencer meus impulsos primários para o bem-comum?
De que sou feito, então?
Žižek, filósofo esloveno, dá-nos, talvez, um possível caminhos para as inquietações. Segundo ele, o que fornece concreto para a ação não é mais uma resposta simples. É, então, a capacidade de fazermos perguntas que não fazíamos antes.
A pergunta que talvez devêssemos fazer para a ação necessária ao vencimento do obstáculo atual é: quem é nosso pior inimigo?

 

 

 

Por Erick Kader Callegaro Correa, coordenador do curso de Letras da UFN.

Foto de cottonbro no Pexels

De longa data, vejo o passar do tempo como uma elipse de 24h. Só que, ao invés de um dia, refere-se a anos. A paixão pelo esporte, em específico ao tênis, é de tempos distantes. Algo que perpassava o deslumbrar dos jogos de Roland Garros e levava-me a entrar dentro de quadra, a ponto de me sentir um Nadal da vida, deslizando sobre o saibro. Difícil um jovem que já foi atleta não ter tido um ídolo para se inspirar. Nadal sempre foi mais que um jogador… um herói, dono de batalhas dentro e fora de quadra, contra adversários físicos e psicológicos. Superação… acredito que possa definir a admiração e o deslumbre acerca do atleta, não só pelo seu jogo, mas por me espelhar nele.

Recordo-me, como se fosse hoje, eu entrando em quadra, fardado de Babolat com a mesma Aero do espanhol, só que na mão direita. Batida no tênis antes do saque e dedos contorcidos antes do disparo. Calos nas mãos e a superstição em quadra, de frente com os passos, posicionamento e o pique da bola. Porém, assim como Nadal, meu adversário não era meu único obstáculo no momento do jogo. Uma das coisas mais complicadas que vivi para aprender a controlar, foram as enxurradas de pensamentos e auto menosprezo, independente de quem estivesse do outro lado da rede. Uma crença que me colocava abaixo, fazia sentir compaixão pelo adversário ao vê-lo triste, o que consequentemente me fazia entregar pontos de graça, para sua felicidade e que, posteriormente, me fariam perder o jogo. É claro que não queria entregar a partida, mas quando o adversário volta pro jogo, ele não terá o mesmo dó de você, eu garanto. Só sabia me sentir mal… com o público esperando algo diferente e a seriedade no rosto de meus pais. Não pela derrota, mas por saber o que passava na minha cabeça. Talvez me faltasse um pouco de ambição… espírito competitivo e autoconfiança, e saber que inimigos só existem dentro da quadra.

Ahh aquele cheiro de terra molhada, chão batido. As canelas e joelhos ardiam, e a terra voava com o vento, a qual fazia jus ao nome de “pé-vermelho”, remetendo ao lugar de onde vim. Sentia-me em casa. Pena que a mente ainda não era 100% minha. Por mais que a concentração existisse, um pensamento levava ao outro. Era um dominó. Além da compaixão pelo oponente, por melhor que eu pudesse ser, por mais torneios vencidos, eu estava por baixo, para mim é claro. Custou trabalhar esta maneira de ver as coisas, pois era uma crença individual, nada que fosse realidade para as outras pessoas. Para quem ouve, pode parecer tranquilo, mas só quem sentiu sabe o quão massacrante a fila de obsessões e falsas crenças perturbam nos momentos mais importantes da vida, seja no esporte, jornada profissional ou pessoal. Ainda não me sentia um Nadal… por mais que o TOC e as superstições viessem à tona, carregadas de um perfeccionismo sem limites ao colocar e tirar os pés do saibro, me faltava a seriedade em tentar me enxergar como o melhor naquele esporte, ao menos, uma vez na vida. Valorizar cada saque e procurar ver os pontos bons que eu fazia. É lógico que hoje sou outro. A superação falou mais alto e o sofrimento se transformou em aprendizado. Sim, aquele garoto da Aero amarela, de 9 anos, conseguiu se moldar dentro das quadras. Aprendizado que o tênis me proporcionou, e a quem sou extremamente grato por me ter levado ao autoconhecimento.

 

Produção feita na disciplina de Jornalismo Esportivo, durante o primeiro semestre de 2021, sob coordenação da professora Glaíse Bohrer Palma.

O ano é 2019, mês de dezembro. Na televisão, notícias vindas da cidade de Wuhan, na China, relatavam o surgimento de um vírus que afetava os pulmões, causava pneumonia e, inevitavelmente, causava a morte. O que se via eram pessoas caídas na rua sem que ninguém se atrevesse a chegar perto para prestar socorro. Mas isso é lá na China, uma realidade tão distante de nós. Na China, acontecem coisas estranhas, eu pensava.

Em fevereiro de 2020, é registrado o primeiro caso de covid no Brasil. A partir daí, a contaminação se espalhou rapidamente por todo o país. Primeiro, ficamos sabendo de casos nos grandes centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, mas não tardou até aparecerem e se disseminarem casos em Santa Maria.

Como não havia muito conhecimento sobre o vírus e a doença causada por ele, fui dispensada do trabalho, juntamente com meus colegas. Ficar em casa sem saber o que estava por vir foi angustiante. E era preciso ficar, de fato, em casa, sair o mínimo possível, como é até hoje. Eu sentia medo de ir ao supermercado, à farmácia, ou seja, medo de desempenhar as atividades corriqueiras fora de casa. Depois, com mais conhecimento sobre o vírus, pude voltar ao trabalho, o que amenizou o medo e trouxe a falsa sensação de normalidade.

O mais difícil foi e está sendo ficar longe da minha família, que é bem numerosa e bastante unida. Sinto falta da convivência com minha mãe, que já tem idade avançada, e com meus irmãos e irmãs e sobrinhos e sobrinhas… Com todos eles, eu costumava me reunir com frequência, mas agora são apenas encontros rápidos e, literalmente, distantes, sem abraço, sem junção, sem caipirinha no mesmo copo, sem chimarrão.

Apesar de todas as coisas ruins que a pandemia trouxe: mortes, desemprego, fome, insegurança, saudade, teve o lado positivo, mas, infelizmente, para uma pequena parcela da população, na qual me incluo. Tive a oportunidade de aprender muito, principalmente no que se refere aos aspectos tecnológicos. Foi possível fazer cursos de forma on-line, seguir com o curso de Biblioteconomia, que faço na modalidade a distância, participar de reuniões por videoconferência, ou seja, as atividades profissionais, depois de um tempo, e acadêmicas seguiram normalmente, apesar das adaptações.

Ainda vivemos tempos de incertezas e de medo, mas, com a chegada da vacina, mesmo que de forma lenta, no Brasil, a esperança em dias melhores está renascendo.

 

 

Por Janette Mariano Godois, professora de Letras, atua no  Setor de Aquisição da Biblioteca da UFN

 

A pandemia exigiu de nós transformações em todos os aspectos da vida. No âmbito profissional, foi preciso adaptar-se a novas rotinas; na vida diária, adquirimos hábitos que permanecem nossos grandes aliados em 2021: etiqueta respiratória, higiene das mãos (e de tudo que entra em nossa casa), uso de máscaras cada vez mais específicas e o convívio com aquela dúvida frequente, especialmente para quem mora no Sul: será que é Covid ou rinite?

Daqueles primeiros meses de 2020, em que pouco sabíamos sobre o vírus e a perspectiva de um fim que nunca chega, continuamos mantendo os devidos cuidados, especialmente com aqueles que mais amamos e que, no princípio de tudo, eram os que mais careciam de cuidados: nossos pais e avós.

Pode até parecer bobagem, mas não existe saudade maior do que a roda de chimarrão com o pai e a mãe. Quem é gaúcho sabe bem do que eu estou falando, e sei também que famílias de outros estados e países cultivam suas próprias tradições e culturas, seja na elaboração de um prato, ritual ou outro momento familiar partilhado. Nas poucas ocasiões em que estivemos juntos desde o ano passado, matei essa sede tomando um mate que meu pai fez para mim enquanto eles tomavam chimarrão em outra cuia. Mas “bah”, como dizem por aqui, com o preço da erva mate, isso é quase um luxo.

Aliás, luxo mesmo é ter todos os familiares vivos e saudáveis em dias tão difíceis. Se estão vacinados, já é possível vislumbrar um horizonte mais animador, em que poderemos estar novamente reunidos numa roda de conversa, reclamando de quem meche na bomba, perguntando qual a erva desse chimarrão ou falando do porongo bom que fez aquela cuia.

Enquanto isso ainda não é possível, nosso elo fica ainda mais forte por conta da filhota de quase quatro anos que, no começo de tudo, saiu da escola para preservar o que há de mais valioso nesse mundo: o contato, o colo e o carinho dos avós. É ela que leva até eles o nosso amor mais profundo, é ela que traz da casa deles o cheirinho, a sacola cheia de comidinhas gostosas e o cuidado que, mesmo à distância, só pai e mãe conseguem nutrir.

Quando isso tudo acabar – porque vai acabar, não é? – quero tomar mate com meus pais e saborear cada minuto da conversa boa, dos puxões de orelha e do pão de queijo que acompanha o amargo lá em casa. Quando isso tudo acabar, haja erva mate para matar tanta saudade.

 

 

Marielle Pereira Flôres, jornalista – secretária do Gabinete da reitora da Universidade Franciscana

Há um ano fechei o consultório e imaginei: por três semanas? um ou dois meses?

Tantas incertezas, inseguranças, desconhecimento do entorno e do que ainda estava por vir. Muita coisa a pensar, aguardar, aprender, surpreender. A palavra era: reinvenção. Haveríamos de seguir e conseguir.

E aqui, uma pausa em forma de homenagem e orações aos que não superaram e tombaram (ou foram tombados..) no meio do caminho. Não só nos deparamos com cenas tristes e chocantes de despedidas dolorosas, como também com situações em que imperaram/imperam a morosidade, a falta de empatia e de humanidade/sensibilidade.

Outra pausa com muita reverência e aplausos veementes aos médicos e demais profissionais envolvidos com a Covid-19. Nesse ano que passou voando, constatou-se mais do que nunca, como o tempo tem pressa, é fugaz, feito de instantes fugidios e leva tudo o que encontra pela frente!

Nunca refleti (e vivi) intensamente sobre conceitos trais como: impermanência, vulnerabilidade, (des)equilíbrio, reconstrução e criatividade entre outros.

Atualmente, há auroras benfazejas nos caminhos vindouros – vacinas – ainda não suficientes, mas chegaremos lá. Tenho escutado e acolhido muitas dores, queixas e descrenças. (“Não posso viver sem minha vida! Não posso viver sem minha alma”! Emily Bronté em O morro dos Ventos Uivantes)

Que venham os dias melhores, (retornarei ao consultório) que nos sobrem desejos para seguirmos fortes e curiosos no desvelamento dos mistérios do mundo.

Que Deus nos proteja!

Abacadabra! A palavra vem do hebraico e significa Faz-se ! Haja Luz !!!!

 

Lia Steinbruch Carrion Fernandes, psicanalista

O ano de 2020 foi uma realidade nova, uma pandemia nunca antes vivida, uma necessidade de afastamento social e novas medidas a serem incorporadas. Aprendemos rápido a usar máscaras, álcool gel, não abraçar mais, não aglomerar. Aprendemos, dentro do possível, para quem tem que trabalhar, a usufruir a casa, a conviver mais intensamente com nossos companheiros, filhos. Enfim, parecia algo que logo passaria.

No entanto 2021 entrou nos mostrando que a vida realmente tinha mudado. Que a luz no final do túnel estava longe. Que tinha muita gente faminta, desempregada, desesperada.

A morte nos rondando por todos os lados. A mídia social avisando a cada dia que alguém perdia uma pessoa próxima….
Respondi uma pesquisa da UFSM sobre o aspecto emocional durante a pandemia, em 3 diferentes momentos. Acho que se fosse responder hoje, seria diferente. Mais triste, mais medrosa, mais desesperançosa.
Muito do que estamos vivendo poderia ter sido evitado, e não é preciso explicitar isso.  É preciso SIM justificar para as famílias de mais de 400000 mortos….São perdas irreparáveis.
Ajudar os necessitados, suprir a fome de quem não tem o que comer é algo que tem nos ajudado a seguir em frente e ter esperança em dias melhores.

 

Por Miriam Seligmam Menezes, médica e profa. voluntária UFSM

 

Poluição por resíduos industriais. Free-Photos/Pixabay

Alice Dutra Balbé

Há muito pouco tempo dizia-se que a pauta ambiental não era notícia no quotidiano. As razões para isso são várias e a primeira é categorização de uma pauta “ambiental” em uma seção separada quando o ambiente é o todo. A pauta ambiental acaba sempre se restringindo ao factual – como, de forma geral, é o jornalismo – tendo também o foco no trágico. Não houve uma mudança grande nesse sentido, contudo, a pauta ambiental passou a ser frequente no noticiário, especialmente no Brasil. Ainda defendo que não é preciso um chapéu de editoria “ambiente”, mas, sim, uma cobertura de jornalismo especializado que apresente o contexto da situação.

Anos de discussão em torno da preocupação mundial desde o Dia da Terra de 1970; a publicação do estudo Limites do crescimento, em 1972, pelo Clube de Roma, que é considerado um marco na história do pensamento ambientalista; o Relatório de Brundtland de 1987; diferentes conferências como a Rio-92 e Rio+20; publicações do Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas (IPCC, desde a formação em 1988), e as Conferências das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, que já vai na 25ª edição; até a imagem da Terra vista da Lua realizada em 1969 tem sido questionada.

O significado da expressão “desenvolvimento sustentável”, definindo que o desenvolvimento é necessário, mas não deve comprometer a capacidade de recursos para as gerações futuras, introduzida no relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, tem sido cada vez mais importante. Esse documento é mais conhecido como Relatório de Brundtland – pois a conferência foi presidida pela então primeira-ministra norueguesa Gro Harlem Brundtland. Hoje é necessário ainda mais ressaltar quando é uma mulher que está à frente de iniciativas.

As notícias ruins se propagam mais, como já dizia Nelson Traquina e são elas que ajudam a expor o problema e provocar ação também. Acidentes como a explosão do reator nuclear Three Mile Island em 1979, o desastre de Chernobyl e o vazamento de produtos químicos no Rio Reno, em 1986, foram importantes para a comunicação ambiental e as primeiras mudanças na legislação internacional. Mas ainda é preciso que realmente se faça mais para mudar as políticas ambientais. O mais difícil disso tudo é a compreensão de que um valor monetário para compensação do dano ambiental não resolve, mas é, no mínimo, a única alternativa para tentar inibir ações, regulamentar e investir no local afetado, seja com limpeza, replantio, recuperação de espécies, entre outros.

O derrame de petróleo ocorrido no litoral brasileiro em agosto, desse ano, fez lembrar outro dos maiores acidentes na história, ocorrido há 30 anos: o vazamento de crude (petróleo bruto) do navio Exxon Valdez, em 1989, no golfo do Alasca. Foram 40 milhões de litros de crude ao mar.

Acidente em plataforma petrolífera. Foto: Skeeze / Pixabay

Em 2010, outro acidente marcou a história dos acidentes com petrolíferas ao causar a morte de 11 funcionários da empresa e o vazamento de 3,2 milhões de barris de petróleo no Golfo do México após a explosão da plataforma Deepwater Horizon, da petrolífera britânica BP. O acidente foi notícia recentemente justamente referindo o valor que a empresa teve que pagar: 65 bilhões de dólares “e a conta continua a aumentar” segundo reportagem publicada pela revista Época Negócios, em fevereiro de 2019.

A Reuters também fez um levantamento em 2015 referindo o aumento da morte de golfinhos, entre 2002 e 2009, de 63 por ano para 200 (por ano) a partir de 2010, em consequência do contato com petróleo. A agência americana NOAA – National Oceanic and Atmospheric Administration – identificou ainda, em um estudo de 2016, que a gestação dos golfinhos não chegavam ao fim em 80% dos casos devido à exposição e petróleo.

No caso brasileiro, ainda não se tem a total dimensão do problema. Aumentam as notificações de praias em que o petróleo é visto. Em 17 de novembro a conta ultrapassava 450 praias e as manchas atingiram o litoral do Espírito Santo. No jogo de empurra e acusações falsas sobre a origem do petróleo, ainda pouco se reflete sobre o dano ambiental. As manchas visíveis do mar ainda podem ser removidas da água, mas o maior problema é o petróleo em contato com animais, corais, mangues, o ingerido pelos animais e, ainda, por humanos nessa cadeia alimentar.

A responsabilização é primordial para que se tomem as medidas necessárias. No caso do vazamento do Golfo do México, a empresa ainda hoje responde. Mas no Brasil como isso vai funcionar?

O rompimento da barragem do Fundão, em Mariana no estado de Minas Gerais, em 2015, liberou 40 milhões de metros cúbicos de resíduos da mineradora da Samarco que contaminou rios e mantou 19 pessoas. Três anos depois outro rompimento, da barragem de rejeitos da Mina do Feijão, no município de Brumadinho, no mesmo estado. O que realmente mudou de Mariana a Brumadinho?  É fato que mais de 20 barragens estão em alerta em Minas Gerais, a maior parte delas sob responsabilidade da empresa Vale, que atuava em Brumadinho. Foram as universidades, moradores, organizações não-governamentais e técnicos de alguns órgãos que assumiram as atividades nos locais. Pouca coisa mudou para o caso do derrame de petróleo nas praias brasileiras, o agravante foi o Governo Federal acusar o Greenpeace de causar o derrame, assim como fez em agosto ao acusar ONGs pelas queimadas na Amazônia.

Segundo dados do INPE, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o desmatamento aumentou cerca de 30% entre agosto de 2018 e julho 2019. No entanto, os maiores incêndios na Amazônia aconteceram em agosto. Foram 30.901 focos de incêndio registrados, segundo dados do Programa Queimadas do INPE em agosto e sabe-se que os incêndios seguiram no mês de setembro, 80% a mais do que em 2018, no mesmo período.

É preciso que esses fatos estejam na mídia. É preciso acompanhamento sobre os impactos hoje e a longo prazo, não podemos esquecer. Precisamos de respostas, precisamos de ações, precisamos de exemplos e conscientização.

 

Alice Dutra Balbé, doutora em Ciências da Comunicação e mestre em Informação e Jornalismo pela Universidade do Minho, Portugal,  jornalista egressa UFN.

Existe a beleza dos dias planejados, as tarefas completas, a via sem trânsito, janta na mesa e o banho antes de deitar. Um alívio em não esbarrar em contratempos. E os dias passam e passam e passam. Eis que numa tarde acontece “aquilo que não dava para imaginar”. Por alguns instantes, horas, semanas ou dias – depende da sorte improvável de cada um – permanece aquela sensação de que tudo é possível. O primo Lucas disse “você precisa se apaixonar pelo imprevisível”. E o que é a paixão senão um monte de coisas misturadas com a sensação engraçada na boca do estômago e o pavor de tudo dar errado.

O imprevisível é viciante. É adrenalina. Num dia você acorda e é surpreendido. No outro joga a agenda no lixo, desiste de fazer planos a médio e longo prazo. Acorda matutando se ao deitar na cama vai pensar “hoje não dava pra saber que isso ia acontecer”. Adrenalina. A gente também pode chamar de vida.

É novembro e antes que comecem a surgir listas de planejamentos, metas, prazos, etc, fica o ensinamento do primo Lucas – que só é primo da Jout Jout. Não é fácil e muito menos confortável. Em alguns momentos vai ser muito difícil, mas é assim mesmo que a gente faça de tudo para evitar. Mas é tão bom e vale a pena quando a gente permite que coisas inimagináveis virem realidade. Você vai ser surpreendido pelas coisas ruins, pode ter certeza. Se der medo, tudo bem também. É com medo que vem a coragem, o imprevisível e o ar fresco nos pulmões.

 

Arcéli Ramos é jornalista egressa da UFN. Repórter da Agência Central Sul em 2015. Com pesquisas na área jornalismo literário e linguagem, hoje também estuda “Pesquisa de tendências”. É colaboradora na New Order, revista digital na plataforma Medium, e produz uma newsletter mensal.

Imagem de Роман Романов/Pixabay